Após um ano a relembrar e celebrar a obra e legado de José Saramago, no âmbito do seu centenário, Pilar del Río veio até ao Porto para apresentar e falar da sua mais recente obra. No passado sábado (15), “A Intuição da Ilha – Os dias de José Saramago em Lanzarote” foi o tema de conversa naquela que a autora considera ser também uma casa para si: a livraria Lello.

O livro, publicado em agosto de 2022, é um convite para os leitores visitarem o lugar onde o casal viveu ao longo de mais de 17 anos, entre 1992 e 2010, na ilha mais oriental do arquipélago das Canárias. Durante a sessão, dividida entre momentos de partilha, em conversa com a jornalista Marta Curado, e leituras da cantora lírica Ana Celeste Ferreira, os presentes puderam conhecer algumas das passagens onde Pilar retrata uma parte da vida com Saramago. 

No decorrer dos capítulos, são reunidos episódios marcantes. A obra é demarcada pelo tom intimista, narrado, na primeira pessoa, por quem habitava “A Casa” – incluindo até a perspetiva dos três cães do casal, Greta, Pepe e Camões. É exemplo disso o dia em que foi anunciado o Nobel da Literatura para Saramago (sendo o único autor português a ser laureado com tal prémio), que é contado através dos olhos dos animais de estimação. Ademais, recorda muitos dos nomes que os visitaram em Lanzarote, desde Bernardo Bertolucci até Mário Soares.

Durante a partilha, Pilar del Río debruçou-se igualmente sobre a origem da Fundação José Saramago, a qual preside atualmente. Fernando Gómez Aguilera, autor do prefácio e amigo do casal, propôs a criação da instituição como sendo uma “responsabilidade social, uma responsabilidade de um país”, afirma a autora. Sobre o seu propósito, aponta que “não se trata de perpetuar Saramago” mas de “ter uma casa aberta” e realça a importância da união entre os povos da península Ibérica e da América Latina. “Somos 850 milhões de pessoas que falam de uma [certa] forma. Temos de nos entender”, afirma. E completa: “Cada um deve falar o seu próprio idioma e entender o outro, porque são similares”.

“A Intuição da Ilha” possui ainda, nas últimas páginas, a Carta Universal de Deveres e Obrigações dos Seres Humanos. O documento, redigido em português pela Universidade Autónoma do México, em conjunto com a Fundação José Saramago, é, para Pilar, essencial no livro. José Saramago recebeu o Nobel da Literatura em dezembro de 1998, data que marcou os 50 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos – que, para o escritor, era “o documento mais importante do século XX, mais do que a Constituição portuguesa”, explica.

Para rematar a sessão, a autora do livro reitera que “A Casa” está sempre aberta, na ilha que levou Saramago a questionar-se se aquela seria a sua “nova Azinhaga”, a aldeia do Ribatejo onde nasceu. É um livro para “amigas e amigos” do ícone da literatura nacional, aproximando-o, como escritor e pessoa, de quem o lê.

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira