A era digital, bem como as redes sociais, têm vindo, cada vez mais, a consolidar-se nos meios de comunicação social – abrindo espaço para o surgimento de notícias de caráter imediatista e pondo em risco o rigor jornalístico. Neste sentido, na tentativa de melhor compreender de que forma os meios noticiosos se podem, ou estão, a adaptar à sociedade e à juventude atual, a Universidade Lusófona do Porto, promoveu, ontem (4), o Seminário “YouNDigital”.

Ao longo de cinco apresentações, especialistas da área debateram a “difusão noticiosa” e os formatos que a notícia pode ter atualmente. O painel incluiu Irene Costera Meije, da Universidade de Vrije, em Amesterdão, Lynn Schofield-Clark, da Universidade de Denver, Marcel Broersma, do Centro de Estudos de Media e Jornalismo da Universidade de Groningen, Nic Newman, do Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo da Universidade de Oxford, e Vítor Tomé, da Universidade Autónoma de Lisboa, CIES-ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.

Irene Costera Meijer, da Vrije Universidade Amsterdão.

Irene Costera Meijer, da Vrije Universidade Amsterdão.

Uma pesquisa conduzida Nic Newman revela que, muitas vezes, os meios de comunicação (e consequentemente a notícia) vão atrás do público mais jovem em plataformas como o TikTok. Apesar disso, segundo aponta Irene Meijer, baseada nos dados do colega, estas redes sociais não foram designadas para suportar uma veiculação informativa, o que resulta numa dificuldade em condensar a comunicação de cunho noticioso.

TikTok como meio de difusão: uma plataforma aditiva, mas que não inspira confiança

O estudo, cujo foco incide sobre a utilização do TikTok como fonte de informação por jovens com idades entre 18 e os 24 anos, questiona a razão por detrás deste fenómeno. As justificações dividem-se em quatro categorias: “controlo de humor”, “menor [necessidade] de interação social”, “escapismo” e “conteúdo de caráter inspirador, útil”.

O algoritmo da aplicação chinesa também é motivo de interesse no tópico de análise. De acordo com Irene Meijer, há um grau considerável de contentamento e “adesão” por parte dos jovens que vem do conteúdo “relatable” –  isto é, que se adapta ao utilizador.

Há, todavia, ambiguidade no que concerne ao TikTok. Por um lado, o fenómeno conhecido como Fear Of Missing Out” (FOMO, ou, em português, “medo de perder algo”) atua de maneira direta na frequência com que os usuários sentem a carência de aceder às plataformas. Em oposição, existe uma certa apreensão da parcela mais nova, motivada pelo sentimento de “superestimulação” que o uso constante gera, bem como a perda de tempo útil no dia-a-dia.

Para a especialista da Universidade de Vrij, a relação entre os internautas e a dinâmica da plataforma é, assim, descrita como o “paradoxo do prazer: tão divertido que irrita”.

Atendendo a estes fatores, o vínculo entre o TikTok e a distribuição de notícias não funciona de maneira fluída. De facto, dados retirados da investigação de Nic Newman apontam que o público jovem não considera a plataforma como uma fonte segura de informação.  Em 2022,  40% do grupo estudado usava a rede social, mas apenas 15% destes afirma confiar na procedência da informação lá disponível.

Mais ainda, estudo conclui que, na maioria dos casos, as notícias que chegavam ao TikTok já haviam sido vistas noutra vertente informativa – ou seja, eram “antigas” ou até, em casos, desatualizadas.

A reestruturação do conceito de notícia, segundo a camada jovem

Nic Newman, por sua vez, puxou o foco para os “hábitos dos nativos sociais”. Para tal, trouxe “perspetiva internacional”, recolhida de um outro estudo que fez com jovens, também entre os 18 e os 24 anos, naturais do Brasil, Estados Unidos da América e Reino Unido.

Nic Newman, da Universidade de Oxford.

Nic Newman, da Universidade de Oxford.

Analisando o comportamento dos 74 participantes perante uma série de atividades online, Newman afere que as notícias podem pertencer a três categorias diferentes. São estas: notícias need-to-know” (as principais do dia, que afetem diretamente as vidas das pessoas, noticiadas pelos órgãos de comunicação convencionais, como é o caso da invasão da Ucrânia); notícias de interesse pessoal (mais abrangentes e plurais, relacionadas com hobbies, cultura ou outros assuntos); e notícias de entretenimento (conteúdo aleatório e de fácil consumo, divulgadas em várias plataformas).

Para os jovens, as notícias podem ser consideradas “narrow” [afuniladas] ou “broad”[amplas]. As “narrow” são focadas em política, relações internacionais e agendas do dia, enquanto as “broad” abraçam diversas outras categorias – estendendo-se a entretenimento, celebridades, jogos, tecnologia, moda e justiça social, provenientes de fontes diversas.

Segundo o que apura o especialista, 43% dos jovens afirmou que é nas redes sociais que vêm mais notícias; porém, esta audiência é muito cética perante conteúdos divulgados. De facto, existe igualmente uma inclinação para crer que a informação trazida a público é exposta por algum motivo – ou seja, não é digna de confiança.

 Nic Newman acredita, assim, que os órgãos de comunicação convencionais estão em crise. Mas acredita que há maneiras de contornar as dificuldades, tais como manter a credibilidade, expandir a abrangência dos temas, respeitar as convenções das outras plataformas e, apesar de tudo, continuar a apostar na criação de conteúdos em redes sociais –  porque a tendência é continuarem a crescer.

Trends e alfabetização literária também em causa

Lynn Clark, da Universidade de Denver, crê que há um padrão de criação de notícias direcionadas para uma “elite branca” – facto para o qual alerta, sublinhando que o algoritmo das plataformas online incitam essa supremacia.

Nesse contexto surge outro fator que pode ter um peso muito grande entre os mais novos: as trends. Por serem cativantes, criam uma grande adesão e difusão; mas podem ser igualmente usadas para chamar a atenção para problemas recorrentes, como foi o exemplo da exposição de abusos discriminatórios policiais. Por outro lado, Marcel Broersma, da Universidade de Groningen, evidencia que a o interesse dos jovens pelas notícias “está mais relacionado com o que me pode afetar”.

Vítor Tomé, da Universidade Autónoma de Lisboa, finalizou a série de apresentações. Aproveitou o momento para apelar à necessidade da “alfabetização mediática”, que consiste em desenvolver conhecimentos e as habilidades necessárias para que as pessoas consigam entender o papel e as funções dos provedores de informação.

O seminário está disponível na sua íntegra no canal de Youtube da Universidade Luófona.

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira