As novas regras do concurso de colocação dos professores vão permitir vincular metade dos professores que trabalham a contrato. FENPROF considera valor insuficiente e diz que o governo se limita a transpor uma diretiva comunitária.

O ministro da Educação, João Costa, durante a sua intervenção na Web Summit, em 2022. Foto: Web SummitCC BY 2.0

O concurso de professores para o ano letivo 2023/24 arranca amanhã (quarta-feira) com algumas novidades que o ministro da Educação, João Costa, sintetizou ao início da tarde, em conferência de imprensa. Entre os principais impactos do novo quadro normativo está a possibilidade de vinculação de 10.700 docentes já a partir de setembro.

Na segunda-feira (8) o Presidente da República promulgou o diploma do governo que regulamenta o concurso. Numa nota explicativa, Marcelo Rebelo de Sousa afirma que optou por não “adiar as expectativas” de milhares de professores, mas sublinha que nenhuma das “várias sugestões” que apresentou foi considerada na versão final do documento. 

Um dos receios de Marcelo Rebelo de Sousa é que assistamos em 2023/24 a mais um “ano acidentado“, à imagem do que tem acontecido recentemente. Já o Primeiro-ministro congratulou-se com a decisão do Presidente, afirmando no Twitter que a mesma vai contribuir para “a estabilidade da vida dos docentes“.

As medidas anunciadas pelo governo parecem, contudo, ser insuficientes para pacificar o setor. A FENPROF afirma, em nota oficial publicada ontem (segunda-feira), que “rever este novo diploma passará a ser novo objetivo de luta dos professores”.

Entre diversas críticas, os sindicalistas garantem que a vinculação de oito mil docentes era uma obrigação do governo decorrente de uma “diretiva comunitária”.

As greves, entretanto, prosseguem. A FENPROF dá continuidade, até 12 de maio, a um ciclo de protestos distritais. O S.TO.P, por seu turno, tem em curso esta semana uma greve às provas de aferição. As negociações também não estão fechadas. Na segunda-feira (15), o ministério e os sindicatos voltam a reunir-se para discutir o descongelamento das carreiras.

É neste clima de tensão que as novas regras do concurso vão entrar em vigor. Quais vão ser em concreto as alterações introduzidas pelo formato definido pelo governo? O JPN explica o que vai mudar com a nova legislação.

Substituição do mecanismo da “norma travão” por um “regime de vinculação dinâmica”

O ministro reconhece a existência de “professores em situação de precariedade há muitos anos”. Ao todo, diz João Costa, existem cerca de 20 mil professores que têm sido contratados todos os anos, sem vínculo permanente ao Estado.

Isto acontece devido à existência, na anterior legislação, de uma norma travão que obrigava “os professores a ter três horários anuais sucessivos completos no mesmo grupo de recrutamento” para acederem ao quadro, algo que deixava muitos docentes de fora e não tem paralelo noutras áreas da função pública.

A introdução do modelo da chamada “vinculação dinâmica”, regime há muito reclamado pelos sindicatos, garante o ministro, vai permitir a vinculação de 10.700 profissionais já no próximo ano letivo. Ou seja, vai existir uma “redução de 50% da precariedade na profissão docente”, valor que os sindicatos afirmam, no entanto, ser insuficiente.

FENPROF termina um ciclo de greves distritais no dia 12 de maio. Foto: Maria José Coelho

Salário dos professores contratados vai subir

Para aqueles que, mesmo assim, não conseguirem um vínculo em quadro de zona pedagógica (QZP) ou em quadro de escola (QE), o ministro da Educação garante que a lei prevê a introdução de “novos índices remuneratórios”.

Até à data, os professores com contrato a prazo ganhavam sempre pelo índice remuneratório mais baixo. Com a nova lei, passam a ganhar em função do tempo de serviço acumulado ao longo dos anos, o que lhes vai permitir avançar até dois escalões no vencimento. Isto “corresponde a uma valorização salarial de cerca de 22%”, garante o ME.

Mais professores em quadro de escola e menos professores em quadro de zona pedagógica

João Costa diz que a partir de 2024 vamos assistir a uma mudança profunda na “estabilidade das escolas e dos professores”, com a abertura de 20 mil vagas em quadro de escola.

A pertença pelo professor a um quadro de escola ou a um quadro de zona pedagógica faz toda a diferença. No primeiro caso, o docente está integrado no corpo permanente de uma escola, com todas as vantagens que isso traz ao nível da estabilidade pessoal e profissional.

Caso fique vinculado a um quadro de zona pedagógica (patamar prévio, em termos de carreira, à entrada no quadro de escola), o docente pode ser colocado em qualquer estabelecimento pertencente a uma área geográfica específica, lançando-o na incerteza, todos os anos, sobre o local onde irá exercer a sua atividade.

Mais quadros de zona pedagógica, a maioria com deslocações não superiores a 50km

A sina dos professores, nos últimos anos, tem sido, muitas vezes, a de andar com a casa às costas, como o próprio primeiro-ministro admitiu na publicação feita no Twitter. Isso acontece com aqueles que não têm qualquer vínculo com o Estado (os contratados) e que podem ter que concorrer a qualquer ponto do país, mas também com aqueles que, estando vinculados a um QZP, vão integrar uma escola situada a grande distância da respetiva residência.

Como o próprio ministro João Costa vincou, já houve momentos em que o número de QZP foi reduzido para dez (neste ano letivo são 23) o que, ao ampliar a área geográfica, implicava a possibilidade de os professores ficarem deslocados mais de 200km.

A partir do próximo ano letivo, passam a existir 63 QZP, de tamanho mais reduzido, com “áreas de distância que na grande maioria dos casos não ultrapassam os 50km”, assegura o ministério.

O concurso de colocação de professores tem uma periodicidade anual e é gerido pela Direção-Geral da Administração Escolar. Segundo dados da Pordata, existiam em 2021 cerca de 150mil docentes em Portugal