Numa digressão que se estende por toda a Europa, Ben Howard subiu ontem (23) ao palco do Coliseu do Porto. Após quase ter esgotado a sala do Coliseu de Lisboa na segunda-feira (22), voltou à cidade Invicta – cinco anos depois da sua última visita a Portugal. As portas abriram às 21h00 e só se voltaram a fechar depois de mais de duas horas de música.

O artista britânico, que possui dois BRIT Awards, ganhou reconhecimento amplo com o disco de 2011, “Every Kingdom“, que traz faixas como “Old Pine”, “Keep Your Head Up” e “Promise”. Já conta com quatro álbuns editados e o quinto, de nome “Is It?”, está a caminho, com lançamento previsto para meados de junho.

No retorno ao palco portuense, os 15 anos de carreira (cujo arranque oficial se deu em 2008) foram espremidos num concerto repleto de indie-folk deprimente, como o próprio o descreveu, que acaba por aconchegar quem não sabe pôr em palavras aquilo que sente. Foi um espetáculo musical que relembrou sons como os de Bon Iver, Novo Amor ou Simon & Garfunkel, a quem muitas vezes é associado.

Faltava ainda meia hora para a entrada e já algumas filas de espera decoravam a rua de Passos Manuel. Às 21h00, a banda sonora foi cedida pelos suíços Black Sea Dahu, que apresentaram uma abertura de mais de meia hora. A banda indie deu a conhecer alguns dos seus temas, como “In Case I Fall for You” e “Glue”, sempre com bastante carisma e ação em palco.

Prometeram, totalmente em português e num dos momentos mais cómicos da noite, um regresso ao Porto ainda no próximo ano. Combinando o folk com um indie-rock e, por vezes, traços de pop, os Black Sea Dahu conseguiram cativar uma plateia impaciente com sucesso, recebendo várias ovações e aplausos ao longo da performance.

Já passava das 22h00 quando Ben Howard tomou conta do Coliseu. Os gritos sentiram-se assim que o britânico ligou o microfone, dando voz a três das suas músicas mais recentes – e ainda desconhecidas pelo público –, como “Couldn’t Make It Up“. A sala mergulhou num silêncio respeitoso, ouvindo-se apenas a melodia totalmente gerada em palco pelas várias guitarras, bateria, um violoncelo e teclados.

A multidão estava parada e em silêncio mas em momento algum a ambiência se tornou desconfortável. É algo característico na presença do artista, pois a sua poesia e instrumentais obrigam à introspeção e à contemplação. O cantor chegou inclusive a interromper o espetáculo uma vez para confessar que se sentia em paz, mesmo em frente a uma sala quase cheia.

Depois de uma fase inicial de novidades, Ben Howard fez a promessa de interpretar obras mais conhecidas pelos fãs. Revelou ainda que, a partir dali, grande parte da noite ia assumir um ritmo mais lento e depressivo, algo que aumentou a cumplicidade com o público. Prosseguiu-se, assim, com “Days of Lantana”, “Sorry Kid”, “Metaphysical Cantations” e “Walking Backwards”.

Sem sequer precisar de se dirigir à plateia, o artista arrancou sorrisos e abraços apenas com os primeiros acordes de “Promise”, um dos temas que o lançou para a fama. Um simples jogo de luzes condensou ainda mais a atmosfera, proporcionando um dos momentos mais emocionantes da noite e alguns olhares brilhantes nas filas mais próximas do palco.

Os fãs voltaram a reagir com “Black Flies” e “I Forget Where We Were”, tocadas lado a lado. Os telemóveis apareceram, pela primeira vez durante o concerto, para captar o momento, já que são dois dos êxitos mais queridos pelos ouvintes. Aplausos, assobios, gritos de aprovação e de emoção encheram a sala, deixando transparecer o carinho que o público português tem pelo músico, que sorriu e agradeceumúltiplas vezes.

O britânico revisitou os vários álbuns, incluindo os trabalhos mais recentes, recordando “Spirits”, lançada no ano passado, “Follies Fixture” e “Crowhurt’s Meme”, de 2021. No entanto, após um momento de união com as duas músicas anteriores, este regresso a faixas menos maduras, e menos conhecidas, quebrou um pouco do ambiente da sala. Sentiu-se a necessidade do complemento de algumas letras mais acarinhadas, e animadas, como “Old Pine”, “Keep Your Head Up”, “Time is Dancing” e “Under The Same Sun”.

Os álbuns “Every Kingdom”, “I Forget Where We Were” e o EP “The Burgh Island”, principais responsáveis pela ascensão do artista, tiveram participação reduzida durante as mais de duas horas de concerto. A nostalgia voltou com o cantar de “Conrad”, que rendeu a reação mais eufórica da noite, mas o descontentamento com a redução das músicas mais conceituadas foi visível.

Mesmo com o ligeiro amargar de boca, Ben Howard teve de regressar ao palco depois do término da atuação. Os fãs não arredaram pé da sala, assobiando e incentivando mais um momento de música – algo que o cantor e a sua banda aceitaram, minutos mais tarde. A despedida, primeiramente melancólica, deu lugar a um bónus de mais duas obras que confortaram os presentes. De sorriso envergonhado e muito emocionado, Howard agradeceu, mais uma vez, o amor do público português.

Com uma setlist bastante extensa e variada, a noite terminou com rostos emocionados e pouca pressa para sair da sala. Em concordância com o resto da noite, a melancolia era palpável, tal como o desejo de ficar um pouco mais – na esperança de descobrir novos originais mas, principalmente, de revisitar o que ficou em falta.

A digressão segue agora por vários países europeus. “Is It?”, a nova aposta de Ben Howard, tem lançamento agendado para 16 de junho.  Foi escrita e gravada durante um período de dez dias, após o artista ter sofrido dois ataques isquémicos transitórios. Até agora, há apenas duas faixas reveladas: “Couldn’t Make It Up” e “Walking Backwards”.

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira