[Análise] A menos de um mês para o arranque do Euro 2024, o JPN analisa as perspetivas lusas para o Euro 2024 com a ajuda de dois históricos relatadores de jogos da seleção portuguesa - Nuno Matos e Pedro Azevedo. Neste artigo, abordamos a fase de apuramento, a prestação lusa no último mundial, o papel reservado a Cristiano Ronaldo e as dúvidas na convocatória de Roberto Martínez.
Portugal está na fase final do Euro 2024, depois de ter feito uma fase de qualificação a roçar a perfeição. Dez jogos, dez vitórias, 36 golos marcados e apenas dois sofridos. A seleção das quintas vai participar pela nova vez num Campeonato da Europa, a primeira sob a orientação de Roberto Martínez.
Nuno Matos é relatador da Antena 1 há mais de 20 anos e foi um dos poucos que teve a oportunidade de relatar em direto o golo mais importante da história do futebol português – o golo de Éder frente à França, na final do Euro 2016. À conversa com o JPN, o jornalista conta que Portugal “teve muita sorte” no grupo em que está inserido no Euro 2024, mas não aponta a seleção como principal favorita. “Portugal tem a tarefa facilitada, com um grupo facílimo. Tem a obrigação de passar pelo menos o grupo. Tenho boas expectativas, mas não vou apontar como grande favorito a vencer [a prova]. Há a Espanha, França, Inglaterra, Alemanha e Itália”, afirmou.
Apesar de considerar que o grupo não é o mais complicado, o relatador afirma que vai ser necessário manter a concentração para não dar espaço a possíveis deslizes. “Notei algum excesso de confiança no jogo com a Eslovénia. Hoje, Portugal é uma das melhores seleções do mundo, mas aí levou um banho de humildade. Foi um bom exemplo de que não pode facilitar no Euro e não pode pensar que já passou o grupo, como aconteceu em 2016, em que empatou os três primeiros jogos”.
Pedro Azevedo, relatador na Renascença desde 1988, não tem qualquer dúvida da qualidade da seleção portuguesa à entrada para o Euro 2024. “Aponto a Alemanha, a França, a Inglaterra, a Espanha e a Itália. Mas se estes países são candidatos, Portugal também é. Para mim, Portugal é candidato a vencer este campeonato da Europa. A fase de qualificação que fez, mesmo que tenha sido contra equipas de dimensão inferior, faz sonhar. A equipa portuguesa não deu margem de manobra a qualquer adversário, quer fora, quer em casa”, disse.
O narrador acredita que o desaire do último jogo não “serve de exemplo” do nível de Portugal. “Foi apenas para tirar algumas dúvidas. Não foi para testar a equipa para o Euro. Nos jogos a sério, o trabalho do Martínez penso que não pode ser questionado“, acrescentou.
Ambos os relatadores acreditam que é importante dar uma oportunidade a Roberto Martínez para se mostrar numa grande competição antes de começar o julgamento. “Vamos ver o que vai acontecer neste Campeonato da Europa. O selecionador tem currículo, fez um trabalho bem feito na Bélgica. Foi até ele que nos eliminou no Euro 2020. Espero que retribua agora essa amargura e leve Portugal a campeão da Europa em 2024“, afirmou Pedro Azevedo.
Nuno Matos concorda e fala da abertura de um “novo ciclo” na seleção. “O Martínez é um homem do futebol, muito elogiado. Acompanha muito a evolução dos jogadores e é muito coerente. E tem uma coisa muito importante que é o facto de pensar pela própria cabeça. Em tempos, tivemos selecionadores que não eram eles que faziam a equipa. Temos de dar o benefício da dúvida“, disse. Para felicidade de Pedro Azevedo, a amargura pode muito bem ser retribuída.
O quadro baseia-se em dez mil simulações que foram realizadas tendo por base um exercício complexo explicado num vídeo. O modelo tem em consideração os últimos 20 jogos de cada equipa, o ranking mundial, o desempenho no último Euro e no último Mundial, entre outros fatores. Portugal surge como a seleção mais provável de vencer o Euro, com três pontos percentuais acima do segundo lugar (Inglaterra).
Parte do favoritismo dado a Portugal na previsão pode ser justificado pelo facto de os lusitanos terem um grupo fácil e de terem um plantel com boa qualidade. Até às meias-finais, é provável que a seleção consiga evitar duas das grandes favoritas à vitória na competição, Inglaterra e França, caso vençam nos seus grupos, além de evitar Espanha ou Alemanha – as duas seleções deverão enfrentar-se nos quartos de final, caso vençam nos seus grupos.
Portugal pode também ter algum favoritismo nas bancadas. Os comentadores já acompanham jogos da seleção das quinas há largos anos e ambos fizeram a cobertura do Mundial 2006, que se realizou também na Alemanha.
Nuno Matos destacou que a forte presença portuguesa no território alemão pode ser importante no apoio à seleção. “É um ambiente extraordinário. Há uma numerosa comunidade portuguesa na Alemanha que apoia fervorosamente a seleção, tal como aconteceu na França. Foi o que faltou no Qatar. Se Portugal tivesse tido esse apoio no Mundial, podia ter feito a diferença”, considera. O jornalista da Antena 1 contou ao JPN que o jogo entre Portugal e a Holanda nos oitavos de final do Mundial de 2006, que ficou conhecido como “A Batalha de Nuremberga“, por ter sido o jogo com mais cartões de sempre de um Campeonato do Mundo, foi o que mais o marcou nessa competição.
Já Pedro Azevedo acredita que o fator casa pode dar a vantagem à Alemanha. “Os alemães adoram o futebol. Recordo-me que, em 2006, o país mobilizou-se completamente e fez lembrar o que os portugueses viveram em 2004. O país pinta-se com as cores alemãs, os adeptos são incansáveis no apoio, estão em todo o lado. Eles não são tão emocionais como nós e não vão acusar a pressão do público. Até considero a Alemanha a principal favorita, ao jogar em casa“, afirmou.
O Mundial 2022, onde a seleção das quinas foi eliminada por Marrocos nos quartos de final, foi a última grande competição em que Portugal participou. Na altura, a seleção era orientada por Fernando Santos, que estava a ser muito criticado pelo excesso de pragmatismo. Roberto Martínez treinava a seleção da Bélgica e também teve uma competição para esquecer, já que a formação belga foi eliminada na fase de grupos.
Como é possível ver nos gráficos, nem Portugal, nem a Bélgica, tiveram desempenhos impressionantes no último Mundial. A seleção belga, especialmente, esteve vários níveis abaixo do esperado. A ideia de jogo de Roberto Martínez no Qatar ficou marcada pela paciência na primeira fase de construção e pela urgência no último terço. Os centrais belgas trocavam a bola entre si durante largos períodos de jogo, antes de tentarem avançar no campo, o que explica a elevada posse de bola.
Apesar de terem passado muito pouco tempo no último terço, quando lá chegaram conseguiram criar perigo. Mesmo não tendo apresentado um futebol de grande qualidade, a verdade é que os diabos vermelhos podem cobrar a sua eliminação na fase de grupos a Lukaku. O avançado da Roma teve quatro oportunidades flagrantes para desempatar o marcador no jogo frente à Croácia, mas não concretizou. Em caso de vitória, teria garantido a passagem da Bélgica aos oitavos de final.
No entanto, mesmo que tivessem avançado, dificilmente conseguiriam chegar muito mais longe. As debilidades ao nível defensivo eram demasiado grandes e as únicas oportunidades que criavam surgiam de “balões” dos defesas.
Já Portugal pecou pela fragilidade defensiva e pelo excesso de pragmatismo de Fernando Santos. A seleção das quinas manteve a posse de bola, mas nunca a conseguiu transformar em oportunidades de golo. Quando perdia a bola, a seleção não reagia bem e acabou por dar imensas oportunidades aos seus adversários. Nenhuma das exibições impressionou e, tanto Portugal como Martínez, têm que melhorar bastante se quiserem ter alguma hipótese neste Campeonato da Europa.
Uma coisa que Portugal não se pode queixar é de falta de opções para este Europeu. Nas últimas três convocatórias, o selecionador convocou um total de 34 jogadores, mas muitos outros de grande qualidade ficaram de fora.
A grande maioria está no pico da carreira ou perto dele, mas há nomes como Pepe e Cristiano Ronaldo que já estão bem para lá dessa marca. Nuno Matos disse ter algumas dúvidas relativamente à forma com que o capitão de Portugal se vai apresentar. “Vamos perceber como é que o Ronaldo chega a este Euro. Tenho as minhas dúvidas. Portugal sempre teve uma carência de um ponta de lança goleador. O Cristiano assumiu estas funções nos últimos anos, mas já está quase com 40 anos”, afirmou.
Pedro Azevedo acredita que a seleção deve moldar o seu estilo de jogo para aproveitar a fase atual do melhor marcador da história do Euro. “Durante muitos anos, a seleção foi Cristiano Ronaldo mais dez. Agora tem de ser dez mais Cristiano Ronaldo. Não é subestimar a sua qualidade, que é enorme. A matriz de jogo tem de ser diferente. Antigamente, ele pegava na bola e resolvia jogos sozinho. Hoje, tem de atuar num raio de ação muito mais curto e tem de se arranjar maneiras de ele finalizar. Porque, para finalizar, não há um como ele”, disse.
Para além dos nomes já escolhidos por Martínez, há ainda muitos outros à espreita por uma oportunidade. Na baliza, há Rui Silva e Luís Maximiano, ambos titulares na Liga Espanhola, e Ricardo Velho, uma das maiores surpresas do campeonato português.
Nas laterais, Nuno Santos está à espera de uma oportunidade há muito tempo, mas dificilmente a terá se Portugal continuar com o esquema de quatro defesas. Há ainda Tiago Santos que tem feito uma temporada interessante na Ligue 1. Eduardo Quaresma e Tomás Araújo têm sido cada vez mais aposta no Sporting e Benfica, respetivamente, e são opções válidas.
Já no meio-campo, existe o eterno “quase convocado” Pedro Gonçalves, que apesar de ser um dos melhores jogadores da Liga Portugal há quatro épocas, conta apenas com duas internacionalizações. Florentino Luís, Daniel Bragança, André Almeida e Fábio Vieira têm todos uma qualidade inquestionável, mas será difícil serem aposta devido à abundância de opções para esta zona. No ataque, há Pedro Neto e Beto, ambos com bastantes minutos na Premier League, e Paulinho, que tem surpreendido no Sporting como segunda opção para o ataque. Roberto Martínez vai anunciar a convocatória esta terça-feira (21), às 13h00.
A seleção das quinas compõe, juntamente com a Chéquia, Geórgia e Turquia, o grupo F. Jogue quem jogar uma coisa é certa para Nuno Matos: “Portugal não pode ter medo de ninguém. Tem capacidade para olhar olhos nos olhos para todas as seleções e pode ganhar a qualquer uma”, concluiu.
Editado por Inês Pinto Pereira