O projeto, liderado por Nádia Eusébio, visa a criação de biodetergentes para substituir os detergentes petroquímicos, responsáveis por grande parte da poluição na indústria têxtil. Aprovado pelo programa Eurostars, o EcoCleanTex arrancou a 1 de abril com 1,6 milhões de euros de financiamento.

A indústria têxtil é a segunda maior poluidora do ambiente.

A indústria têxtil é uma das mais poluentes. Foto: Marco Verch / Flickr

A indústria têxtil está entre as cinco mais poluentes do mundo, principalmente no que diz respeito ao consumo de água. Nádia Eusébio, doutorada na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), desenvolveu um projeto, denominado EcoCleanTex, cujo o objetivo é desenvolver biodetergentes para substituir os detergentes convencionais utilizados na lavagem da roupa e, assim, diminuir a poluição da água provocada pela indústria

Os detergentes usados atualmente são “altamente poluentes“, de acordo com a também investigadora na Next Generation Chemistry (NGC). “A produção dos surfactantes convencionais são de origem petrolífera. Ou seja, esses detergentes e, consequentemente, a formulação, sendo feita por surfactantes, são altamente poluentes. Quando depois usados na indústria têxtil, são descartados nas águas residuais“, afirmou.

Após a perceção deste problema, encontrou, juntamente com a NGC, “na literatura diferentes biossurfactantes que poderiam ser usados para a produção de biodetergentes”, contou. Com a produção de biodetergentes, a redução da poluição das águas residuais na indústria têxtil não seria uma “solução apenas para resolver problemas imediatos, mas também para um impacto positivo a longo prazo“, disse. Juntamente com outras duas empresas, uma que está sediada na Inglaterra e outra na Bélgica, “fiz a proposta de concorrerem comigo com um projeto”.

O EcoCleanTex acabou por ser aprovado pelo programa Eurostars. Apesar dos biosurfactantes já se aplicarem na indústria cosmética e farmacêutica, a novidade foi “produzir e formular ⁠biotransgênicos para a indústria têxtil”. O projeto EcoCleanTex arrancou a 1 de abril com 1,6 milhões de euros de financiamento.

“É crucial agir agora para garantir um futuro melhor para as gerações futuras”, disse, referindo que o próximo passo é “fazer uma prova de conceito aqui com os nossos clientes, e depois expandir a nível mundial”.

Ao JPN, Nádia Eusébio referiu ainda um outro problema associado à indústria têxtil: “muitos destes produtos químicos vêm da Ásia e, por isso, têm uma pegada carbónica também associada ao seu transporte“. 

Produção de biosurfactantes para biodetergentes. Foto: D.R.

Outros projetos sustentáveis na indústria têxtil em Portugal

Em Portugal, existem outros projetos que contribuem para uma melhoria na sustentabilidade da indústria têxtil, como por exemplo o programa “Make it Bio” da NGC, cujo objetivo é usar “outros produtos que permitem que o número de lavagens seja limitado”.

“Quando se comprava uma peça de roupa escura e se lavava em casa, muitas vezes desbotava. Nas tinturarias, após o tingimento, lava-se várias vezes essa roupa, de modo a remover todo o excesso de corante. Por exemplo, em cores escuras, usam várias lavagens. Imagine, sete lavagens. E aí é que se gastam grandes quantidades de água”, explicou, dizendo que “em vez de sete lavagens, podemos usar umas três“. Segundo Nádia Eusébio, “tem tido uma boa aceitabilidade por parte das tinturarias”.

Com o “Make It Bio”, a temperatura de lavagem é reduzida, o que, segundo Nádia Eusébio, “faz com que se corrompa energia e, consequentemente, também haja menos poluição por CO2”. “Começamos também a implementar alguns produtos biobase, nomeadamente os ⁠bioamaciadores”, concluiu.

Diferenças entre compra na indústria portuguesa e asiática: os portugueses são sustentáveis na hora da compra?

No que diz respeito à sustentabilidade, Nádia Eusébio disse que Portugal se distingue das restantes indústrias têxteis, “principalmente as asiáticas, altamente poluidoras”, pela procura de soluções e implementação de medidas mais sustentáveis. “Hoje em dia, a indústria têxtil nacional está a avançar muito bem e tem dado grandes passos no sentido de ser mais sustentável e poupar tanto água como energia e até mesmo reduzir a pegada de carbono”, afirmou.

A investigadora referiu ainda que a sustentabilidade do produto têxtil ainda não é um fator decisivo na tomada de decisão de compra. “Na China, os mercados não são regulamentados e, muitas vezes, a produção é altamente prejudicial ao meio ambiente”, disse, acrescentando que os consumidores tendem a “ir por práticas mais económicas e não tão sustentáveis“.

“Muitas das vezes, a indústria têxtil europeia está restrita a determinadas legislações de forma a não ter práticas prejudiciais ao ambiente e a ter produtos mais sustentáveis”, o que faz com que não possa competir diretamente com os países asiáticos, onde predominam as indústrias de fast fashion.

Apesar dos obstáculos, a investigadora disse estar confiante no potencial de transformação da indústria têxtil “para começar a alcançar a sustentabilidade total“. “Com determinação e colaboração, podemos criar um futuro mais sustentável e próspero para todos”, afirmou.

Nádia Eusébio falou ainda sobre a relevância da educação ambiental, dizendo ser essencial “começar pelos mais novos, nas escolas, e explicar a importância de se fazer opções de forma a ajudar o planeta”.

Editado por Inês Pinto Pereira