O quadro do pintor Domingos Sequeira entrou no ciclo expositivo do museu no sábado. Para assinalar o facto, foram organizadas visitas guiadas para os interessados. O JPN esteve à conversa com o diretor do Museu e a curadora da exposição sobre o futuro da obra e o enquadramento da pintura no espólio do museu.

“Descida da Cruz” é uma das quatro obras que Domingos Sequeira pintou no final da sua vida. Foto: Inês Pinto Pereira/JPN

A obra “Descida da Cruz“, do pintor Domingos Sequeira, está exposta no Museu Nacional Soares dos Reis (MNSR), no Porto, desde sábado (1), onde deverá permanecer, pelo menos, “seis meses”. O MNSR organizou, nesse dia, quatro “visitas-relâmpago”, como descreveu a curadora, para apresentar a obra, que está integrada numa exposição de longa duração.

A pintura ocupa um lugar de destaque numa sala pequena, situada no primeiro piso do museu, onde estão expostas outras quatro obras, da autoria de Domingos Sequeira, que já estavam à guarda do museu: “Agradecimento de Portugal a Palas como protetora do Estado contra os inimigos externos“, “Sonho do regresso do Príncipe Regente“, “Junot protegendo a cidade de Lisboa” e “Alegoria à aliança entre Portugal, Espanha e Inglaterra“.

Na exposição, podem ainda ser vistos alguns desenhos preparatórios da obra “Descida da Cruz”. “O Domingos Sequeira trabalhou muito a preparação destas obras, foi meticuloso, foi tudo muito estudado, figura a figura“, explicou a curadora Ana Paula Machado. Para além das obras de Domingos Sequeira, estão também expostos quadros de Vieira Portuense, Jean Pillement, entre outros.

Tendo em conta a dimensão da obra “Descida Cruz”, a sala “teve de ser remodelada” para a receber. “Mantivemos na exposição tudo o que estava exposto. Remodelamos a apresentação para poder receber a obra e dar-lhe o devido destaque“, disse Ana Paula Machado.

Ao JPN, a curadora explicou que a iluminação, que é “importantíssima nesta obra”, foi das “coisas mais difíceis de fazer“, devido ao “verniz muito denso” que foi aplicado na “Descida da Cruz” durante o restauro e que pode gerar manchas de luz e reflexos indesejados. “Uma má iluminação pode matar uma obra“, acrescentou.

Para Ana Paula Machado, esta obra vai “completamente ao encontro daquilo que o museu apresenta a título permanente. A obra do Domingos Sequeira, que foi professor – e é nessa condição que está representado na galeria -, é uma figura cimeira do pré-romantismo e do anúncio do romantismo na arte portuguesa, em conjunto com o Vieira Portuense que é uma personagem muito importante na coleção do museu”.

Obra vai estar no MNSR durante, pelo menos, “seis meses”

“Descida da Cruz” é uma de quatro obras de uma série que o pintor realizou no final da sua vida. Apenas a pintura, que agora está exposta no Museu Nacional Soares dos Reis, e a “Adoração dos Magos“, em exibição no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, foram concluídas. 

A primeira foi adquirida pela Fundação Livraria Lello, em março deste ano, depois de a obra ter andado “perdida” no estrangeiro, em resultado da autorização de exportação concedida pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC). O quadro estava em exibição no stand da Galeria Colnaghi na TEFAF (The European Fine Art Fair), que se realizou na cidade de Maastricht, nos Países Baixos. Antes de ser exposto no Museu Nacional Soares dos Reis, o quadro foi exibido no Mosteiro de Leça do Balio, sede da Fundação Livraria Lello.

“O protocolo exige que a obra esteja, obrigatoriamente, seis meses cá. Poderá circular temporariamente por outros museus”, tal como está previsto no protocolo, afirmou o diretor do museu, António Ponte, ao JPN. Questionado sobre se já é conhecido o próximo destino da pintura, António Ponte não adiantou qualquer informação, dizendo que só a partir de agora “será tratado com os proprietários”. Quando sair em itinerância para outros museus, a obra vai ser “substituída por outra obra do Domingos Sequeira”, acrescentou a curadora.

Para António Ponte, “há uma conjugação muito interessante entre a vontade dos proprietários de que a obra ficasse aqui no museu e o facto de ela própria ter propósito próprio nesta exposição”. “[A obra] não é um acrescento imposto à exposição, integra-se, porque já tínhamos Domingos Sequeira na exposição e alargamos o núcleo do Sequeira com esta peça. Como também temos o conceito de longa duração, que faz mudanças periódicas, aproveitamos para mudar todos os desenhos do Sequeira que tínhamos expostos por novos desenhos da nossa coleção que são desenhos preparatórios desta obra“, acrescentou.

Ana Paula Machado refere que, apesar de o Museu de Arte Antiga ter uma “grande tradição da investigação de longa data da obra” do pintor, “faz sentido que o público a norte possa ver também [esta obra] para desfrutar dela o maior tempo possível”.

Visitas para assinalar a entrada do quadro no ciclo expositivo

O quadro entrou no circuito expositivo um dia antes do que estava inicialmente previsto, dada a visita do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e dos Amigos do Museu Nacional Soares dos Reis. Desde então, “as pessoas têm vindo ao museu de uma forma completamente efusiva” e a reação tem sido “muito intensa“, disse Ana Paula Machado.

Museu organizou visitas para assinalar a entrada do quadro no ciclo expositivo. Foto: Inês Pinto Pereira/JPN

As visitas de sábado “esgotaram“. Maria Cristina Barbosa, de 59 anos, para quem “a expectativa [de ver a obra] era grande”, foi uma das pessoas que marcou presença numa das visitas. Ao JPN, disse que, assim que recebeu a comunicação do museu a dizer que a pintura seria exposta no dia 1 de junho, marcou uma das visitas. Apesar de admitir não ter sido uma surpresa, porque já conhecia o pintor, afirmou que é “sempre uma emoção muito grande estar a ver uma pintura destas feita por um dos mais belos pintores portugueses”.

Ismael Varanda, de 67 anos, percorreu “50 quilómetros” somente para ver a obra de Domingos Sequeira. “Aprecio muito essa perspetiva de vir a um museu ver uma obra, conhecê-la mais em profundidade, com algum suporte de alguns desenhos, etc. Acho interessante ter esse saber”, disse ao JPN.

Para Ismael, o que mais se destacou foi a luz, que “dá vida pontualmente às coisas que interessam mais representar”, e a “maneira como estava contada esta história“.

Também Branco Rodrigues, de 78 anos, veio de propósito de Lisboa para ver a obra. “Correspondeu em pleno à expectativa que tinha“, disse, acrescentando que “Domingos Sequeira foi sempre um pintor que lhe interessou”. “Felizmente, uma entidade privada assumiu o que o Estado devia ter assumido em seu tempo“, afirmou.

A curadora garantiu que o museu vai “organizar visitas mais longas que permitam fazer o enquadramento” da obra no futuro. “Hoje (sábado) era para satisfazer este interesse do público e poder receber o maior volume de pessoas possível”, disse.