Ana Martins é candidata da Iniciativa Liberal ao Parlamento Europeu. Ao JPN, a número dois da lista criticou a forma como são atribuídos os fundos europeus, falou sobre a desburocratização da Europa, o crescimento económico associado à sustentabilidade ambiental, o combate à pobreza e também sobre os conflitos na Ucrânia e na Palestina.

Ana Martins, de 39 anos, é candidata ao Parlamento Europeu pela Iniciativa Liberal (IL). Natural da Ilha Terceira, nos Açores, é formada em Direito pela Universidade Católica Portuguesa e vice-presidente da IL.

Em entrevista ao JPN, Ana Martins criticou a forma como os fundos europeus são aplicados. Para a número dois da lista, os fundos devem ser investidos, “por exemplo, na infraestrutura de transportes”, em investigação e desenvolvimento, ou seja, naquilo que pode “valorizar os produtos” de um país e tornar o seu mercado “mais competitivo”. “Achamos, por exemplo, que dedicar fundos europeus a temas como a habitação não é uma forma eficiente de utilizá-los, porque acreditamos que o problema da habitação em Portugal se deve muito mais a uma má gestão”, acrescentou.

A vice-presidente do partido disse que Portugal, apesar de ter recebido cerca de “160 mil milhões” euros de Bruxelas, continua a ser “ultrapassado por outros países que entraram mais recentemente na União Europeia”. “Temos que nos perguntar se esses fundos foram efetivamente bem investidos. Parece evidente que não”, acrescentou. Neste sentido, pede “uma aplicação mais rigorosa dos critérios de atribuição desses fundos“, mais fiscalização e uma avaliação dos resultados no final.

A Iniciativa Liberal defende uma desburocratização da Europa, nomeadamente através da adoção da “política dois por um“: “A cada nova norma aprovada, procurar eliminar duas normas obsoletas ou de alguma forma impeditivas de um funcionamento mais eficaz da sociedade a vários níveis”. Nesta mesma linha, defendem “um aprofundamento do mercado único“.

Sobre a guerra da Ucrânia, a IL está a favor do apoio da União Europeia ao Governo de Kiev para que “se possa defender da agressão russa” e da sua adesão ao bloco europeu. Já, no que diz respeito à Palestina, defende uma solução de dois Estados.

Nas últimas eleições europeias, o partido obteve 0,88% dos votos e não elegeu qualquer deputado. “O nosso objetivo é eleger o João Cotrim de Figueiredo, o nosso cabeça de lista. E temos ambição para mais”, disse.

JPN – Sendo os Açores uma das regiões ultraperiféricas da Europa, como é que as suas origens podem influenciar o trabalho que pretende fazer no Parlamento Europeu?

Ana Martins (AM) – Antes de mais, queria mesmo começar por fazer um apelo ao voto. Essa é uma preocupação que todos temos. Poderão votar em mobilidade no dia 9, em qualquer ponto do país e mesmo estando fora de Portugal. É fundamental, porque Portugal foi o país com a quinta maior taxa de abstenção nas últimas eleições e, desde 2019 para cá, a Europa mudou muito.

Tenho ligação a uma região ultraperiférica que, ainda por cima, foi grande beneficiária de fundos europeus para o seu desenvolvimento e, no entanto, não deixa de ser uma das regiões mais pobres da União Europeia. Os Açores receberam até agora, em fundos europeus, cerca de 16 mil milhões de euros e, no entanto, continuam atrasados numa série de aspetos. Ainda há pouco tempo, saiu uma notícia, segundo a qual 60% dos açorianos só tinham o sexto ano e, portanto, isso leva-nos a questionar como é que esses fundos foram aplicados.

Numa altura em que Portugal, a prazo, terá de deixar de depender, muito provavelmente, dos fundos para dar lugar a outros países que entretanto irão juntar-se à União Europeia. A Iniciativa Liberal é favorável a esse alargamento, vê que traz benefícios, e é também justo para com esses países, como Portugal também teve oportunidade.

Portanto, é importante que a atribuição dos fundos que ainda iremos receber e, especialmente a Região dos Açores e da Madeira, sejam investidos numa ótica de a região deixar de ser tão dependente deste tipo de apoios. Claro que são regiões com muitas especificidades, mas também são regiões com elevado potencial, designadamente ao nível da qualidade dos seus produtos.

Ser dos Açores e ter uma ligação forte e permanente a essa região permite-me ter uma maior sensibilidade tanto dos erros cometidos no passado como daquilo que é fundamental – também do ponto de vista da representação no Parlamento Europeu – defender para uma melhor aplicação dos fundos, seja em Portugal, seja nos Açores, seja noutras partes da Europa.

A Iniciativa Liberal é um partido profundamente europeísta. Temos muito orgulho nos princípios liberais em que o projeto da União Europeia está sustentado e, inclusivamente, entendemos que muito do sucesso da União Europeia se deve a esses alicerces liberais e democráticos.

JPN – Considerando que a IL é um partido recente que ainda não elegeu para o PE, que diferença pode fazer o partido na Europa por oposição aos outros partidos portugueses que concorrem nas eleições? 

AM – A Iniciativa Liberal é um partido profundamente europeísta. Temos muito orgulho nos princípios liberais em que o projeto da União Europeia está sustentado e, inclusivamente, entendemos que muito do sucesso da União Europeia se deve a esses alicerces liberais e democráticos. Portanto, estamos muito alinhados com o projeto europeu.

Em segundo lugar, o partido, em todos os níveis de governação, defende sempre uma perspetiva mais reformista, muito mais ambiciosa de visão, sempre a pensar no que é preciso para, no futuro, podermos continuar a ter uma sociedade livre e com possibilidades de se manter próspera.

Na ótica deste mandato, em que temos muita confiança de que nos iremos estrear no Parlamento Europeu, queremos defender condições em que a Europa possa permanecer num espaço de paz, liberdade e prosperidade e, mais do que ser uma campeã da regulação, como tem sido conhecida em termos mais recentes, voltar a ser uma campeã da inovação.

Vivemos num mundo em rápida transformação. Vemos potências globais emergentes a desafiar [a Europa] e não queremos ficar à mercê das suas decisões e dos seus interesses, portanto, é fundamental que a Europa se mantenha mais competitiva do que tem sido para reter talento e fazer face aos desafios que tem pela frente, desde as alterações climáticas à sua defesa e segurança, que exige um elevado nível de investimento.

Temos muita confiança de que nos iremos estrear no Parlamento Europeu.

JPN – No programa, pode ler-se que pretendem “descomplicar, libertar energias criativas”, apostar no talento e potencial e que rejeitam “o caminho da burocracia”. Na visão do partido, como se desburocratiza a Europa?

AM – Em primeiro lugar, defendemos a política dois por um. Portanto, a cada nova norma aprovada, procurar eliminar duas normas obsoletas ou de alguma forma impeditivas de um funcionamento mais eficaz da sociedade a vários níveis.

É verdade que a regulação é um fator importante para garantir, por exemplo, a qualidade dos produtos. É uma das coisas que a União Europeia tem feito bem e é importante que as regras de comércio livre sejam claras para todos os operadores do mercado.

Mas, por outro lado, também cria entraves. Isto, para nós, é uma das grandes prioridades no nosso manifesto: um aprofundamento do mercado único para ele ser verdadeiramente concretizado. Consideramos que isso nunca chegou verdadeiramente a acontecer e, para maximizar o potencial desse mercado, tem de haver eliminação de barreiras burocráticas para as liberdades.

Para que a liberdade de circulação de bens, serviços, capitais e pessoas possa verdadeiramente ser garantida, é preciso eliminar algumas barreiras práticas na aplicação de regulação derivada de 27 diferentes jurisdições.

O que é que isto quer dizer? Uma empresa pequena em Portugal terá dificuldades, por exemplo, em exportar para um mercado alargado dentro do mercado único, se tiver que lidar com várias jurisdições diferentes. As únicas empresas que conseguem fazer face a essa complexidade acabam por ser as grandes empresas que têm recursos suficientes, por exemplo, para investir em serviços jurídicos constantemente. As pequenas e médias empresas, depois, não conseguem competir nesse ambiente.

Isso é lamentável, porque a Europa tem mais habitantes do que, por exemplo, os Estados Unidos, que têm 340 milhões de habitantes. A União Europeia tem à volta de 450 milhões e com o alargamento terá mais ainda. Portanto, essas barreiras acabam por impedir o verdadeiro aproveitamento e potencial daquilo que pode ser o maior mercado de comércio livre do mundo.

Defendemos a política dois por um. Portanto, a cada nova norma aprovada, procurar eliminar duas normas obsoletas ou de alguma forma impeditivas de um funcionamento mais eficaz da sociedade a vários níveis.

JPN – A IL tem uma posição crítica sobre a forma como os fundos europeus são atribuídos e aplicados. O que tem que mudar em concreto sobre este assunto?

AM – Tem que se investir os fundos numa ótica daquilo que é preciso para o país poder valorizar os seus produtos e ter condições de ter um mercado mais competitivo.

Portugal recebeu até agora à volta de 160 mil milhões em fundos europeus e continua a ser um país que é ultrapassado por outros países que entraram mais recentemente na União Europeia. Um exemplo é a Lituânia, outro é a Estónia. Temos que nos perguntar se esses fundos foram efetivamente bem investidos. Parece evidente que não.

Achamos que faz sentido investir numa ótica do que será necessário, qual a infraestrutura necessária, para depois o mercado, a economia, poderem gerar mais riqueza para podermos ter uma sociedade à altura daquilo que Portugal pode ser em equiparação com outros países europeus mais avançados do que nós.

O partido obteve 0,88% dos votos nas últimas eleições. Foto: D.R.

JPN – Mas para fazer isso, qual é a mudança necessária?

AM – Investir, por exemplo, na infraestrutura de transportes e investir em investigação e desenvolvimento para desenvolver soluções para esses desafios, designadamente ao nível da transição climática, transição energética, ao nível também da própria revolução laboral que vai resultar de novas tecnologias, em especial da inteligência artificial.

No fundo, investir na infraestrutura necessária para o mercado poder operar. Achamos, por exemplo, que dedicar fundos europeus a temas como a habitação não é uma forma eficiente de utilizá-los, porque acreditamos que o problema da habitação em Portugal se deve muito mais a uma má gestão e a uma limitação daquilo que é a oferta do mercado para satisfazer a procura. Poderíamos aplicar os fundos europeus em aspetos que, esses sim, não dependem tanto da iniciativa privada garantir.

Os transportes são um dos principais exemplos. Portugal é um país periférico que não apostou devidamente na sua ferrovia e, hoje em dia, tem más ligações ao resto da Europa. Isto, obviamente, é um obstáculo não só à circulação de pessoas como também para as próprias empresas poderem importar e exportar mercadorias.

Portugal recebeu até agora à volta de 160 mil milhões em fundos europeus e continua a ser um país que é ultrapassado por outros países que entraram mais recentemente na União Europeia.

JPN – Como se consegue equilibrar o crescimento económico com a sustentabilidade ambiental?

AM – A Iniciativa Liberal tem um manifesto chamado “Crescimento Sustentável” que explica precisamente a nossa visão para o ambiente. Entendemos que competitividade económica e ambiente não são antagónicos. Muito pelo contrário, são complementares.

A maioria das soluções para resolver os problemas de transição climática são soluções tecnológicas e, portanto, para podermos prosseguir essas soluções, não só devemos investir nas que já existem, mas também investir em investigação e desenvolvimento para descortinar mais formas de dar resposta a esses desafios.

Ao nível da energia, por exemplo, uma das coisas que defendemos é uma rede alargada e interligada de carregamento elétrico, por exemplo, para veículos elétricos. [Defendemos] também a aposta na ferrovia como uma forma alternativa a outras formas mais poluentes de mobilidade, que é, como dizia há pouco, essencial para assegurar a livre circulação de pessoas e de bens.

Outros aspetos que defendemos nesta matéria têm a ver com uma certificação europeia de remoção de carbono e a dinamização do mercado voluntário de carbono. Estes são sistemas que, no fundo, incentivam as empresas a mitigar as suas emissões de carbono de forma a manterem-se competitivas neste mercado e até a gerarem incentivos também ao nível do comércio com países fora da União Europeia.

Vemos como boas políticas que já estão a dar resultado e é por aí o caminho: ajudar a que o mercado gere soluções ambientalmente sustentáveis. Não é limitando a competitividade económica, não é tentando vender um modelo de limitação do crescimento económico que se resolvem esses problemas. Muito pelo contrário. Muitos desses tipos de soluções acabam muitas vezes a incentivar a utilização de combustíveis, que até são mais poluentes.

Entendemos que competitividade económica e ambiente não são antagónicos. Muito pelo contrário, são complementares.

JPN – Qual a visão do partido sobre o Pacto Ecológico Europeu? E sobre as políticas relacionadas com o ambiente do Parlamento Europeu?

AM – Achamos que tem havido bons avanços, visto que há uma aposta para ajudar a economia a descarbonizar. Temos sempre preocupação com vias mais proibicionistas. Defendemos sempre a via dos incentivos para que as empresas e as pessoas tenham alternativas e os incentivos certos para tomar opções mais sustentáveis. Em certas circunstâncias, obviamente que se justifica a via da proibição, mas evitamos.

Por exemplo, somos contra o impedimento de voos de curta duração. Atualmente, as emissões de carbono pelas quais a aviação é responsável são 2% das emissões totais produzidas. Achamos – e está a haver progresso nesse sentido – que deve haver aposta na descarbonização dos fósseis utilizados na aviação. Mais uma vez, isto passa por uma aposta em investigação científica e desenvolvimento tecnológico para conseguirmos obter essas soluções.

Faz muito mais sentido, por exemplo, uma aposta em vias alternativas de transporte. Entrar logo pela via da proibição acaba por ser até prejudicial para as zonas mais periféricas, que, também por culpa própria, como é o caso português, não investiram adequadamente na sua ferrovia, mas também noutros aspetos, inclusivamente o social, e aumenta as disparidades económicas. Devemos esgotar sempre todas as vias de aumentar as escolhas, dando os incentivos às pessoas para optarem por alternativas mais sustentáveis, em vez de optar logo pela proibição. Esse deve ser sempre o último recurso. Achamos que isso não tem sido a principal via da União Europeia.

Há um exemplo até agora recente: acho que cada vez mais pessoas repararam que, quando abrem as suas garrafas de água, a tampa não sai logo. Isto foi uma medida também direcionada para evitar a poluição do plástico e essa intenção é absolutamente louvável.

Se calhar, a abordagem poderia ter sido incentivar as empresas a gerarem soluções que evitem a poluição derivada da queda de tampas na utilização de garrafas de água, por exemplo. Poderia haver até uma solução mais inovadora por parte do mercado que agora, por imposição desta solução da tampa que não cai, fica de alguma forma desincentivado.

Partido quer eleger, pelo menos, um deputado. Foto: D.R.

JPN – Quais seriam esses incentivos?

AM – Como estava a dizer, temos o exemplo do mercado voluntário de carbono, onde as empresas são incentivadas a mitigar as emissões de carbono e têm com isso alguns benefícios fiscais. Inclusivamente, uma empresa que chega ao nível de emissões que seria desejável emitir poderá depois comprar esse excedente de uma empresa que fica abaixo desse nível para compensar o seu.

Isto dá às empresas a possibilidade de terem mais escolhas na gestão dos seus recursos e investimentos e opera numa lógica de competitividade. Portanto, gera incentivos para que as empresas vão ao encontro daquilo que são os objetivos ambientais de redução das emissões de carbono no cumprimento da meta de redução em 55% até 2030, sem entrar pela via da limitação.

JPN – No programa, referem que querem uma Europa onde se estude “a reforma do modelo da educação”. Defendem essa reforma? Se sim, como pensam que deve ser implementada?

AM – Acima de tudo, defendemos, numa ótica também de aprofundamento do mercado único, que haja reconhecimento de qualificações entre países.

Por exemplo, alguém que seja arquiteto em Portugal possa ter mais facilidade de vender os seus serviços a outro país, tendo o reconhecimento da sua qualificação mais facilitado. Claro que há mecanismos de reconhecimento, mas eles não são ágeis, não são imediatos e, portanto, essa harmonização é desejável.

Depois, fazer uma aposta na formação. O futuro passa muito pelo desenvolvimento de soluções tecnológicas para, por um lado, fazer face aos desafios que temos pela frente, mas também para competirmos a nível internacional. Portanto, a requalificação da força de trabalho tem de ser uma prioridade para a União Europeia para eliminar barreiras que decorrem dos diferentes sistemas dentro da interoperabilidade da cooperação intergovernamental. Até porque a educação não é propriamente uma competência exclusiva da União Europeia, mas isso não impediu que a UE fosse muito bem-sucedida em programas como o Erasmus.

Queremos encontrar formas de harmonizar o sistema de educação para que haja mais oportunidades de uma pessoa estudando num país poder também beneficiar da oferta educativa noutro país com mais facilidade e das suas competências e qualificações serem também mais facilmente reconhecidas entre países.

Em termos de apoios sociais concretos, defendemos uma aplicação mais rigorosa dos critérios de atribuição desses fundos, que haja a devida fiscalização e, depois, que haja uma boa avaliação dos resultados.

JPN – Quais são as medidas práticas que a IL defende para combater a pobreza na Europa?

AM – O Parlamento Europeu não tem iniciativa legislativa. Quem tem iniciativa legislativa é a Comissão Europeia. E, portanto, o que o PE pode fazer é influenciar a legislação que parte como proposta da Comissão Europeia e melhorá-la. Mais uma vez, tudo passa por uma maior capacidade de competitividade económica, que a Europa em tempos já teve mais. Voltamos agora a ter condições para conseguirmos retomar essa competitividade.

Isso, para nós, passa, por um lado, pelo aprofundamento do mercado único para tirar o máximo proveito do seu potencial, porque, como costumamos dizer, os países ricos não são ricos porque têm políticas sociais, têm boas políticas sociais porque são ricos. Portanto, a riqueza é sempre uma condição prévia para poder haver ajuda social. Depois, em termos de apoios sociais concretos, defendemos uma aplicação mais rigorosa dos critérios de atribuição desses fundos, que haja a devida fiscalização e, depois, que haja uma boa avaliação dos resultados.

Perguntava no início desta entrevista sobre a minha ligação aos Açores. Posso dizer que, por exemplo, muitos desses fundos nos Açores foram revertidos para formação e vimos que, como eu disse, 60% da população só tem o sexto ano. De facto, foram investidos, por exemplo, em estruturas e em edifícios para dar formação, mas depois a formação que foi efetivamente dada não serviu às necessidades da região, muito pelo contrário. Há muitas pessoas que não conseguem, por um lado, ter as competências que são procuradas no mercado regional e, por outro lado, gera situações de pobreza que não são eficazmente resolvidas com os apoios sociais que têm sido recebidos, que muitas vezes acabam por ser armadilhas de pobreza.

Ana Martins, à esquerda, ao lado do cabeça de lista da IL, João Cotrim de Figueiredo. Foto: D.R.

JPN – Considerando que ambicionam uma Europa “promotora da paz, da democracia e dos direitos humanos”, qual é o posicionamento da IL em relação à Guerra na Ucrânia e ao conflito na Palestina?

AM – A Iniciativa Liberal defendeu o direito à soberania e a defesa da Ucrânia, desde o primeiro dia, imediatamente quando a Rússia invadiu a Ucrânia, sem hesitação. Somos fortes apoiantes não só da Ucrânia, como achamos que a União Europeia deve dar todo o apoio para que a Ucrânia, na medida da sua autodeterminação, se possa defender da agressão russa.

Apoiamos também a adesão da Ucrânia à União Europeia. Se a Ucrânia cumprir as condições de adesão, poderá entrar. É preciso ir mais além. A Ucrânia é um país pelo qual os ucranianos estão a dar a vida, não só pela sua soberania, mas também na defesa daquilo que é um projeto europeu, na medida em que querem fazer parte dele. A Rússia entendeu isso como uma ameaça, assim como a intenção da Ucrânia de aderir à NATO. [Os ucranianos], na defesa desse sonho, estão a dar a vida.

Não temos dúvidas de que a Rússia tem todo o interesse em perturbar o sucesso do projeto europeu de defender e ajudar a que a Ucrânia consiga, no futuro, cumprir as condições de adesão à União Europeia.

Quanto à situação do conflito israelo-palestiniano, por um lado, defendemos o direito de Israel à sua defesa. Mas, por outro, estamos preocupados com a desproporcionalidade da operação militar de Israel na Palestina, nomeadamente a nível de impedir a ajuda humanitária que tenta lá chegar. Há aqui, de facto, razão para estarmos preocupados com os excessos cometidos por parte do Governo israelita. É uma situação muito complicada.

A Iniciativa Liberal defende a solução dos dois Estados em que há uma coexistência pacífica entre os dois povos. Obviamente que não há condições para isso agora, apenas quando houver um cessar-fogo. Esperamos que o conflito consiga chegar a um ponto em que as partes possam negociar esse cessar-fogo e rumar a uma solução de dois Estados. Opomo-nos veementemente à agenda do Hamas, como organização terrorista, que infelizmente domina aquele território e que quer a erradicação do Estado de Israel. 

JPN – O Parlamento Europeu aprovou em abril o Pacto Europeu de Asilo e Migração. Como é que a IL olha para esse documento?

AM – Foram dados passos importantes na resolução de uma crise com a qual a Europa tem tentado lidar e não tem lidado bem ao longo de muito tempo e que se foi agravando. Há melhorias a fazer nesse pacto. Já se deram passos importantes no sentido de ter soluções para acolher de forma humana e justa os imigrantes que cumprem as condições de entrada, portanto, que são elegíveis. 

Depois, também têm medidas que vão no sentido de uma intransigência com as organizações de tráfico humano e outras formas de exploração laboral que se aproveitam da vulnerabilidade destas pessoas. Vemos com bons olhos estes primeiros passos dados.

Achamos bem que se estabeleçam critérios de solidariedade para receber. Quando há fluxos migratórios demasiado intensos, cada estado-membro fica obrigado a ajudar os Estados com esses fluxos migratórios mais intensos. Há estatutos de elegibilidade que passam a estar definidos de triagem. Há um sistema de asilo rápido. Há condições mínimas de integração.

Isto tudo é progresso para fazer face a uma situação que estava bastante indefinida e que perpetuava uma situação desumana nas fronteiras da Europa. Mas há melhorias a fazer, designadamente o aspeto da detenção de menores que, de facto, precisa de ser melhorado no futuro. 

Achamos bem que se estabeleçam critérios de solidariedade para receber. Quando há fluxos migratórios demasiado intensos, cada estado-membro fica obrigado a ajudar os Estados com esses fluxos migratórios mais intensos.

JPN – Sobre as eleições europeias, o que seria um bom resultado para a IL?

AM – Contamos estrear no Parlamento Europeu. É o único Parlamento onde a Iniciativa Liberal não está ainda representada. O nosso objetivo é eleger o João Cotrim de Figueiredo, o nosso cabeça de lista. E temos ambição para mais.

Há oportunidades para mais, mas também há muitas variáveis nestas eleições, designadamente o facto de calharem numa altura em que muitas pessoas estão de férias – e as eleições europeias, infelizmente, costumam contar com uma elevada abstenção dos portugueses. Há aqui várias variáveis que nunca comprometem a nossa ambição, fazem-nos, contudo, estabelecer o objetivo de, para já, eleger um primeiro eurodeputado.

Contamos estrear no Parlamento Europeu. É o único Parlamento onde a Iniciativa Liberal não está ainda representada.

JPN – De acordo com o Centro de Sondagens da Euronews, o Renew “está destinado a sofrer grandes perdas de eleitores em toda a Europa”. Considerando ser este o grupo a que a IL se vai juntar caso eleja eurodeputados, como é que o partido olha para esta sondagem?

AM – Estamos todos preocupados com o crescimento da extrema-direita por toda a Europa. As pessoas estão muito ansiosas com o futuro, porque, por um lado, vivemos tempos paradoxais, em que somos beneficiários do melhor período em termos de qualidade de vida da nossa história, mas, por outro lado, sentimos que ele nos está a escorregar pelas mãos.

Há muitas pessoas que, com essa preocupação e ansiedade, acabam por aderir ao discurso da extrema-direita, que é muito preocupante para o futuro da Europa e não oferece soluções para resolver essas ansiedades das pessoas.

De acordo com o que as sondagens preveem, os liberais, o S&D (Aliança Progressistas dos Socialistas e Democrata) e o PPE (Partido Popular Europeu) conjuntamente deverão manter a maioria no Parlamento Europeu. Portanto, isso é um fator para o Parlamento Europeu e os governos nacionais dos 27 estados-membros da União Europeia poderem finalmente dar resposta às preocupações das pessoas e assim fazer frente ao crescimento da extrema-direita, que acaba por ser uma ameaça ao próprio projeto europeu.

Editado por Filipa Silva e Inês Pinto Pereira