No âmbito do projeto europeu COPE, três jovens jornalistas europeias realizaram reportagens sobre a comunidade de Erasmus na cidade do Porto. Da Eslovénia, chegam vários jovens que falam de uma vida social mais animada mas também de uma realidade académica que deixa a desejar.

Esta reportagem faz parte de uma edição especial de carácter internacional promovida pelo JPN com a ajuda de três estudantes de Jornalismo do FEJS, que visitaram o Porto na primeira semana de maio.

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O Porto foi distinguido como melhor destino de Erasmus, em 2024. Efetivamente, a cidade recebe uma comunidade muito diversa e ativa de estudantes internacionais. No último ano letivo, só a Universidade do Porto registou a passagem de 2 283 jovens de 62 países diferentes. 

O JPN conheceu dois estudantes que vieram da Eslovénia: Maja Plateis (20) e Igor Arsov (20). Os jovens fazem parte do programa Erasmus+ e escolheram o Porto como cidade para viver e estudar durante um semestre. Apesar das diferenças entre a Eslovénia e Portugal que têm vindo a encontrar, ambos se apaixonaram pela cidade e descrevem uma realidade académica – e de vida – muito mais relaxada.

“Uma atmosfera muito mais relaxada”

Maja Plateis é originária de Maribor, a segunda maior cidade da Eslovénia, localizada na região de Stajerska, a nordeste. É estudante de Psicobiologia na Universidade de Primorskem, em Koper. Agora, prossegue os estudos durante um semestre na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto.

A língua foi o maior entrave na sua adaptação. Para se encaixar de melhor forma na nova vida académica que encontrou, Maja inscreveu-se no programa de buddies que a faculdade possui. No entanto, a parte académica acabou por passar para segundo plano e optou por conhecer melhor a cidade e o seu modo de vida. Durante a sua estadia, que agora se aproxima do fim, ficou deslumbrada com “as paisagens da cidade, os espaços verdes, a segurança e a tranquilidade”.

E teve ajuda da faculdade para uma melhor integração? “A faculdade ofereceu-me a possibilidade de aprender português. No entanto, a maioria dos professores de Psicologia da FPCEUP são fluentes em inglês, o que facilita a aprendizagem. Para além disso, a bibliografia é maioritariamente em inglês”, conta Maja.

Também sobre a relação entre professores e alunos, Maja confessa que o ensino superior “é muito mais relaxado” em Portugal. Não obstante, diz que os docentes não têm por hábito acompanhar os estudantes de Erasmus e “não se importam muito com quem vem de fora”.

“Algo que também me surpreendeu foi o sistema de avaliações. Em Portugal, podes optar por realizar avaliação apenas por exame final. Na minha faculdade, na Eslovénia, acho que isso não é possível. Temos sempre um sistema de avaliação contínua obrigatório e depois um exame final. Aqui podemos optar pelo caminho que preferirmos”, explica.

Contudo, aproveitar a vida universitária é também uma dificuldade para alunos internacionais. “Existe sempre muita coisa a acontecer, dentro da faculdade e não só. Porém, os eventos são todos em português e direcionados para os estudantes portugueses. Sinto que não temos as mesmas oportunidades”, descreve a estudante eslovena.

Mesmo entre estudantes, Maja admite que os seus colegas portugueses não têm por hábito incluir os estudantes de mobilidade. Segundo a jovem, os colegas portugueses aparentam ser “mais tímidos e reservados, principalmente quando se apercebem que têm de falar em inglês”. No que diz respeito a tradições e festas académicas, apesar do interesse, Maja considera que não faz parte dessa realidade.

A jovem eslovena contou ao JPN que conseguiu facilmente arranjar um apartamento no Porto, graças a ferramentas disponibilizadas pelo programa de Erasmus. No entanto, a despesa com a habitação é um dos seus maiores problemas: “A minha maior dificuldade, em termos económicos, é pagar o apartamento. Em Portugal, não existem residências públicas para estudantes de Erasmus e a única opção é ficar em estabelecimentos privados. Acabo por gastar a maior parte do meu dinheiro para conseguir pagar a renda”.

Vida académica “lenta”, vida noturna “agitada”

Quem também trocou a Universidade de Primorskem, em Koper, pela Universidade do Porto por um semestre foi Igor Arsov, estudante de Gestão. É natural de Skopje, na Macedónia, mas preferiu estudar na Eslovénia. Agora, em Portugal, assiste às aulas na Faculdade de Economia. Para além do prestígio da cidade, escolheu o Porto pela sua proximidade ao mar, algo que valoriza bastante.

Em termos de acomodação, Igor teve “mais sorte”. As ferramentas do programa Erasmus+ facilitaram a tarefa e rapidamente encontrou um lugar para ficar. Na rua Armando Cardoso, na Asprela, Igor encontrou uma casa para estudantes estrangeiros por onde já passaram várias gerações dos mais diferentes lugares do mundo.

No entanto, admite que foi “um golpe de sorte” dada a crise habitacional que Portugal atravessa nas grandes  cidades e também porque tem conhecimento de muitas burlas na internet: “Nunca se sabe se podes acreditar nas propostas porque os proprietários podem querer enganar-te”. Aliás, o estudante crê que existe uma maior probabilidade de ser burlado em Portugal do que em Koper.

Tal como Maja, Igor teve também dificuldades com a língua portuguesa. “São idiomas muito diferentes. No início, não conseguia expressar-me corretamente, especialmente em lojas”, remata. Já na universidade, não esperava que isso fosse um problema mas apercebeu-se que não é hábito traduzir-se as aulas e os materiais de estudo. “Por vezes, têm de ser os estudantes a traduzir aquilo que o professor diz”, completa.

A integração na comunidade académica também foi difícil. “Os estudantes portugueses parecem mais reservados”, descreve. Igor admite que acaba por socializar apenas com outros estudantes internacionais e, por conseguinte, acaba por não participar: “Existem muitas tradições. A parte dos trajes, da praxe, as diferentes etapas durante o percurso académico… Apesar de me terem explicado, não me sinto parte destas tradições. É algo muito interessante de ver, mas sinto que não tenho qualquer tipo de contribuição”, explica Igor.

À semelhança da estudante de Psicobiologia, Igor também define o modo de vida português como “mais lento”, pacífico e relaxado em comparação com a Eslovénia. O estudante não esperava que o sistema de ensino fosse “tão despreocupado”, dado que está habituado a uma maior “rigidez” por parte dos seus professores eslovenos. “Para além disso, todos chegam atrasados, dos alunos aos professores. E nada acontece. Na Eslovénia, somos muito menos flexíveis”, acrescenta.

Um dos aspetos que mais o agrada é a vida social e noturna da cidade. “O Porto tem uma vida noturna mesmo muito boa, diversa e agitada. Conheces imensas pessoas diferentes, existe muita gente estrangeira e que fala inglês, as bebidas são baratas. A meu ver, é a melhor parte de estudar cá”, contou ao JPN. A Adega Leonor e a zona das Galerias de Paris são as áreas que prefere, principalmente pela abundância de pessoas estrangeiras e por serem espaços com programas direcionados a estudantes de Erasmus.

Enquanto a vida noturna é apetecível para um estudante de mobilidade, Igor pensa que a alimentação é algo que falha e que o faz ter saudades de casa: “Na Eslovénia, temos acesso a vales de estudantes que nos permitem ter uma refeição de forma mais acessível na maioria dos restaurantes”. Admite que por vezes frequenta as cantinas universitárias, mas que a qualidade deixa a desejar.

De uma forma geral, Igor está a “adorar” a sua estadia no Porto, que termina no final de junho. Os conselhos que tem para estudantes internacionais são os seguintes: “Estão num sítio diferente e vão ter saudades de casa e de várias pessoas. Mas o melhor que têm a fazer é manter a mente aberta, apesar do choque cultural”. Sublinha que os estudantes devem aproveitar esta “rara oportunidade” e conhecer o máximo de pessoas, apesar de ser difícil no início: “Quando chegas, não vês as outras pessoas como estranhos. Vês-te a ti como estranho. Eventualmente, acaba por se tornar bom e depois não vais querer ir embora”. 

Editado por Filipa Silva