Apesar de estarem a quase 2000 quilómetros de distância uma da outra, tanto Tilburg como o Porto sofrem tanto com as alterações climáticas que as cidades têm de se adaptar a elas. Apostar na mobilidade e nos espaços verdes são algumas das estratégias dos municípios.

Esta reportagem faz parte de uma edição especial de carácter internacional promovida pelo JPN com a ajuda de três estudantes de Jornalismo do FEJS, que visitaram o Porto na primeira semana de maio.

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O ano de 2023 foi o mais quente de sempre em todo o planeta, de acordo com o relatório State of Europe’s Climate in 2023, divulgado pelo programa Copernicus em abril deste ano. As inundações e as ondas de calor também se fizeram sentir e causaram danos no valor de 13 mil milhões de euros no continente europeu.

A Europa está a enfrentar as consequências deste fenómeno e é urgente tomar medidas. A cidade do Porto, em Portugal, e Tilburg, uma cidade no sul dos Países Baixos, localizada a cerca de uma hora de Amesterdão, investiram na criação de parques e zonas verdes, no reforço da mobilidade como medidas para promover a sustentabilidade e combater as alterações climáticas.

Em 2019, o Porto voltou a assinar o Pacto de Autarcas para o Clima e a Energia e assumiu o compromisso de reduzir voluntariamente as emissões de dióxido de carbono em 85% até 2030. Já Tilburg declarou em 2008, no seu programa climático para o período entre 2009 e 2012, que a cidade deveria ser neutra em termos climáticos em 2045.

O JPN falou com Filipe Araújo, vice-presidente da Câmara Municipal do Porto (CMP) e vereador da Inovação e Ambiente, e com Tom Daelman, porta-voz do município de Tilburg, para saber quais as medidas que os dois municípios estão a tomar para combater as alterações climáticas. As duas cidades europeias têm algumas estratégias comuns.

Cidades mais ecológicas para resistir ao calor e às inundações

Em 26 de julho de 2018, estavam 38 graus, muito mais quentes em Tilburg do que nos destinos de férias no sul da Europa. Nesse dia, estavam “apenas” 21 graus no Porto. Em 2019, o centro da cidade de Tilburg foi mesmo o local mais quente da Europa durante todo o verão. De acordo com o Atlas de Impacto Climático da fundação Climate Adaptation Services, a sensação térmica poderá atingir entre 41 e 49 graus nalgumas partes da cidade dentro de 25 anos. Para evitar esta situação, Tilburg está a tentar tornar a cidade mais verde, como explica Tom Daelman.

Na Willem II staat, já foram plantadas árvores e faixas de plantas mesmo antes dos passeios. Foi também criado um novo sistema de recolha de água, o que significa que a água da chuva já não vai para os esgotos, mas é absorvida pelas plantas no solo, pelo que haverá menos problemas com a água.

No Porto, os parques e as zonas verdes também ajudam a suportar as temporadas das chuvas, ao mesmo tempo que fazem parte do pulmão verde da cidade.

O parque da Asprela, onde o JPN entrevistou Filipe Araújo, vice-presidente da Câmara Municipal do Porto, é um exemplo disso mesmo. “Este parque não é só o verde e azul que temos, os cursos de água que temos, é muito mais do que isso. Neste momento, estamos em cima de uma barragem, e esta barragem, embora as pessoas não se apercebam, está construída especificamente para fazer face à água que pode, num evento extremo, aparecer e logo atrás de mim, podemos fazer face até 10 mil metros cúbicos de água”, explica Filipe Araújo.

O vice-presidente sublinha que “todas as soluções baseadas na natureza são muito importantes”. Coberturas verdes, novos parques e novas formas de controlo dos cursos de água da cidade são soluções que a autarquia pretende implementar. “Estamos a fazê-lo não só do lado público, mas também do lado privado. Estamos a tentar encorajar as pessoas que têm os seus próprios edifícios e terrenos privados a ajudarem-nos a lidar com os fenómenos extremos que vamos ter no futuro. Por isso, a estratégia é muito importante a este respeito”, referiu.

O Porto também colaborou com a Associação Telhados Verdes neste domínio. “Outro projeto interessante que fizemos foi, por exemplo, numa escola onde testámos três tipos de coberturas verdes. Um dos telhados verdes chama-se telhado verde solar. Esta é a vantagem de ter produção solar e fotovoltaica com uma cobertura verde”.

“As árvores permitem-nos reduzir a velocidade da chuva que cai na cidade. Por isso, ter mais árvores é muito importante para lidar com fenómenos extremos. Mas também podemos utilizar telhados verdes. Estamos a medir a drenagem com dois telhados, um com telhado verde e outro sem, e a forma como a drenagem está a funcionar. Todos estes projetos juntam-se para fazer face à estratégia de adaptação e mitigação do clima”, afirma Filipe Araújo.

O aumento da eficiência energética dos edifícios de habitação pública – que representam 12% do total de habitações do Porto – é também uma opção adotada no âmbito das estratégias da cidade para fazer face às alterações climáticas, como explica o responsável político.

Menos carros e mais (e melhores) transportes públicos

O município de Tilburg também está empenhado em fazer as pessoas deixarem os seus carros. “Para isso, é preciso oferecer o maior número possível de alternativas aos habitantes”, diz Daelman. “Através dos transportes públicos e tornando a cidade atrativa para os ciclistas e os peões, e a ecologia é também extremamente necessária.”

As obras na Willem II straat duraram mais de um ano, durante o qual parte da rua esteve constantemente inacessível. Aqueles que agora querem ir do centro da cidade para o oeste da cidade via Schouwburgring têm que atravessar a estrada várias vezes por causa da construção. De acordo com o porta-voz municipal, esta situação manter-se-á durante algum tempo: “Tenho más notícias para todos os que se encontram no centro da cidade, porque Tilburg vai continuar a ser construída durante algum tempo. Não há prazo para isso, mas vai continuar durante os próximos cinco anos”.

De acordo com os dados da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, existem 7 milhões de automóveis ligeiros em Portugal. Entre 2019 e 2022, o país ganhou quase mais meio milhão de carros. E este é também um problema no Porto, onde há muito trânsito.

Filipe Araújo assume que o cenário é preocupante, mas diz que o município do Porto tem como objetivo incentivar as pessoas a usarem cada vez mais os transportes públicos em vez dos carros pessoais. Para além disso, lembra a importância de um transporte público de qualidade e eficiente.

“A cidade também está à procura de transportes públicos mais amigos do ambiente. Por isso, temos duas novas linhas de metro que nos vão ajudar muito a reduzir o número de carros que hoje em dia têm de fazer este tipo de deslocações entre estes dois pontos. Também investimos na nossa empresa de autocarros”, destaca Filipe Araújo. “Neste momento, a empresa de autocarros é propriedade do município, e temos investido muito na empresa, renovando a sua frota. Neste momento, até 2027, 40% da frota será elétrica. Portanto, estamos a fazer uma grande mudança. É gás natural e elétrico, mas 40% será elétrico no futuro. Agora estamos a investir apenas na frota elétrica”.

Embora a aposta na mobilidade seja importante, o preço do transporte é também um fator que deve ser tido em conta para que as pessoas deixem de utilizar o automóvel, bem como os tempos de espera. Por este motivo, os preços foram adaptados e os estudantes universitários até aos 23 anos já não pagam.

“Reduzimos as tarifas há alguns anos. Neste momento, para se deslocar no Porto, paga-se 30 euros por mês para andar de autocarro, de metro ou de comboio. Mas se for um jovem com menos de 23 anos, é grátis. Isso mudou completamente a mobilidade na cidade, porque neste momento todas as crianças e jovens passaram a utilizar os transportes públicos”, revela o vice-presidente da Câmara.

Relativamente aos tempos de espera nos transportes e aos atrasos, Filipe Araújo reconhece a importância da eficiência dos transportes. O vice-presidente da Câmara acredita que o metrobus, um novo veículo movido a 100 por cento por hidrogénio e com prioridade sobre outros meios de transporte graças à sua própria faixa de circulação, pode ser um passo nesse sentido. O metrobus “acrescenta qualidade, rapidez e grande flexibilidade à rede de transportes”, segundo a Metro do Porto, responsável pelo projeto.

Além disso, Filipe Araújo sublinha a importância do digital, com aplicações e painéis nas paragens de autocarro que permitem saber os horários e percursos dos autocarros em tempo real.

Painéis solares e a transição energética para a neutralidade carbónica

Para além da “ecologização”, Tilburg está também a trabalhar na transição energética. O município quer livrar-se dos combustíveis fósseis e mudar para a energia verde. Por exemplo, já está a instalar painéis solares nos telhados. “Na verdade, queremos que toda a gente na nossa cidade também o faça”, diz Daelman. “Gostaríamos de utilizar esse espaço nos telhados, onde não incomoda ninguém, da melhor forma possível para gerar energia. Podemos então utilizá-la como substituto dos combustíveis fósseis”.

Além disso, o município também gostaria que os edifícios se tornassem mais sustentáveis para se afastarem dos combustíveis fósseis e pouparem mais energia. O próprio município já está a fazer isso nos seus próprios edifícios. Também estabeleceu acordos com associações de habitação e desenvolveu um programa para que as associações de proprietários e os proprietários de casas façam o mesmo. “Queremos que todos os edifícios da nossa cidade estejam preparados para a transição energética”, diz Daelman. “Por isso, vamos certificar-nos de que todas as nossas casas e todos os nossos edifícios na nossa cidade são isolados o mais possível.”

Tudo isto deverá garantir que Tilburg seja uma cidade completamente neutra em termos climáticos até 2045. Isto é, cinco anos mais cedo do que o governo nacional estabeleceu como objetivo. “Será um trabalho árduo para o conseguir”, diz Daelman. “Estamos a fazer tudo o que podemos para que isso seja possível em 2045, mas precisamos que todos o façam”.

Por exemplo, os habitantes de Tilburg já podem ajudar a atingir este objetivo, isolando as suas casas e tornando os seus jardins mais verdes. O próprio Daelman ainda não sabe se Tilburg conseguirá ser neutra em termos de carbono até 2045, mas é positivo em relação ao objetivo: “impomos esta ambição a nós próprios. Porque se não tivermos ambição, de certeza que não vamos conseguir”.

Como forma de investir em energia verde, o município do Porto, em colaboração com a Agência de Energia do Porto, lançou o projeto “Porto Solar”. O projeto permitiu instalar 2.300 painéis solares nos telhados de escolas primárias e edifícios públicos, num investimento de 700.022 euros por parte da autarquia. “Este projeto foi concluído e foi dedicado a 31 ou 32 edifícios, e começámos pelas escolas. Porquê as escolas? Porque produzimos energia nas escolas, mas também colocámos um ecrã em toda a escola para as crianças perceberem qual era a energia que estavam a utilizar, se estavam a produzir ou não, se estavam a utilizar eficientemente essa energia”, afirmou.

Filipe Araújo lembra que “o futuro não é só consumir energia verde. É também consumir a menor energia possível e, por isso, estamos a investir muito na reabilitação das habitações, na promoção deste tipo de novos edifícios que possam ser mais eficientes, e estamos a tentar também incentivar as pessoas a fazerem a reabilitação ou a construírem novos edifícios de forma a consumirem a menor energia possível”.

O Porto também está empenhado no Pacto Climático e, em comparação com Tilburg, espera atingir a neutralidade carbónica 15 anos mais cedo, em 2030. Mas será este um objetivo exequível? O vice-presidente da Câmara acredita que é possível. “É um compromisso que junta toda a gente, desde o cidadão à universidade, ao município, aos clubes de futebol, a toda a gente. Portanto, toda a gente é chamada a ter um compromisso específico que é com os objetivos de 2030. E o objetivo de 2030 é onde queremos ser neutros em carbono”.

Filipe Araújo refere o investimento na mobilidade e na energia como forma de atingir este objetivo. “O município representa apenas 6% das emissões da cidade. Portanto, não podemos fazer mais do que isso se não juntarmos toda a gente”.

Editado por Filipa Silva