O corpo de Bombeiros Sapadores do Porto, Gaia, Braga e Viana do Castelo está a fazer vigília na Avenida dos Aliados, no Porto. Os profissionais reivindicam o aumento dos salários, a diminuição da idade da reforma e a valorização da carreira.

Quem passa na Avenida dos Aliados, no Porto, não fica indiferente aos cartazes e às tendas que se encontram em frente à Câmara Municipal do Porto. Um grupo de homens encontra-se a guardar o local, envergando camisolas pretas onde se pode ler “Bombeiros Sapadores”.

Dizem que não querem ser identificados individualmente porque “falam em nome da classe”, mas afirmam que fazem parte da vigília os Bombeiros Sapadores do Porto, Gaia, Braga e Viana do Castelo. Desde 7 de setembro, estão acampados, no Porto, “em protesto pelas condições de trabalho que, de algum modo, têm sido esquecidas ano após ano”.

Desde 7 de setembro, os bombeiros sapadores estão a fazer vigília na Avenida dos Aliados, no Porto. Fonte: Inês Saldanha/JPN

O objetivo primordial é que a “carreira seja revista, que saia uma legislação que regule a carreira do princípio ao fim e que, efetivamente, dê o lugar de destaque que tem de ser dado a um corpo de bombeiros profissional e que seja transversal a todo o país”, referem em declarações ao JPN, que passou pelo local na quinta-feira (19).

O protesto acontece sem ligação a “nenhuma organização” pois, segundo o grupo, várias “hipóteses” foram dadas “aos sindicatos e a todas as comissões de trabalhadores locais”, mas “chega a um ponto que isso não é suficiente” e têm de ser os próprios a lutarem “pelo futuro da profissão e pelo futuro das pessoas que estão a entrar”.

Lamentam a desatualização dos salários, revelando que “há colegas que iniciaram a carreira com um ordenado base de duas vezes o salário mínimo e que, neste momento, ganham de base quase o salário mínimo”.

O subsídio de risco e disponibilidade permanente é de 7,03 euros mensais. Fonte: Inês Saldanha/JPN

No que diz respeito aos 7,03 euros de subsídio de risco mencionados num dos cartazes, os profissionais explicam que o “subsídio de risco e disponibilidade permanente anda nos 7 euros mensais, ao contrário do que muito gente pensa, não são 7 euros por dia, são 7 euros mensais que é totalmente irrisório”.

As aposentações também fazem parte das demandas dos operacionais. Afirmam que “as alterações do decreto-lei 106/2002, em 2019, para a carreira dos bombeiros sapadores só veio tirar anos à aposentação”.

“Nós tínhamos uma aposentação faseada – quanto mais baixo na hierarquia, mais cedo íamos [para a reforma], em resultado de o esforço físico ser maior. Mas como já não somos o corpo especial da função pública, já não temos esse estatuto, somos uma carreira não revista. É completamente inconcebível nós estarmos na linha da frente aos 60 anos”, afirmam.

Bombeiros querem o mesmo reconhecimento de outras forças de segurança  

Os testemunhos que partilham demonstram uma desilusão para com o panorama atual da profissão: “Entrámos para uma carreira que era aliciante, tínhamos uma perspetiva de futuro, de evolução”, expectativa frustrada pelo congelamento das carreiras. Existem “colegas que tiveram uma primeira progressão passados 11 anos” ou ainda “colegas que foram reformados há pouquíssimo tempo e em toda a sua carreira de bombeiro só conseguiram fazer duas progressões” quando existem “oito patamares de progressão”.

Eu entrei em 2003 e só em 2019 é que fomos promovidos. Esperei 17 anos. Fui sempre dos mais novos durante 17 anos e só à entrada da recruta de 2019 é que nós fomos promovidos, ou seja, [durante anos] nem fomos promovidos nem tivemos escalões, estivemos completamente parados”, relatou ao JPN um dos bombeiros presentes no protesto.

Sentem uma desvalorização por parte do Governo e almejam “ser reconhecidos, no mesmo peso e na mesma medida,” que as outras forças de segurança. Compreendem que embora os riscos sejam diferentes, também enfrentam o mesmo “grau de risco” e exigem “o mesmo grau de compensação”.

É completamente inconcebível nós estarmos na linha da frente aos 60 anos.

Se por um lado muito se tem falado sobre a importância dos bombeiros em momentos de alerta, por outro lado estes profissionais constatam que “todos os anos acontece sempre [os incêndios] com mais ou menos mediatismo e nunca nada foi revisto. Os orçamentos de Estado são aprovados constantemente e nunca pensaram em nós. Neste momento somos heróis, amanhã somos esquecidos”.

Quando questionados sobre a forma como têm conciliado a vigília nos Aliados com os incêndios – que ainda lavravam em Gondomar e noutros concelhos do distrito na altura da entrevista -, dizem que combinam as horas de serviço: o tempo extra “para fazer face aos incêndios rurais” e o “tempo de folga” para o protesto.

“Nós estamos cá 24 horas sobre 24 horas. Está sempre aqui alguém, seja de dia, seja de noite. Revessamo-nos para manter sempre cá alguém. Não estamos em greve, estamos numa vigília”, sublinham. “Há pessoal aqui que não vê a família há dois/três dias, que não vai a casa. A nossa família sofre com isto”, acrescenta o bombeiro.

Até ao momento, não receberam qualquer proposta para “fazer negociações para o próximo orçamento do Estado” e prometem manterem-se em vigília por “tempo indefinido” até que existam “resultados práticos”: “Sabemos que a revisão da carreira é um processo longo, mas pequenas alterações que nos consigam dar alguma qualidade de vida, um aumento remuneratório e um reconhecimento mínimo, terá de acontecer num futuro próximo”, sustentam.

O protesto, que teve início a 4 de setembro, em Lisboa, com a vigília dos bombeiros sapadores de Lisboa, Viseu e Tavira junto à Assembleia da República, irá intensificar-se dia 2 de outubro na Manifestação Nacional dos Bombeiros Sapadores, em Lisboa, com o intuito de se fazerem ouvir numa altura de apresentação e discussão do Orçamento do Estado.

Até lá, procuram reunir 25.000 assinaturas na petição em curso – que conta já com 15.168 subscrições – e que pretende fazer com que “os cidadãos participem na causa” da valorização dos bombeiros sapadores e das suas carreiras.

Editado por Filipa Silva