Editora-chefe do projeto editorial austríaco, que funciona em exclusivo no Instagram e no TikTok, e que tem a geração Z como público-alvo, esteve no Porto a apresentar o projeto na terceira e última conferência comemorativa dos 20 anos do JPN. O evento fez parte do VIII Congresso de Ciberjornalismo, que decorreu quarta e quinta-feira na Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

Anna Jandrisevits é a editora-chefe do Die Chefredaktion e esteve no Porto a apresentar o projeto editorial. Foto: Fernanda Lima/ObCiber

Os media tradicionais “falham em chegar aos mais jovens”. O conteúdo, a linguagem, os temas que escolhem abordar “são pensados para adultos”. Em consequência disso, diz Anna Jandrisevits, muitos jovens não consomem notícias, nem têm literacia mediática. No Die Chefredaktion, projeto editorial austríaco apresentado na semana passada no Porto, “em vez de julgar” os jovens, a receita é outra: adaptar os conteúdos noticiosos “às suas necessidades e ao jornalismo que querem consumir”.

Criado em 2021, o projeto editorial funciona exclusivamente no Instagram e no TikTok e tem a “geração Z” como público-alvo, isto é, os jovens nascidos entre a segunda metade da década de 90 e o ano de 2012. 

Com 27 anos acabados de fazer, Anna Jandrisevits, a editora-chefe do projeto, sublinha que é “a mais velha” da equipa, atualmente formada por cinco pessoas. Não por acaso: A nossa visão é que, para chegar aos jovens, temos que ter pessoas jovens na equipa. É a equipa editorial mais jovem da Áustria”, referiu.

Além da juventude, consideram fundamental estar nas redes sociais. Apesar do potencial “uso problemático” destas plataformas, a solução não é sair, na opinião da jovem: “para recuperar a confiança dos jovens no jornalismo, para informá-los de forma séria e confiável e para prevenir a desinformação e a radicalização temos de providenciar jornalismo nestas plataformas”, afirmou.

Contando atualmente com mais de 70 mil seguidores, o Die Chefredaktion cobre a atualidade, tendências, conteúdos com que os jovens se possam sentir identificados, usando muitas vezes o que chamam de “storytelling em camadas”. “Por exemplo, podemos fazer um vídeo em que estamos a cozinhar enquanto explicamos algo [da atualidade]. Fazêmo-lo não só para chegar aos jovens, mas também para enganar o algoritmo”, referiu, lembrando que, em plataformas como o Instagram e o TikTok, o conteúdo político é mais votado à “sombra”.

A equipa do Die Chefredaktion faz entrevistas, histórias pessoais, reportagens, inquéritos de rua e também textos de opinião, sempre a partir da “perspetiva dos jovens” e a partir de formatos originais que cativem o olhar dos mais novos.

Excerto da página do projeto no Instagram.

Têm também uma newsletter semanal e, mais recentemente, criaram uma coluna de acesso exclusivo para subscritores, protegida por uma paywall. “Começámos esta coluna com uma autora anónima que escreve sobre as suas experiências em encontros amorosos e tem corrido muito bem. É publicada mensalmente e é só para subscritores”, explicou.

Na origem, o Die Chefredaktion fez parte de uma empresa que detinha outros projetos editoriais, mas tornou-se independente no início deste ano. O financiamento do projeto que, garante Anna, é muito difícil, faz-se para já através das subscrições e também de publicidade e da produção de conteúdo patrocinado – “devidamente identificado” e feito “muito raramente”, sublinhou. À parte a coluna mensal, todo o conteúdo é de acesso gratuito nas redes do projeto.

Na apresentação que fez no Porto, a jovem jornalista defendeu ainda a necessidade de garantir diversidade na equipa redatorial, e debruçou-se também sobre o discurso de ódio online, que diz já ter sentido em diversas ocasiões.

Ele revela-se “especialmente quando as histórias são sobre feminismo, islão ou imigração”, referiu, numa alusão a um relatório do International Press Institute. 

Em tópicos mais sensíveis, que a jovem diz serem evitados pelos media tradicionais por causa desse discurso, a estratégia do Die Chefredktion passa por ouvir “o máximo de vozes” e “pessoas diretamente afetadas pelos problemas”.

“No caso de Israel e Gaza, por exemplo, o que fizemos foi ouvir um jovem de Gaza e um jovem judeu de Israel. Desativamos os comentários logo à partida e deixamos que cada um deles contasse a sua história. Perguntamos-lhes o que é que estavam a sentir, quais eram sobre os seus pensamentos sobre o que se estava a passar e fizemos estes dois retratos”, exemplificou.

Projeto quer chegar a mais “homens jovens”

Ainda no plano das fontes, da plateia veio uma pergunta sobre como se equilibra essa perspetiva mais emocional e baseada na experiência com o papel jornalístico de verificação e enquadramento. Anna Jandrisevits respondeu que essa é uma preocupação da equipa. Entre outras coisas, adicionam informação escrita nos vídeos e intervêm nos comentários. Em todo o caso, confessa, o ideal seria poder ter na equipa alguém responsável só por pesquisa e verificação, o que não é para já o caso.

Outra questão da plateia visou especificamente a série “Makeup my mind”, na qual as jovens repórteres falam sobre assuntos políticos enquanto fazem a maquilhagem. Anna, que aparece na série a falar sobre Gaza, referiu que “compreende totalmente” as dúvidas que o formato pode suscitar, mas se esse é o caminho necessário para enganar o algoritmo e assim falar de assuntos importantes, então, essa vai ser a opção a tomar.

Na apresentação que fez no Porto, a jovem partilhou também o objetivo fixado pela equipa do Die Chefredaktion para o a próximo ano: atrair mais “jovens homens” na sua audiência. Para isso, estão a ponderar recrutar jovens do sexo masculino para a equipa e alargar a presença noutras redes sociais também elas mais atrativas para este grupo, casos do Twitch, do Reddit ou ainda do Youtube.

A conferência “Jornalismo online para a juventude de hoje – Notícias no Instagram e no TikTok” decorreu na última quarta-feira, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, integrada no programa do VIII Congresso de Ciberjornalismo. Foi a terceira e última conferência comemorativa dos 20 anos do JPN, que, em março, promoveu um debate entre jovens jornalistas e, em setembro, uma discussão sobre o jornalismo feito no e para o Porto