O passado sábado (23), no Porto, ficou marcado por duas manifestações com agendas antagónicas. Enquanto o Chega e os seus apoiantes marchavam contra a “insegurança e a imigração descontrolada”, uma contramanifestação reuniu organizações antifascistas e antirracistas para defender os direitos dos imigrantes e combater discursos de ódio.
Dois protestos levaram para as ruas da cidade Invicta uma diversidade de vozes e reivindicações na tarde de sábado (23). De um lado, o partido Chega convocou uma manifestação contra a “insegurança e a imigração descontrolada”, do outro, uma contramanifestação, organizada por cerca de 28 organizações, defendia que “de maneira nenhuma a imigração está relacionada com a insegurança ou com o aumento do crime”.
A manifestação promovida pelo Chega teve início na Praça do Marquês de Pombal e contou com a presença do líder, André Ventura, e dos deputados Pedro Pinto e Rita Matias. Juliana Nunes, membro da organização, referiu ao JPN que o objetivo da iniciativa era “mostrar às pessoas que o partido não é contra a imigração, mas sim contra a imigração descontrolada”.
Irene Ferreira, imigrante em Portugal há dez anos, aderiu à manifestação do Chega e garantiu não se sentir discriminada pela retórica do partido: “Não. Eu sou a favor da imigração controlada. Desde que a pessoa tenha capacidade, qualificação e venha com o propósito de trabalhar e viver honestamente. Não é porque sou brasileira que tenho de apoiar qualquer tipo de imigração.”
Entre bandeiras de Portugal e do Chega, cartazes em punho e gritos como “controlem as fronteiras”, “Portugal é nosso” e “nem mais um imigrante ilegal”, a manifestação atravessou as ruas de Santa Catarina e de Passos Manuel em direção à Avenida dos Aliados, onde André Ventura discursou aos presentes.
O líder do Chega apontou a imigração como um problema central, associando-a à insegurança e à criminalidade. Durante a sua intervenção, pediu que se “controlem as fronteiras” e destacou que “nos últimos dois anos, a imigração em Portugal aumentou 95%”, o que se verifica de acordo com os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE).
Ventura também mencionou que, de acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), “30% dos que foram detidos no último ano foram estrangeiros” e que “dos que estão nas prisões, cerca de 20%” também o são.
O RASI não faz referência à percentagem de estrangeiros detidos no último ano. Refere sim que o número total de estrangeiros detidos em Portugal se tem mantido “estável”, correspondendo, em 2023, a 16,7% da população prisional.
Se se considerar somente os presos com condenação (excluindo, assim, os que se encontram em prisão preventiva), a percentagem de estrangeiros nas prisões baixa para 12,9%, segundo os dados da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP).
Ventura concluiu as suas declarações ao afirmar que “nós nunca vamos ter um país seguro. O Porto nunca vai ser seguro”, apesar do que os rankings como o Global Peace Index dizem, quando colocam Portugal entre os países mais seguros do mundo.
A cerca de 600 metros da manifestação do Chega, na Batalha, com cravos e faixas terminava a manifestação antifascista que teve início no Campo 24 de Agosto. Segundo Raul Castro, membro da organização Habitação Hoje, este movimento tinha como objetivo demonstrar “solidariedade à comunidade imigrante em Portugal, que vem sendo covardemente atacada pelo Chega”. O jovem de 25 anos enfatizou: “Todos nós queremos segurança, mas não acreditamos que a segurança passe pelo ódio ao outro”.
A contramanifestação contou com organizações antifascistas, antirracistas, membros da comunidade LGBTIQA+, feministas, movimentos em defesa da habitação e apoiantes pró-palestinianos.
Luís Esteves, representante da União da Juventude Comunista (UJC), defende que é preciso “enfrentar uma extrema-direita” que, segundo a sua opinião, discorre um “discurso de ódio, com essa retórica falsa de que os imigrantes trazem para cá criminalidade”.
O Núcleo Antifascista do Porto também marcou presença e Carolina Moreira, porta-voz do movimento, explicou que o “ponto principal” da contramanifestação foi “que realmente não podemos ter organizações de extrema-direita […] a reivindicar as ruas, a manifestar-se, a propagar discurso de ódio e falsa informação”.
Matilde Castro, uma das participantes, sublinha a relevância da iniciativa: “Esta manifestação tem imensa importância, especialmente no momento em que vivemos agora, politicamente, em que o fascismo está a crescer. Existe cada vez mais um ódio aos imigrantes, uma ignorância em relação ao papel dos imigrantes, em Portugal, as suas contribuições e umas fake news que se propagam com imensa rapidez, que dizem que os imigrantes não contribuem para o país e não são de facto uma mais-valia.”
Matilde também comentou sobre a manifestação organizada pelo Chega, ressaltando: “Vivemos em democracia, e toda a gente tem o direito de se manifestar.”
Ambas as manifestações contaram com algumas centenas de participantes e terminaram sem qualquer incidente ou intervenção policial.
Editado por Filipa Silva