A estratégia de promoção de uma região "com 21.000 quilómetros quadrados de coisas bonitas para apresentar" foi o mote de uma entrevista com o presidente da Turismo do Porto e Norte de Portugal. A atratividade do Porto, os efeitos do turismo, a TAP ou a taxa turística foram outros tópicos abordados.
Luís Pedro Martins é presidente da Turismo do Porto e Norte de Portugal (TPNP) desde 2019, cargo para o qual foi reeleito em fevereiro de 2024. É também quem preside à Associação de Turismo do Porto, acumulando as duas funções e assumindo como objetivo fundir as duas instituições.
Os trunfos turísticos da região Norte são muitos: “Temos o único parque nacional do país [Parque Nacional da Peneda-Gerês], cinco parques naturais, 140 quilómetros de costa atlântica e cinco patrimónios UNESCO”. Mas o que Luís Pedro Martins considera ser o destaque é a “gente espetacular, que sabe receber como ninguém” e que, segundo o líder da TPNP, faz com que o turista queira repetir a experiência, ou possa recomendá-la a outros. “Temos uma região espetacular, com 21.000 quilómetros quadrados de coisas bonitas para apresentar, excelente gastronomia, excelentes vinhos e maravilhosas paisagens”, começou por referir ao JPN, numa entrevista realizada em novembro na sede do Turismo Porto e Norte de Portugal.
A região conta ainda com as condições necessárias para explorar várias tipologias de turismo, como “o turismo náutico, o turismo religioso, que tem tido um impacto muito grande com os Caminhos de Santiago cada vez a crescer mais, o termalismo ou o turismo industrial” e isso significa que há no Norte “tempo para a diversidade.” “Numa hora mudamos totalmente de paisagem, mudamos do mar para a montanha, para os rios, para os lagos. Numa hora mudamos de gastronomia, mudamos de vinhos, podemos ir dos vinhos verdes até aos vinhos do Douro. Em muito pouco tempo, mudamos completamente de realidade e isso é fantástico para um turista que disponibiliza quatro ou cinco dias para visitar uma região”, sublinha.
Luís Pedro Martins considera que a preferência pela região Norte nos últimos anos, para além da diversidade da oferta, se deve à aposta “muito forte [da promoção turística] nos mercados considerados de alto rendimento”, como o mercado americano e canadiano, e também nos mercados como a Espanha, Alemanha, França, Brasil e Reino Unido. “Trabalhamos muito a promoção externa. Fizemos muitos road shows, muitas participações em feiras”, reforça o presidente da entidade regional.
A forma como a região é promovida varia em função do território onde é feita a promoção: “Os asiáticos não procuram a praia. Procuram, sim, natureza e património. Os europeus procuram muito a gastronomia e o enoturismo, já os asiáticos não procuram tanto. São, aliás, os mercados que mais se previnem, trazendo, por vezes, na mala, os seus próprios kits de sobrevivência. Não acreditam na gastronomia local”, conta Luís Pedro Martins. Países como a Coreia do Sul ou o Vietname têm sido relevantes no contexto asiático, porque “têm uma percentagem muito grande de católicos, que quando visitam [a região] procuram cidades onde o património religioso seja forte.” Braga ou Lamego afiguram-se como paragens possíveis neste contexto.
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Luís Pedro Martins licenciou-se na Escola Superior de Design, em Matosinhos. Foi deputado, adjunto do ministro da Justiça, Alberto Martins, e diretor de comunicação da Santa Casa da Misericórdia do Porto. Nessa função, começou a envolver-se com a área do turismo, nomeadamente na criação do Museu da Misericórdia do Porto (MMIPO). Foi convidado para a direção executiva da Irmandade dos Clérigos pelo hoje cardeal D. Américo Aguiar. Também trabalhou na reabertura ao público da Torre dos Clérigos, em 2014, depois de um ano de obras, o que lhe permitiu maior conhecimento sobre mercados e dinâmicas do turismo.
Em termos de promoção turística, a região Norte está dividida em quatro sub-regiões: o Douro, o Minho, Trás-os-Montes e o Porto. “Durante muitos anos a única coisa promovida era o Porto e o Grande Porto. Isto criava um desequilíbrio, porque 75% dos turistas chegavam e não saíam da área metropolitana. É precisamente ao levar ações de promoção externa destes outros destinos e dos produtos que lhes estão associados, que conseguimos começar a diminuir essa diferença, esse desequilíbrio”, observa ao JPN Luís Pedro Martins.
Mas para distribuir o turismo, não basta querer. A falta de infraestruturas nalgumas áreas do território constitui um problema. Luís Pedro Martins explica que enquanto o Douro e o Minho cresceram em termos de números do turismo, nos últimos anos, porque têm “uma capacidade hoteleira fantástica”, não se passa o mesmo em Trás os Montes, onde a oferta é escassa: “Não conseguimos levar turistas, se depois eles não tiverem onde dormir. O que acontece é que depois voltam para dormir no Porto e é aqui que deixam dinheiro no alojamento. A ideia é que isto aconteça também fora daqui”, refere.
O Porto é contudo, assumidamente, a “grande marca de atração” da região. “Sem dúvida, é a nossa âncora. O que temos de fazer agora é aproveitar essa atração que o Porto consegue ter e distribuí-la pela região. O município do Porto está também interessado, obviamente, em ajudar a distribuir melhor os turistas, não só pela cidade, mas também pela região. Até porque o Porto sabe que é sempre incontornável. Aconteça o que acontecer, por mais dias que o turista possa dispensar para o Douro ou para o Minho ou para Trás os Montes, é sempre quase prioritário para o turista passar no Porto. E é fácil de perceber porquê”, remata.
O que temos de fazer agora é aproveitar essa atração que o Porto consegue ter e distribuí-la pela região.
A Rua de Santa Catarina, no Porto, é uma das mais concorridas artérias da cidade. / Fotografia: Carolina Monteiro
Nesta tarefa, as companhias de transporte aéreo de turistas são grandes, se não as maiores aliadas. Em relação à polémica em torno da TAP e do número reduzido de rotas para o Porto, Luís Pedro Martins entende que a companhia aérea nacional deveria ter um papel mais preponderante no transporte de passageiros para a região, tendo em conta o perfil de cliente diferente das companhias low cost. “Tenho feito parte do pelotão da frente que vai sempre sinalizando essa questão junto da TAP. Nos últimos anos, com a nova administração, temos tido uma relação mais próxima. Temos conversado mais. Não temos tido ainda resultados, porque esta administração herdou o plano de reestruturação da TAP, que obriga que até 2025 não possam ser feitos, de facto, novos investimentos, nomeadamente novas rotas.”
O presidente da TPNP sublinha que a TAP é preponderante sobretudo nas ligações ao continente americano, a países como o Brasil, os Estados Unidos, o Canadá. “Foi-nos prometido que o Aeroporto Francisco Sá Carneiro teria essa atenção por parte da TAP. Estamos com grande expectativa para que isso aconteça no próximo ano [2025]. Se não acontecer, será mais uma desilusão enorme, a juntar a muitas outras que o aeroporto tem tido em relação a esta empresa nos últimos anos. Para já, estamos a dar um voto de confiança para 2025.”
Setor recuperou em pleno da pandemia
Para Luís Pedro Martins, o setor do turismo foi “aquele que mais perdeu, de todos os setores” com a pandemia, recorda. As empresas chegaram “praticamente ao zero absoluto” em termos de faturação e “foram muito poucas aquelas que conseguiram manter atividade.” O presidente da entidade regional fala por isso de uma “recuperação astronómica”, que fez com que o setor do turismo tivesse o título de motor da economia nacional.
“Conquistamos resultados durante uma década, perdemos tudo num ano, e depois, num outro ano, conseguimos recuperar tudo o que tínhamos perdido”, afirmou. Num primeiro momento as pessoas procuraram destinos mais ligados ao turismo de natureza, havia uma marca da pandemia, mas segundo Luís Pedro Martins isto foi “uma questão de meses” e considera que a normalidade se repôs. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2019, a região Norte registou um total de 10.8 milhões de dormidas, enquanto que em 2020 registou apenas 4.3 milhões, tendo descido para mais de metade. No ano de 2022, os números pré-pandemia foram superados, registando um total de 11.5 milhões de dormidas.
Por outro lado, se a digitalização era já uma tendência pré-pandemia, tornou-se uma tendência ainda maior durante e após os anos do Covid-19. É neste seguimento que Luís Pedro Martins refere a criação do primeiro Marketplace de uma região de turismo, um espaço online onde as empresas associadas podem vender os seus produtos turísticos. Muitas empresas do setor “não tinham presença online”, justifica Luís Pedro Martins.
O turismo pode ser sustentável?
Também o turismo sustentável é, cada vez mais, uma exigência dos viajantes e, principalmente, das comunidades locais. Luís Pedro Martins diz que “esta questão vai ser um requisito de escolha” de “uma nova geração de turistas mais exigentes” que “não perdoam destinos que não preservem a sua sustentabilidade”, tanto ao nível social como ambiental.
No caso do Porto e do Norte de Portugal foi criado o movimento I’m in Sustainability. Um compromisso que a TPNP quer promover junto das empresas da região para que tratem das suas certificações ambientais. “Nós ajudamos, disponibilizamos técnicos para o poder fazer. Acreditamos que no momento em que tivermos um conjunto significativo de empresas do setor com esta questão tratada, podemos ambicionar ter uma região também ela própria certificada em termos ambientais”, refere ao JPN.
“Estamos a fazer esse trabalho, assim como outro, que é tentar que cada vez mais haja uma noção de que o turismo não pode prejudicar aqueles que lá vivem.” A TPNP é constituída por 86 municípios: “a coesão também se faz dando visibilidade a esses territórios [do interior], para que possam também eles viver do turismo. Desafio sempre que me digam qual é o setor de atividade que aposta mais no interior do que o turismo.”
Apesar de, em 2023, segundo o INE, o Porto ter registado quase 70% das dormidas na região, Luís Pedro Martins não acredita que exista um excesso de turismo na cidade. Considera que “isso é um mito que alguns estão a tentar ajudar a criar.” O Porto será sempre a âncora do turismo na região Norte. O presidente da entidade regional considera que este movimento de descontentamento é culpa, também, do próprio setor, “que durante muito tempo achou que não era necessário passar essa comunicação e deixou que os anti-turismo viessem para a praça pública fazer este papel.”
“Ouço barbaridades de pessoas que dizem que têm saudades do Porto do antigamente, como era há 20 anos”, sublinha Luís Pedro Martins. Esse Porto “de que alguns dizem ter saudades” era, na visão do responsável, um Porto “degradado, sujo, pobre, de crianças descalças, de prostituição, de droga no centro da cidade” e diz que “o turismo conseguiu de facto, recuperar todo esse património. Conseguiu fazer com que artérias que estavam em decadência, hoje estejam totalmente recuperadas.”
Revela ainda que o Turismo de Portugal vai lançar uma campanha para reforçar “as vantagens do turismo, e vai fazê-lo de uma forma muito interessante: não vai pôr pessoas do turismo. Vai pôr pessoas de outros sectores a falar da importância que tem para elas esta atividade.”
Também a Estação de São Bento recebe todos os dias milhares de pessoas. / Fotografia: Carolina Monteiro
A taxa turística é uma das estratégias de redução da pegada da atividade turística nos territórios onde é aplicada. Luís Pedro Martins considera que seria útil que os municípios fizessem o trabalho de mostrar às pessoas como ela é aplicada, de modo a que os residentes saibam para onde vai e que dimensões tem o que resulta desta taxa. E ela vai, por regra, “precisamente para compensar essa pegada turística, para a requalificação urbana, para a limpeza, para a segurança.” Por outro lado, entende que uma parte da receita da taxa devia reverter para a promoção externa: “uma coisa é estar a fazer promoção em Espanha ou França, outra é fazer promoção no Canadá, nos Estados Unidos, em Singapura, na Coreia do Sul. Mas como são esses mercados que nós queremos atrair, precisávamos, de facto, de ter mais orçamento para isso”. Não vê também com bons olhos a “amálgama de situações de aplicação, de cobrança e até de valores” da taxa turística em Portugal. “Não existe uma regra. Cada um faz o que quer”, remata.
Luís Pedro Martins encara o presente mandato com alguns desejos: o de ver evoluir os quatro sub-destinos da região com números “mais interessantes”; o de ver chegar “turistas de alto rendimento, que deixassem mais à economia local”; e um turismo “baseado na acessibilidade e no respeito pelo ambiente e pelas pessoas”. “Gostaria que conseguíssemos deixar uma marca positiva na região de forma a garantir também que, com isso, melhoramos a qualidade de vida de quem aqui vive”, concluiu.
Editado por Filipa Silva
Este artigo foi realizado no âmbito da disciplina TEJ II – Online