O presidente da Associação Portuguesa de Radiodifusão (APR) conversou com o JPN sobre o panorama nacional da rádio e as perspectivas da evolução do meio no futuro.
Dia Mundial da Rádio assinala-se a 13 de fevereiro desde 2011, após decreto da UNESCO. Foto: Ana Isabel Reis/JPN
Luís Mendonça conta com cerca de 30 anos de experiência em jornalismo, dirige a Universidade FM e o jornal “Notícias de Vila Real”. Foi eleito presidente da Associação Portuguesa de Radiodifusão (APR) em 2022 e está prestes a tomar posse do segundo mandato nesta organização. No Dia Mundial da Rádio, que se celebra esta quinta-feira, o discurso é otimista. Antigamente as pessoas ouviam a rádio num equipamento que havia por casa, depois passaram a ouvir nos carros e hoje estão a ouvir através da internet: “A forma de as pessoas ouvirem a rádio transformou-se, mas continuamos a ter bastantes ouvintes. O problema não é ter mais ou menos do que tínhamos há dez anos, porque o último estudo da Marktest diz que mantêm-se os ouvintes da rádio de há dez anos. Mudaram-se apenas as plataformas onde ouvem.”
A estatística anima Luís Mendonça: “Todos os estudos que temos visto publicados, vão no sentido de mostrar que a rádio não deixou de ser ouvida, algo que é o maior problema de outros meios tradicionais. A televisão e o jornal estão a diminuir drasticamente a audiência e na rádio não tem acontecido isso.”
O presidente comenta também outro estudo da Marktest que refere que a rádio foi o segundo meio que aumentou mais em publicidade, em relação aos outros meios de comunicação: “Faz crescer esse otimismo para o futuro. Se a publicidade começa a aumentar, é também uma das formas de manter vivas as rádios mais interessantes para quem ouve.”
O Dia Mundial da Rádio foi proclamado na 36.ª Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) em 2011 e celebra-se a 13 de fevereiro. O objetivo desta data é demonstrar a importância da rádio, nomeadamente como meio de comunicação que consegue alcançar populações mais remotas e marginalizadas, garantindo o acesso à informação e ao conhecimento. Todos os anos, as rádios portuguesas mais ouvidas realizam programas para celebrar ocasião.
Em relação à inteligência artificial, a APR tem estado a fazer um trabalho sobre o modo como as rádios podem beneficiar das novas formas de comunicar. “Temos como proposta, neste mandato que agora começou, criar um grupo de trabalho para poder estudar novas formas de comunicar para as podermos utilizar a nosso favor e, portanto, é isso que vamos tentar estudar nesses próximos tempos”, revelou Luís Mendonça. “Já vemos que há rádios que estão a utilizar a inteligência artificial. Sabemos de rádios que já produziram, na altura do Natal, um pequeno jingle com música gerada por inteligência artificial”, exemplificou Luís Mendonça.
O presidente da APR defende a adaptação da rádio às novas gerações: “Os jovens mais novos não têm tanta ligação à rádio, até aos 15, 16, 17 anos, e depois a partir daí, quando começam a crescer, a partir dos 25, 30, é que começam a criar uma ligação outra vez. Temos de estar mais presentes nos formatos que vão aparecendo para os mais jovens não se desligarem do nosso meio, porque nós sabemos que neste momento são aqueles que têm mais dificuldade em acompanhar a rádio.”
Rádios locais com direito a “tempo de antena”
O Plano de Ação para a Comunicação Social apresentado pelo Governo em outubro prevê que as rádios locais vão passar a ter a possibilidade de ter tempo de antena em todos os momentos eleitorais e não só nos momentos das eleições autárquicas, uma das reivindicações mais antigas da Associação Portuguesa de Radiodifusão. “Hoje em dia, as rádios locais só têm direito a tempo de antena quando há eleições autárquicas, o que nós íamos reivindicando há uma série de anos e, pela primeira vez, foi inscrito num programa de Governo. Passámos a ter tempos de antena em todos os momentos eleitorais, ou seja, nas presidenciais, nas europeias e nas legislativas”, esclareceu Luís Mendonça.
No âmbito do plano, ficou também prevista outra alteração relevante, na visão do setor: a possibilidade de as decisões das autarquias serem publicitadas nas rádios e nos jornais das suas localidades: “É uma forma de canalizar dinheiro para a comunicação social que paga impostos e que está registada”. Embora a medida não tenha o apoio da Associação Nacional de Municípios Portugueses, a APR considera-a “muito importante.” Esta matéria já se encontra em discussão na Assembleia da República, segundo adianta Luís Mendonça.
Para além das medidas governamentais, 2024 trouxe inovações para o mundo da rádio, como o DTS Autostage que é uma plataforma que faz com que a rádio funcione de forma híbrida. Luís Mendonça exemplificou como esta inovação afeta o dia a dia dos consumidores de rádio: “Uma rádio que está a transmitir de Guimarães, através do seu FM, é captada nos veículos. Quando o carro sai de Guimarães e se afasta bastante, o que acontece normalmente é que a rádio deixa de captar, portanto, o FM deixa de ser possível de captar.”
O jornalista explicou que, com esta tecnologia instalada no automóvel, o condutor não tem que fazer nada e vai passar a ouvir através da emissão online. Ou seja, é uma forma de mantê-lo a ouvir a rádio durante mais tempo. O condutor passa a poder ir para qualquer parte do país sem perder a sintonia da rádio que escolheu. “É uma daquelas situações em que a rádio precisa de avançar há uma série de anos e que conseguimos implementar”, refere o presidente.
Esta nova tecnologia está a ser implementada em alguns países. Em Portugal, a Associação de Radiodifusão conseguiu fazer um protocolo com a empresa DTS Autostage, fazendo com que rádios locais estivessem neste momento disponíveis nesta plataforma, que já está instalada numa série de viaturas novas, de algumas marcas.
Financiamento é o grande desafio
A maior adversidade do setor da rádio prende-se com o financiamento. “Precisamos de ser financiados de alguma forma para nos tornarmos mais livres e independentes de outras entidades. É isso que nos tem estado a faltar e o que nos tem estado a restringir muito”, afirmou Luís Mendonça.
A APR luta também pelo reconhecimento dos direitos de autor deste meio de comunicação: “A rádio tem um produto. A emissão radiofónica ao longo do dia, do mês, de todo o ano, essa produção que nós fazemos não está reconhecida na lei. Pretendemos que seja reconhecido que o produto de rádio também tem direitos“, frisou o presidente da associação. O jornalista referiu ainda que, se a rádio tiver direitos, passa a receber parte da lei da cópia privada, que é distribuída por autores e os artistas, atualmente. “Os jornais têm direito, por exemplo, e nós não. Se passarmos a ser incluídos nesse pacote, passamos também a receber o valor por isso”, ilustrou.
Editado por Filipa Silva