No Dia dos Namorados, a UMAR apresentou um estudo sobre violência no namoro, revelando um aumento de nove pontos percentuais na legitimação de comportamentos violentos. O controlo do parceiro destacou-se por ser a conduta com maior crescimento.

Sandra Ribeiro (presidente da CIG), Liliana Rodrigues (presidente da UMAR), Maria José Magalhães (coordenadora do Estudo), Margarida Pacheco e Margarida Maia (investigadoras no estudo) Foto: Inês Saldanha/JPN

O Estudo Nacional sobre Violência no Namoro, realizado em janeiro de 2025, foi divulgado esta sexta-feira (14) pela União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP). Desenvolvido no âmbito do projeto “ARt’Themis+”, o estudo abrangeu 6.732 jovens, com uma média de 15 anos, do 7.º ao 12.º ano.

Segundo a investigadora Margarida Pacheco, os dados apontam para um aumento da legitimação face ao ano passado: “75,3% dos jovens legitimam pelo menos um dos comportamentos estudados“, ou seja, não os consideram suficientemente graves para serem classificados como violência no namoro. Contudo, ressalvou que essa perceção “não significa que [os inquiridos] achem normal aquele comportamento”, mas podem interpretá-lo, por exemplo, “como uma falta de respeito”.

Apesar de a legitimação da violência não ter aumentado “de forma representativa” em relação a 2024, a especialista considera o cenário “muito preocupante”. O estudo identifica 15 comportamentos de violência, agrupados em seis categorias: controlo, perseguição, violência psicológica, violência sexual, violência através das redes sociais e física.

O controlo continua a ser, “como no ano passado, a forma de violência mais legitimada“, com cerca de 63% dos jovens a não o reconhecerem como tal. Margarida Pacheco explica que inclui atitudes como “controlar peças de roupa, amigos, telemóvel e redes sociais”. Seguem-se a perseguição e a violência psicológica, que perto de 35% dos inquiridos não consideram como atos violentos.

A violência física é a menos legitimada (quase 9% não a reconhece), embora Sandra Ribeiro, presidente da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), tenha apontado que esse número pode refletir “uma vergonha de falar do que se passa [a esse] nível”.

A dirigente da CIG considera que a tecnologia, em especial as redes sociais, contribui para a legitimação da violência: “Os jovens acordam e adormecem com o telemóvel e isso influencia a forma como se relacionam do ponto de vista amoroso”. Como exemplo, mencionou a expectativa de partilha de passwords entre namorados e adverte ainda que algumas aplicações são usadas para controlo geográfico dos parceiros.

Os jovens acordam e adormecem com o telemóvel, e isso influencia a forma como se relacionam do ponto de vista amoroso.

Sandra Ribeiro alerta para a influência de bloggers que disseminam mensagens de “misoginia, desigualdade de género e violência”, e reforça a necessidade de combater a culpabilização das vítimas: “Essa narrativa tem de mudar”.

O estudo revela que tanto rapazes como raparigas legitimam mais o controlo e menos a violência física. Os jovens do sexo masculino (quase 45% dos inquiridos) tendem a validar todas as formas de violência em maior percentagem do que as do sexo feminino (perto de 54%). Outras identidades de género menos de 1% também apresentam níveis elevados de legitimação, mas a amostra é reduzida para fazer comparações.

Maria José Magalhães, professora na FPCEUP, relaciona o aumento da legitimação com o crescimento dos discursos de ódio, da normalização da violência e da falta de responsabilização dos agressores. Defende medidas urgentes: “Temos 75,3% dos jovens, três quartos da nossa população juvenil, que não reconhecem estes atos como violência. Isto é muito grave. A primeira recomendação é o Ministério da Educação tomar isto em conta e emitir medidas de política educativa para a prevenção da violência nas escolas, com pessoas especializadas na área da violência e na área da pedagogia“.

No que diz respeito à vitimização, a investigadora Margarida Maia destaca que “66,3% reportou ter experienciado pelo menos um dos indicadores” analisados, sendo o controlo o mais comum. Face a 2024, registou-se ainda um aumento da perseguição e da violência física, enquanto a violência através das redes sociais e sexual diminuíram. A violência psicológica manteve-se inalterável.

A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) assinalou o Dia dos Namorados com a divulgação de um relatório que, em 2023, foram registados 1.023 pedidos de ajuda, sendo que 691 vítimas recorreram à entidade após o fim da relação. A maioria dos agressores são homens, enquanto as vítimas são maioritariamente mulheres entre os 25 e os 34 anos.

Entretanto, a Polícia de Segurança Pública (PSP) lançou a operação nacional “No Namoro Não Há Guerra” na quarta-feira (12), prolongando-a até 21 de fevereiro. A iniciativa visa sensibilizar jovens do 3.º ciclo e do ensino secundário, dos 13 aos 18 anos.

Entre 2019 e 2023, a PSP registou 9.923 denúncias de violência no namoro. Em 2023, foram recebidas 1.363, das quais 916 se referiam a relações em curso e 447 a relacionamentos já terminados. Segundo uma nota de imprensa da PSP, 78% das vítimas identificadas são do sexo feminino. Mais de metade tem entre 25 e 44 anos. Perto de 30% tem idade abaixo dos 25 anos e 17% tem mais de 45. De notar que os dados de 2024 ainda não estão consolidados.

A PSP sublinha que “a violência não é tolerável nem desculpável” e apela: “Não te prendas a uma relação tóxica. Violência não é amor”.

Editado por Filipa Silva