O decreto de desagregação das freguesias, aprovado em janeiro, foi vetado pelo Presidente da República e vai ser devolvido ao Parlamento para nova votação. Anafre e partidos à esquerda deixam críticas a Marcelo Rebelo de Sousa. IL aplaude, Chega compreende a decisão e PSD apela à reflexão e não revela sentido de voto.

Veto presidencial deixa novo mapa autárquico em suspenso. Foto: Rui Ochoa/Presidência da República

Para “surpresa” da Associação Nacional de Freguesias (Anafre), e contra a vontade da maioria dos partidos, o Presidente da República vetou, esta quarta-feira (12), o decreto de desagregação de freguesias, aprovado pelo Parlamento, a 17 de janeiro.

Na nota publicada no site oficial da presidência, Marcelo Rebelo de Sousa aponta a “falta de compreensão ou transparência pública do processo legislativo” e “as contradições, as hesitações e sucessivas posições partidárias” como alguns dos motivos do veto.

Já esta quinta-feira, aos jornalistas, o Presidente da República acrescentou que vetou o decreto “por uma pequena razão: o tempo”.  A aproximação das eleições autárquicas é a principal preocupação sublinhada por Marcelo Rebelo de Sousa. Segundo o chefe de Estado, esta votação deveria ter ocorrido no ano anterior, quando “dava mais tempo para fazer o que é preciso fazer.”

O diploma que agora regressou ao Parlamento contou com o apoio do PSD, PS, BE, Livre e PAN. O único voto contra a desagregação foi da Iniciativa Liberal. Já o Chega optou pela abstenção. O decreto previa a separação de 135 uniões de freguesias, o que iria resultar na reposição de 302 autarquias locais.

Anafre apanhada “de surpresa”

O presidente da Associação Nacional de Freguesias (Anafre) admite ter sido “apanhado de surpresa” pelo veto da desagregação das freguesias. Jorge Veloso afirmou, ao JPN, que a sua “primeira reação é de alguma tristeza pela atitude” de Marcelo Rebelo de Sousa. O presidente da Anafre aponta incoerência ao Presidente da República, que em janeiro deu a entender, na perspetiva da Anafre, que “não iria vetar de qualquer modo estes projetos de lei “. 

Quando questionado sobre o futuro das freguesias, o presidente da Anafre afirma estar convicto de que a Assembleia irá cumprir o seu papel. “Neste momento, a nossa grande questão é se todos os partidos que votaram favoravelmente na Assembleia da República em janeiro, estão em condições de reapresentar o processo e de votarem favoravelmente.”, acrescenta Jorge Veloso ao JPN.

Esquerda critica, PSD sem posição clara

Alfredo Maia, deputado à Assembleia da República, pela CDU, considera que “esta devolução do diploma à Assembleia da República traduz uma atitude de desprezo pela vontade expressa das populações e dos seus órgãos representativos.” Segundo Alfredo Maia, a proximidade das eleições não é um argumento suficientemente válido para vetar a desagregação das freguesias. “Quando se tratou de liquidar mais de um milhar de freguesias impostas pelo governo a pretexto da troika, isso aconteceu a sete meses das eleições de 2013 e não consta que alguém tenha colocado esta questão de proximidade das eleições”, criticou o deputado em declarações ao JPN. 

Tal como a CDU, também o PS já confirmou que vai voltar a votar favoravelmente a legislação. No Parlamento, Marina Gonçalves afirmou aos jornalistas, na manhã de quinta-feira (13),  que, para o Partido Socialista, “é fundamental respeitar a vontade da população” e que a obrigação dos partidos políticos “é agendar o mais depressa possível [a votação d’]o diploma e cumprir o que está na lei desde 2021”.

O Livre e o Bloco de Esquerda também revelaram estar descontentes com a decisão do Presidente da República. Em declarações aos jornalistas, no mesmo dia, a líder parlamentar do Livre, Isabel Mendes Lopes, recorda que “o Presidente da República tinha dito que não iria levantar obstáculos” e afirma que o partido vai reconfirmar o seu voto. Também Mariana Mortágua se prenunciou sobre a separação das freguesias: “o Bloco de Esquerda o que fará é reafirmar o diploma que saiu da Assembleia da República e fazê-lo de forma que possa cumprir os prazos legais para ser aplicado nas eleições autárquicas.”

O Chega decidiu abster-se durante a votação do diploma de desagregação de freguesias. Ao JPN, Rui Afonso admite compreender a decisão do Presidente da República, principalmente, devido aos avanços e recuos de alguns partidos. Sobre a razão da abstenção do Chega, o deputado eleito pelo Porto argumenta que “a desagregação de freguesias iria trazer um maior custo para o Estado” e que “o custo-benefício para as populações não justificaria a sua desagregação.” Além disso, o deputado põe em causa as intenções do PS e do PSD, argumentando que os partidospretendiam estas desagregações unicamente por questões partidárias”.  

A Iniciativa Liberal foi o único partido a votar contra o decreto de separação das freguesias. Por isso, “foi com grande satisfação” que o partido viu a não promulgação do decreto, nas palavras da líder parlamentar, Mariana Leitão, que é também candidata às Eleições Presidenciais de 2026. Na rede social X, Rui Rocha afirmou que “A IL foi o único partido que teve coragem de votar contra a desagregação de freguesias”, assumindo uma “clara oposição ao processo e à criação de centenas de novos cargos políticos e de nomeação”.

Ao contrário dos restantes grupos parlamentares, o PSD ainda não deixou clara a sua posição face ao veto do Presidente da República. Em declarações aos jornalistas na quinta-feira, dia 13, o líder parlamentar Hugo Soares defendeu que “nem o país está com uma urgência nesta decisão, nem isto é uma decisão que careça de uma urgência do pé para a mão”. O representante do PSD afirma que é preciso tempo para discutir matérias sérias e “esta é uma matéria séria”, que “merece reflexão”.

O diploma vetado pelo Presidente da República vai ser devolvido ao Parlamento para nova votação. Caso os votos se repitam, o decreto de desagregação de freguesias será aprovado. Contudo, para que as novas freguesias sejam incluídas nos boletins de voto das próximas eleições autárquicas, estas terão de estar presentes no Mapa do Poder Local seis meses antes da ida dos portugueses às urnas.

Editado por Filipa Silva