O professor abordou, de uma forma “deliberadamente assertiva”, os maiores desafios da comunicação social na atualidade que surgem do modelo de negócio que se sobrepõe ao trabalho individual dos jornalistas.
O professor foi recebido por uma plateia repleta, maioritariamente constituída por alunos do curso de Ciências da Comunicação. Foto: Maria Miguel Marques/JPN
Augusto Santos Silva, professor universitário, ex-presidente da Assembleia da República e militante do PS esteve no anfiteatro nobre da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, na passada sexta-feira, “enquanto sociólogo”, para apresentar de forma “deliberadamente assertiva” a sua perspectiva sobre os maiores desafios da comunicação social hoje. O tema em destaque na conferência foi a “ligação umbilical entre a prática do jornalismo e um regime de natureza democrática”.
Para o socialista, países como os Estados Unidos da América, a Itália e a Hungria são hoje palco de “uma quebra do consenso sobre a ligação entre a democracia e o Estado de Direito”. Augusto Santos Silva explica que essa quebra de consenso se manifesta com um processo de combate aos fundamentos democráticos, não pelo clássico ataque externo, mas sim por uma corrosão interna, que utiliza as instituições e os fundamentos democráticos para esse efeito.
As relações entre os proprietários e os poderes económicos ou políticos preocupam o docente, uma vez que defende que estas são as principais restrições no ambiente organizacional dos órgãos de comunicação social, por reduzirem “muito a liberdade profissional e imperial do jornalismo pessoal”, ou seja, o trabalho individual de cada jornalista.
Augusto Santos Silva aproveitou a intervenção para denunciar “violações sistemáticas e grosseiras da deontologia profissional dos jornalistas” cometidas por órgãos comunicacionais portugueses, como o abuso de fontes anónimas.
O ex-presidente da Assembleia da República argumenta que, se o código de deontologia dos jornalistas portugueses define que as opiniões devem ser sempre atribuídas, jornais como o Expresso não devem exceder-se no volume deste tipo de publicações. Sobre o semanário aponta: “se retirassem das páginas do jornal todas as peças baseadas em opiniões de fontes não identificadas, pelo menos um terço do jornal desapareceria”.
Entre todos os aspetos que preocupam Augusto Santos Silva, são as redes sociais que protagonizam o receio do professor relativo a um “predomínio e uma hegemonia de formas e modelos de comunicação atomizados”. O sociólogo explica que esta concentração é característica das relações que não passam por grupos e por instituições, mas que tendem a fazer-se “diretamente entre indivíduos inseridos em sistemas populados por monopólios”.
Augusto Santos Silva entende que o jornalismo é “o empoderamento das sociedades e que, por isso, tem a capacidade de escrutinar, efetiva e eficazmente, outras instâncias de poder”.
Augusto Santos Silva continua sem esclarecer se irá avançar com uma candidatura à presidência da República. Foto: Maria Miguel Marques/JPN
À margem da conferência, o JPN questionou Augusto Santos Silva sobre a atualidade política do país, mas o docente preferiu não se pronunciar.
Sobre a estratégia comunicacional do governo, o professor afirmou que, “de um ponto de vista puramente técnico”, regressando ao início do mandato de Luís Montenegro, é “muito perturbador o facto de o primeiro-ministro de um Governo num país democrático estar na prática cerca de mês e meio sem responder a questões dos jornalistas e fazer a comunicação pública sem se sujeitar ao contraditório de perguntas dos jornalistas”. O primeiro-ministro “só o fez ao fim de quase dois meses”, reforçou.
Editado por Filipa Silva