Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) promoveu um debate sobre o impacto da abertura de novas escolas de Medicina e o aumento de vagas do curso. Adalberto Campos Fernandes, antigo ministro da Saúde, esteve presente e defende que o problema não é a falta de médicos, mas sim a organização dos recursos.

A criação de novas escolas de Medicina foi tema de debate na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Foto: Bárbara Sequeira Pinto/JPN

“Portugal não tem um problema de falta de médicos”, o problema é a organização dos recursos. A ideia foi defendida pelo antigo ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, num debate na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. O evento reuniu especialistas, esta terça-feira (1), para discutirem os desafios da abertura de novas escolas médicas e do aumento do número de vagas em Medicina.

O acesso aos cursos de Medicina em Portugal atingiu um novo marco em 2024, com 1.661 estudantes admitidos na primeira fase do concurso nacional de acesso ao Ensino Superior público. Este número representa um aumento de 66 colocados em relação ao ano anterior. O Ministério da Educação, Ciência e Inovação anunciou a criação de mais 130 vagas em Medicina através de concursos e regimes especiais de acesso, das quais 86 são especificamente para o concurso especial destinado a estudantes internacionais.

A Universidade Católica Portuguesa recebeu autorização para duplicar as vagas no seu Mestrado Integrado em Medicina. A instituição, que iniciou o curso com 50 vagas, passará a disponibilizar 100 lugares já no ano letivo de 2025/2026. Neste contexto, entre os temas abordados, destacou-se a necessidade de garantir a qualidade da formação dos novos médicos e a capacidade de os reter no Serviço Nacional de Saúde (SNS), num momento em que o setor enfrenta dificuldades na fixação de profissionais.

O antigo ministro socialista realçou que, Portugal, em 2015, tinha “uma despesa de 9 mil milhões” com o setor da Saúde e está a caminhar “para 20 mil milhões“. “Estamos a pôr muitos recursos, mas não estamos a tirar do sistema as respostas que os portugueses queriam”, sublinhou. Adalberto Campos Fernandes salientou que a resolução do desalinhamento entre as necessidades e a resposta do Serviço Nacional de Saúde passa, sobretudo, pela organização e pela eficiência no uso dos recursos e não na “abertura de novas faculdades em cada capital de distrito”.

Ao JPN, o ministro do pós-troika destacou que o Serviço Nacional de Saúde evoluiu nos últimos anos. Apesar de haver “um caminho a fazer”, “hoje em dia as condições são bem melhores do que eram há uns anos atrás”, notou.

O debate também abordou temas como o crescente número de médicos não especialistas, que optam por trabalhar como indiferenciados, a comercialização da profissão, a implementação da dedicação exclusiva e os desafios da carreira académica e do médico-investigador. Sobre este último ponto, Adalberto Campos Fernandes destacou a importância de preservar esta figura, comparando-a a uma “espécie” em risco que precisa de uma “reserva natural protegida” para evitar a sua extinção.

Esteve ainda em cima da mesa a análise do relatório da Comissão Técnica Independente (CTI) sobre as Unidades Locais de Saúde Universitárias. Adalberto Campos Fernandes, que presidiu à CTI, defendeu que, independentemente do governo que vencer as eleições legislativas de 18 de maio, é fundamental reconhecer que a criação dos Centros Clínicos Universitários é uma prioridade urgente e uma necessidade para o país.

No final do debate, Roberto Roncon de Albuquerque, presidente do Conselho Pedagógico da FMUP, resumiu que “ficou bem claro que não há falta de escolas médicas em Portugal” e que “o problema tem a ver com a qualidade de avaliação formativa e do futuro dos mestres em Medicina”.

A opinião de Altamiro da Costa Pereira, diretor da FMUP, alinha-se com a do antigo ministro. Ao JPN, no final do debate, sublinhou que “o facto de haver muitos mais médicos não quer dizer, de maneira nenhuma, que haja muito mais médicos a trabalhar onde fazem falta e isso tem a ver muito mais com a política de incentivos do próprio sistema do que com a quantidade de médicos”.

Altamiro da Costa Pereira acredita que o que pode afetar mais a qualidade do ensino é a relação entre os hospitais do SNS e a capacidade desses hospitais de acolherem bem os estudantes de Medicina. No entanto, realçou que “a FMUP tem muitos protocolos de afiliação, já com mais de 20 hospitais e com muitos centros de saúde”.

Este é o terceiro ano consecutivo em que o Conselho Pedagógico da FMUP faz uma reunião aberta às “forças vivas da Academia”, com professores, médicos e estudantes de Medicina.

Editado por Filipa Silva