Numa noite marcada por resultados históricos, a AD venceu as Eleições Legislativas 2025. O Chega surpreendeu ao igualar o PS em deputados, enquanto a esquerda sofreu perdas significativas. Rescaldo de uma noite eleitoral que resultou num Parlamento tripartido e com uma novidade vinda da Madeira.

A Aliança Democrática (AD) pediu e Portugal votou mesmo no sentido de deixar o “Luís trabalhar”. Os sociais-democratas coligados com os centristas venceram as Eleições Legislativas deste domingo (18), com 32,72% dos votos, embora tenham ficado aquém de uma maioria absoluta.

Contrariando as previsões das últimas sondagens, o Chega (CH) foi um dos grandes vencedores da noite eleitoral, alcançando 22,56% dos votos – um aumento de quase 176 mil votos em relação a 2024 (1.345.575 vs 1.169.836).

O Partido Socialista (PS) sofreu uma derrota expressiva, obtendo apenas 23,38% dos votos, uma quebra acentuada face aos 28% do ano anterior. Com menos cerca de 418 mil votos, os socialistas registaram um dos seus piores resultados, culminando com a demissão do secretário-geral, Pedro Nuno Santos, no final da noite eleitoral.

O Chega e o PS encontram-se, assim, empatados com 58 deputados cada. Apenas os votos dos círculos da Europa e de Fora da Europa, que serão conhecidos nos próximos dias, poderão desfazer este empate e determinar qual será a segunda força política do país.

Seja qual for o caso, as consequências destes números foram claras, para André Ventura, que afirmou ainda cedo na noite eleitoral e repetiu adiante no seu discurso: “acabou o bipartidarismo em Portugal”.

A direita, como um todo,  saiu vitoriosa, conquistando um total de 156 deputados: 86 da AD – a que se juntam três deputados eleitos pelos Açores, onde a PSD e CDS concorreram com o PPM -, 58 do Chega e nove da Iniciativa Liberal (IL).

Em contraste, a esquerda saiu muito penalizada, com destaque para, além do já referido PS, o Bloco de Esquerda (BE), que caiu do quinto para o sétimo lugar e elegeu apenas Mariana Mortágua pelo círculo eleitoral de Lisboa.

Entre os vencedores da noite, o Livre (L) destacou-se à esquerda, tornando-se a quinta força política no Parlamento. À direita, a Iniciativa Liberal (IL) reforçou ligeiramente a sua posição, com cerca de mais 10 mil votos do que em 2024.

O Pessoas-Animais-Natureza (PAN) manteve um assento parlamentar, enquanto a CDU (coligação PCP-PEV) perdeu um deputado.

As eleições de 2025 ficam ainda marcadas pela estreia do Juntos Pelo Povo (JPP) na Assembleia da República, com a eleição de um deputado pelo círculo eleitoral da Madeira.

Analisamos os resultados e outros números, do Porto e do país, destas eleições, que vão mudar a configuração da Assembleia e definir o futuro próximo do país. Em primeiro lugar, este é o novo Parlamento:

AD volta a ganhar, sem maioria, mas relegitimada 

A Aliança Democrática (AD) obteve 1.914.913 votos (32,10%), que resultaram na eleição de 89 deputados – incluindo os 0,62% e três mandatos nos Açores -, mais nove do que nas Eleições Legislativas de 2024 (80).

Apesar de as áreas assinaladas a ‘laranja’ dominarem grande parte do mapa eleitoral, a AD não conseguiu alcançar a maioria absoluta. Além disso, nem o Chega, nem a Iniciativa Liberal (IL) manifestaram disponibilidade para apoiar os sociais-democratas, complicando o cenário de governabilidade.

Mas as ilações retiradas pelo o presidente do Partido Social Democrata (PSD), Luís Montenegro, são claras: o resultado é “a moção de confiança” dos portugueses que o Governo precisava para governar, até porque não se vislumbra dos resultados quaisquer outra solução governativa: “do ponto de vista aritmético (…) apenas sobraria uma possibilidade, uma coligação entre o Partido Socialista e o Chega”, realçando que isso não é um “cenário admissível”.

Luís Montenegro na arruada da AD, no Porto.

A Aliança Democrática (AD) venceu as Eleições Legislativas 2025, mas sem maioria absoluta. Rita Vila Real

Montenegro, que foi o último a falar, já depois da meia-noite, sublinhou ainda que “os portugueses não querem mais eleições antecipadas” e frisou que “a todos [os partidos] competirá dar sequência àquela que foi a expressão democrática dos portugueses”.

Às oposições, caberá igualmente respeitar e cumprir a vontade popular, honrando os seus compromissos e as suas propostas, mas adequando-os às circunstâncias nacionais e coletivas. De uns e outros espera-se sentido de Estado, sentido de responsabilidade, respeito pelas pessoas e, naturalmente, espírito de convivência na diversidade, mas também de convergência e salvaguarda do interesse nacional”, afirmou num palco partilhado com a família mais próxima, a “de sangue e a política”, para usar uma expressão do próprio.

Relativamente ao futuro, o líder da AD apontou que “a Europa está a atravessar um período de incerteza que impõe decisões estratégicas” e prometeu apostar no investimento, na juventude e em áreas como a saúde, a educação, a habitação, a mobilidade e a corrupção.

“E não falharemos aos nossos reformados e pensionistas, aqueles que tiveram uma vida de trabalho. Vamos dar corpo à esperança de um país que confiou neste projeto e que é um país com muito futuro”, acrescentou.

Com apontamentos à esquerda e à direita, falou da valorização dos funcionários públicos, do Estado Social, mas também prometeu “mais regulação da imigração e mais reforço da segurança”. O discurso fechou com uma evocação do Papa Francisco, frase que marcou as Jornadas Mundiais da Juventude que Lisboa recebeu no ano passado: “vamos ser, como sempre fomos, o governo para todos, todos, todos”.

Horas antes, o presidente do CDS-PP, Nuno Melo, parceiro da coligação vencedora da noite, afirmou que “se fez justiça à AD” com os resultados obtidos, acrescentando que espera que estas eleições sirvam “de lição ao Partido Socialista”.

“Fica ainda demonstrado que a crise política que foi criada pelas oposições era, de facto, totalmente desnecessária. E, na verdade, o Partido Socialista que lhe deu causa foi, por isso, fortemente penalizado, sofrendo uma pesada derrota”, disse.

PS sofre pesada derrota e Pedro Nuno Santos demite-se

Os socialistas sofreram uma derrota histórica, obtendo 23,38% dos votos, uma descida face aos 28% das eleições anteriores.

Em contraste com as Legislaturas de 2024, o PS apenas venceu no distrito de Évora, uma discrepância evidente face aos oito distritos conquistados anteriormente – Beja, Castelo Branco, Coimbra, Lisboa, Portalegre, Santarém e Setúbal deixaram de ter os socialistas como força mais votada. Quatro passaram para a AD e três para o Chega. 

Com menos 417.978 votos do que em 2024 (1.394.491 contra 1.812.469), o PS elegeu 58 deputados, ficando assim empatado com o Chega.

Pedro Nuno Santos apresentou demissão após serem conhecidos os resultados. Nádia Neto

Tendo em conta que o resultado dos círculos da emigração, ainda por apurar, que vão distribuir mais quatro assentos, o que pode colocar em causa a posição do PS como segunda força política no Parlamento, o líder do partido, Pedro Nuno Santos, apresentou a sua demissão durante o discurso após os resultados.

“Assumo as minhas responsabilidades como líder do partido, como sempre fiz no passado, sempre que achei que deveria assumir responsabilidades. Vou por isso pedir eleições internas à Comissão Nacional para o próximo sábado, às quais não serei candidato”, anunciou.

E acrescentou: “Mas, como disse Mário Soares, só é vencido quem desiste de lutar e eu não desistirei de lutar”, que completou com um enigmático “até breve”.

Em declarações aos jornalistas, o secretário-geral socialista reiterou “que os partidos que provocaram a instabilidade foram premiados”, sublinhando que a “AD atirou o país para eleições” e que “o Chega nunca contribuiu para a estabilidade política em Portugal”. Em qualquer caso, concluiu, não quer ser “um estorvo” para o seu partido, na hora de decidir o que deve fazer ao nível da governabilidade, mas deixou expressa a sua opinião: o PS não deve “ser suporte” do governo da AD.

Chega empata com PS e declara fim do bipartidarismo

O Chega foi um dos grandes vencedores da noite, alcançando um resultado histórico. O partido de André Ventura somou 1.345.575 votos (22,56%), conquistando o mesmo número de mandatos que o PS, com 58 deputados.

Ao contrário do ano anterior, em que venceu apenas no distrito de Faro, nestas eleições o Chega conquistou também os distritos de Beja, Setúbal e Portalegre.

Para além destas vitórias, o partido elegeu deputados em Aveiro, Braga, Castelo Branco, Coimbra, Évora, Guarda, Leiria, Lisboa, Porto, Santarém, Viana do Castelo, Vila Real, Viseu, Madeira e Açores. Isto é, só em Bragança o Chega não elegeu.

Desde 2022, quando ascendeu a terceira força política, o Chega consolidou a sua posição nas Legislativas de 2024, com 50 mandatos. Recorde-se que em 2019, há apenas seis anos, o Chega elegeu apenas um deputado. Um crescimento sem precedentes na história da democracia portuguesa, como Ventura fez questão de lembrar no mais longo discurso da noite eleitoral.

“Que grande noite tivemos”, começou por dizer o líder do Chega no início do mais longo discurso da noite. Ventura reafirmou o que já tinha dito à chegada ao local onde o partido acompanhou a noite eleitoral: “podemos afirmar com segurança que acabou o bipartidarismo” em Portugal.

“Com o apuramento que falta do círculo da emigração na Europa e fora da Europa, eu acho que podemos assegurar ao país algo que não acontecia desde 25 de abril de 1974. O Chega tornou-se nestas eleições o segundo maior partido”, afirmou.

Não foi a vitória que o líder do Chega ambicionou, mas a ambição continua lá: “Ainda não vencemos”, disse, prometendo contudo que “nada ficará como dantes em Portugal”.

Liberais mantêm quarto lugar e recusam Governo com AD

A Iniciativa Liberal (IL) reafirma-se como quarta força política, com 330.149 votos (5,53%), mais 18.085 do que os 312.064 votos (5,08%) das eleições do ano passado.

Os liberais elegeram nove deputados por cinco distritos (quatro em Lisboa, dois no Porto, um em Aveiro, um em Braga e um em Setúbal).

O líder do partido, Rui Rocha, afirmou que a IL é a “garantia de uma solução para o país” e, embora tenha dito que está disponível para futuras “conversas e todos os contactos”, admitiu que não será possível constituir um governo de maioria absoluta com a AD.

“Mas olhando para os resultados, o que vemos é que as maiorias possíveis estão constituídas. Portanto, o nosso papel é continuar a defender as nossas ideias”, frisou. Dito de outra forma, o líder dos liberais prometeu que o partido se vai manter fiel a si próprio, mesmo que isso signifique que o caminho a trilhar se faça “mais devagar”.

Livre é um dos grandes vencedores da noite eleitoral

O Livre (L) passou de sétimo para o quinto lugar com 250.651 votos (4,20%) mais de 50 mil votos face aos 199.888 votos (3,26%) de 2024.

Com um resultado inédito, o partido conquistou seis mandatos, dos quais três por Lisboa, dois pelo Porto e um, por Setúbal. Foi a única força da esquerda com motivos para sorrir nesta noite eleitoral.

Livre alcança resultado inédito, tornando-se na quinta força política. Foto: Leonor Araújo/JPN

O líder do Livre, Rui Tavares, discursou ao país, deixando uma mensagem aos eleitores do Livre: “Vocês nunca sentirão senão orgulho por terem elegido este grupo parlamentar e nunca se arrependerão do vosso voto”.

E deixou uma promessa, a que chamou de missão para todos em casa: “Nós vamos dinamizar um grande movimento democrático e progressista no nosso país, porque este é o início da reviravolta, porque nós vamos a todos os cantos deste país, falar com toda a gente”, garantiu.

A queda livre do BE

O Bloco de Esquerda (BE) sofreu a maior derrota na banca parlamentar de esquerda, descendo de quinta para sétima força política, tendo sido ultrapassado pela CDU e pelo Livre.

Face às eleições de 2024, o partido contou com 119.211 votos (2%), tendo apenas conseguido um mandato, o de Mariana Mortágua, pelo círculo eleitoral de Lisboa. Recorde-se que, em 2019, o Bloco tinha eleito 19 deputados.

Mariana Mortágua assume “uma grande derrota” para o partido. Foto: Camila Teixeira/JPN

No discurso pós-resultados, a coordenadora do BE afirmou que “os tempos são difíceis”, assumindo “uma grande derrota” para o partido.

“Temos muito trabalho pela frente para construir a esquerda e alargá-la e para enfrentar a extrema-direita”, afirmou Mariana Mortágua.

CDU mantém-se na sexta posição, mas elege menos um deputado

Face a 2024, a CDU (coligação do PCP com o PEV) elegeu menos um deputado, tendo apenas conquistado três assentos parlamentares: Paulo Raimundo, por Lisboa, Alfredo Maia, pelo Porto, e Paula Santos, por Setúbal.

Ainda assim, a bancada dos comunistas manteve a sexta posição, com 180.943 votos (3,03%). Estes são os piores resultados de sempre para o partido, que tinha já atingido mínimos históricos nas eleições de 2024 (202.325 votos, 3,30%).

O secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, afirmou que “face aos resultados eleitorais, este não é o tempo de conformação ou de entendimento com a direita e as suas conceções reacionárias, retrógradas e antidemocráticas”.

Este não é o tempo para dar a mão à direita e dar suporte à sua política antipopular”, reiterou.

PAN mantém representação parlamentar com um deputado

No caso do Pessoas Animais Natureza (PAN), o partido assegura a oitava posição, com 80.850 votos (1,36%).

Embora tenha registado uma descida de 37.729 votos face aos 118.579 votos (1,93%) de 2024 e tenha falhado o objetivo de formar um grupo parlamentar, o partido conseguiu manter-se no Parlamento, com a eleição da líder, Inês de Sousa Real, por Lisboa.

No discurso de reação aos resultados, a porta-voz do PAN lamentou o resultado obtido, mas agradeceu “o voto de confiança de quem garantiu que a causa animal, os direitos das mulheres e a causa ambiental continua sentada no Parlamento”.

“Perante esta ameaça concreta que temos, de vermos a extrema-direita a querer recuar na proteção dos direitos dos animais e a apoiar uma agenda xenófoba de discriminação, de não inclusão, o PAN estará no Parlamento a lutar para que as nossas causas não fiquem para trás”, apontou.

JPP estreia-se no parlamento nacional

O JPP (Juntos Pelo Povo) estreia-se na Assembleia da República, concretizando o objetivo de “eleger pela primeira vez um representante, ou mais do que um”, conforme anunciado pelo secretário-geral do partido, Élvio Sousa.

O cabeça de lista pelo círculo eleitoral da Madeira, Filipe Sousa, foi o deputado eleito. É também um dos fundadores do partido, que nasceu de um movimento de cidadãos no concelho de Santa Cruz.

Inspirado no seu slogan de campanha, o JPP assume o compromisso de dar voz às ilhas, colocando em destaque a autonomia regional e os direitos das populações insulares.

Filipe Sousa, irmão de Élvio Sousa, foi dirigente do partido, em 2015, e presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz desde 2013, tendo renunciado ao cargo a 7 de abril para se candidatar às Legislativas de 2025.

Participação eleitoral atinge melhor registo desde 2005

No ano em que se assinalam os 50 anos das primeiras eleições livres em Portugal, a participação eleitoral voltou a crescer face aos anos anteriores. Embora os resultados ainda não estejam totalmente fechados – faltando apurar os votos dos círculos da Europa e de Fora da Europa, que só serão conhecidos dentro de alguns dias –, já é possível analisar os dados relativos aos eleitores residentes em Portugal.

A abstenção fixou-se nos 35,6%, abaixo dos 40,2% registados em 2024, o que corresponde a 5.965.322 cidadãos que exerceram o seu direito de voto.

Este valor é igual ao registado em 2005, em que a taxa de abstenção foi de 35,6%.

Confirma-se assim a tendência de recuperação após o pico de abstenção em 2019 (51,4%), o que pode traduzir uma reaproximação dos eleitores ao processo democrático.

Pode ver os resultados da abstenção de todas as eleições desde 1975 neste gráfico:

 

Mudanças nos resultados do Porto

O distrito do Porto refletiu, em geral, a tendência nacional, ainda que com algumas variações.

A AD elegeu 15 deputados, mais um do que em 2024, vencendo o distrito com 34% dos votos – uma subida expressiva face aos 30% registados no ano anterior.

O PS registou uma quebra, passando de 30% para 24%, o que se traduziu na perda de dois mandatos, elegendo agora 11 deputados.

Por sua vez, o Chega, enquanto terceira força política, elegeu nove deputados, mais dois do que em 2024, e com mais cinco pontos percentuais. Terminou com 20,67%.

Já a IL manteve os dois deputados que já tinha, mas reforçou a sua votação, subindo de 5,75% para 6,10%.

O Livre foi um dos grandes vencedores da noite, conseguindo eleger mais um deputado do que em 2024, totalizando agora dois, com 4% dos votos.

A CDU manteve o seu único deputado, com uma ligeira descida na votação: 2,28% face aos 2,36% de 2024.

No caso do BE, sendo o partido mais penalizado, perdeu os dois deputados que havia eleito no último ato eleitoral. A antiga eurodeputada, candidata à Presidência da República e cabeça de lista pelo Porto, Marisa Matias, fica assim de fora do Parlamento.

Com Filipa Silva