Durante os dias 30, 31 e 1, vão decorrer ações de sensibilização em cinco pontos do país para "chamar a atenção para o massacre de milhares de crianças palestinianas na ofensiva israelita". Julieta Almeida, porta-voz de uma das organizações envolvidas, admite que a continuidade da ofensiva israelita pode definir "o nosso futuro e o futuro dos nossos filhos".
Ação de sensibilização para a paz, por iniciativa do “Parents for Peace”. Foto: Parents for Peace Portugal
Um movimento de cidadãos, em conjunto com o Parents for Peace e o Coletivo pela Libertação da Palestina, vai concentrar-se em várias cidades do país para sensibilizar a população para “o massacre de milhares de crianças palestinianas na ofensiva israelita” e para a importância da “defesa do fim do genocídio na Faixa de Gaza”.
As organizações envolvidas nas ações de sensibilização destacam vários dados relativos à morte de crianças em Gaza desde 7 de outubro de 2023, data de início do conflito. Sublinham que esse número poderá ser superior, mas os dados oficiais falam entre 15.613 e 18.600 crianças que perderam a vida. Além das mortes, os ativistas realçam o número de crianças órfãs, que já deverá ultrapassar as 40 mil e também as que precisam de “apoio psicológico para lidar com problemas graves de depressão, ansiedade e pensamentos suicidas”, lê-se na nota enviada às redações.
O movimento “Todas as Crianças Importam: Ações pelo fim do Genocídio em Gaza” vai juntar vários ativistas em Lisboa, no Porto, em Coimbra, em Setúbal e na Ericeira.
Na capital, a ação realiza-se esta sexta-feira (30), das 17h00 às 20h00. Ao longo da Rua do Carmo, uma rua movimentada na Baixa de Lisboa, vão estar expostas várias peças de roupa infantil e cartazes alusivos à morte de crianças na Faixa de Gaza. Este “movimento espontâneo e transversal”, como lhe chama a porta-voz do Parents for Peace, Julieta Almeida, pretende sensibilizar através da informação para divulgar “o que está a acontecer, mas também o que podemos fazer”. Neste sentido, durante todas as ações, serão distribuídos folhetos informativos e de apelo ao boicote de produtos israelitas como forma de pressão ao Governo de Telavive.
Em Coimbra, no mesmo dia (30) e à mesma hora (17h00), vai realizar-se uma ação nos mesmos moldes da de Lisboa, na Rua Visconde de Luz.
Para sábado (31), está marcada uma ação na Ericeira entre as 11h00 e as 15h00. O local escolhido foi a Praia do Sul para evocar o espírito e ambiente da Faixa de Gaza. A ação será semelhante à de Lisboa e Coimbra, com as roupas de criança e os folhetos informativos.
No dia 1 de junho, Dia Mundial da Criança, Porto e Setúbal também recebem estas manifestações.
No Porto, há dois momentos diferentes, um de manhã e outro de tarde. Entre as 10h00 e as 13h00 será formado um cordão de pessoas a segurarem bonecos amortalhados, representando a morte de mais de 16.000 crianças, em Gaza, na Avenida Marechal Gomes da Costa, junto à Fundação de Serralves – onde são esperados milhares de pessoas este fim de semana por causa do Serralves em Festa. A partir das 15h00 e até as 18h00, os ativistas deslocam-se para a Avenida do Brasil, na Foz, com a exposição de peças de roupa de criança, ao longo da marginal.
Os promotores destas ações realçam a natureza pacifista dos protestos, encorajando as famílias a levarem as suas crianças e vincarem os valores da empatia e da dignidade humana. As roupas e os bonecos utilizados nas ações serão doados a organizações sem fins lucrativos, dedicadas a crianças e mães migrantes.
Alertas da UNICEF
Estas ações em prol das crianças de Gaza surgem numa altura em que a UNICEF, na pessoa do diretor regional do Fundo das Nações Unidas para a Infância para o Médio Oriente e Norte de África, Edouard Beigbeder, admitiu a possibilidade de “mais de 50 mil crianças terem sido mortas ou feridas desde outubro de 2023”.
Beigbeder recordou um momento marcante da última semana, referindo-se à morte de nove filhos de uma médica palestiniana, num bombardeamento que visou a casa da pediatra, para relatar os “ataques atrozes” de Israel. “Na sexta-feira, vimos vídeos dos corpos queimados e desmembrados dos filhos da família Al Najar enquanto eram retirados dos escombros da sua casa em Khan Yunis. De dez irmãos com menos de 12 anos, apenas um sobreviveu, sofrendo ferimentos graves”.
O diretor regional da UNICEF denunciou ainda “as graves violações contra crianças, o bloqueio da ajuda humanitária, a fome, a constante deslocação forçada, bem como a destruição de hospitais, sistemas de água, escolas e lares”, situações observadas no enclave palestiniano. Fez também um novo apelo ao fim do conflito, depois de tantos meses de um “massacre implacável”. “A UNICEF exorta mais uma vez todas as partes em conflito a acabar com a violência, a proteger os civis, incluindo as crianças, a respeitar o direito internacional humanitário, a permitir a entrega imediata de ajuda humanitária e a libertar todos os reféns”.
Posicionamento do “Parents for Peace”
A organização Parents for Peace junta pais, mães e cuidadores preocupados com a paz e com o futuro dos filhos passar por um mundo mais pacífico. Julieta Almeida é a porta-voz do movimento em Coimbra e Lisboa. Em entrevista ao JPN, confessa que a organização tem este objetivo muito concreto, mas que “de momento, as energias estão concentradas num local: Gaza”. A porta-voz argumenta que a guerra Israel-Hamas é “um acontecimento que nos põe à prova enquanto sociedade” e que pode definir “o que será o nosso futuro e o futuro dos nossos filhos”.
Sobre os dados recentemente divulgados pela UNICEF, Julieta Almeida admite que “o número choca sempre, mas não surpreende de todo”. Revela até a perceção da organização, e de grande parte das organizações ligadas à Palestina, de que os números são sempre “estimados por baixo”. Julieta lembra também o elevado número de desaparecidos, órfãos e crianças que estão “traumatizadas para toda a vida”.
Em relação às propostas da Parents for Peace para combater o flagelo que afeta Gaza, a porta-voz sublinha a insistência numa petição que pede ao Estado português para aderir ao protocolo da União Europeia que prevê o acolhimento de pessoas a necessitar de assistência médica especializada. Afirma não compreender o motivo pelo qual Portugal não recebe estes palestinianos, apesar de reconhecer a dificuldade para que Israel autorize a sua saída.
No que diz respeito à nova gestão na distribuição de ajuda humanitária, que passou há dias a ser feita por uma organização privada norte-americana por decisão do estado de Israel, Julieta Almeida é absolutamente crítica daquilo que apelida de “manobras de distração”. “Este bloqueio é inaceitável e não é só inaceitável moralmente, é inaceitável legalmente. Israel só tem de cumprir a lei e parar imediatamente o bloqueio. A ajuda tem de entrar livremente e o povo palestiniano, assim que tiver condições para isso, é que tem de decidir como.”
A censura à ofensiva de Israel em Gaza é comum a todos os membros do “Parents for Peace”, até porque, segundo a organização, o “genocídio está a obrigar a Europa a desrespeitar as instituições que foram construídas para preservar a paz”. Julieta Almeida argumenta que ao “desrespeitar as resoluções do Tribunal Internacional de Justiça e as resoluções da ONU, estamos [o mundo] a minar por dentro o sistema que construímos para vivermos em paz e a desrespeitar o direito internacional”.
Segundo o Gabinete das Nações Unidas para Coordenação dos Assuntos Humanitários (OCHA), há nove mil camiões com alimentos vitais prontos para entrar em Gaza. Mais de metade contém produtos que poderiam dar resposta às necessidades de dois milhões de pessoas durante meses. As propostas de cessar-fogo têm sido constantemente rejeitadas, quer por Israel, quer pelo Hamas. Nesta altura, estima-se que o grupo extremista que atacou Israel a 23 de outubro de 2023 ainda tenha nove reféns vivos e outros tantos cadáveres.