A Manifestação Nacional dos estudantes universitários de 4 de Novembro foi organizada pela Faculdade de Ciências de Lisboa.
O Jornalismo Porto Net entrevistou um dos 7 dirigentes da Direcção da Associação de Estudantes da Faculdade de Ciências de Lisboa (A.E.F.C.L.), Nuno Duarte.

Que balanço faz da Manifestação dos estudantes universitários em Lisboa?
Um balanço claramente positivo, pois apesar de ter ficado aquém da Manifestação de 5 de Novembro do ano anterior, quase todas as Academias de país ficaram representadas.
Apenas boicotaram o IST (Instituto Superior Técnico) e as Academias do Ensino Particular e Cooperativo.

Considera que a adesão a esta iniciativa ficou aquém das expectativas, comparativamente aos valores de adesão mais altos das manifestações de anos anteriores?
Não, essa análise é superficial, pois manifestações com mais de 7 mil alunos(durante a última década só foram cerca de uma dezena), já é bom. É claro que se conseguíssemos o valor de 15 mil era magnífico, mas sabíamos, à partida, que era impossível, devido a inúmeros factores.

Acha que a “acção social não existe em Portugal”?
A “acção social” que existe em Portugal é deficitária e pouco abrangente, com inúmeras deficiências, deixando, por vezes, de fora alunos que, à partida, seriam bolseiros.

Considera que as condições da Universidade de Lisboa justificam as propinas que tem?
Não, nem na Universidade de Lisboa, nem em nenhuma Universidade do país.

Acha que as manifestações são a melhor maneira de protestar?
A manifestação é das poucas acções de massa que tem maior impacto, mas não é a única.

Para os presidentes das associações privadas, a prioridade é esclarecer a sociedade sobre os problemas do Ensino Superior e que isso não se faz com acções radicais, como as manifestações. O que tem a dizer sobre isto?
Primeiro, não considero, de maneira nenhuma Manifestações Nacionais como sendo um qualquer tipo de “acção radical”.
Se calhar, esse senhor nunca participou em nenhuma. Mas gostaria de saber o que é que esse senhor, o presidente da FNAESPC, considera como “acção de gabinete”, contrapondo às manifestações nacionais.

Quais são os próximos passos?
Tentar a revogação da Lei de Financiamento do Ensino Superior, partindo para acções de massa, como greves gerais, encerramento de Faculdades, manifestações locais e nacionais.

Que comentário lhe merece a marcação do ENDA para o mesmo dia?
Uma completa palhaçada. Só mostra o descrédito a que esses senhores chegaram.

O que é que está mal no Movimento Associativo? Como explica a falta de unidade entre o Ensino Superior Público e Privado que foi visível no dia 4 de Novembro?
Não escondo que poderão existir associações de estudantes manipuladas politicamente, principalmente no ensino particular e cooperativo, e isso é provocar desunião entre os alunos do particular e do público.

O presidente da Federação Nacional das Associações de Ensino Superior Particular e Cooperativo (FNAESPC), José Alberto Rodrigues, disse que “há associações manipuladas por partidos de esquerda”. Encara esta afirmação como um ataque à própria Universidade de Lisboa?
O senhor José Alberto Rodrigues é um activo militante do PSD, portanto ele que tente ser coerente.
Quanto à afirmação de ataque à maior instituição universitária portuguesa, acho absurda e ridícula.

Considera que o Ensino Superior está cada vez mais à mercê da política?
Não, é dos serviços mais independentes que a nossa República tem desde a Primavera de Abril.

A nova lei da autonomia propõe a existência de um director em vez de um conselho directivo e deixa ao critério de cada instituição a participação ou não dos alunos nos órgãos de gestão. Estamos perante um panorama de Ensino Superior à mercê do Governo?
Sim, claramente existirá nomeações governativas e deficiências democráticas nas instituições portuguesas.

O que pensa do actual Orçamento?
Péssimo, muito péssimo. Sairá daqui, se for aprovado, o futuro funeral do Ensino Superior Público Português.

Como vê a criação de um espaço europeu de Ensino Superior até 2010?
A ideia é positiva, os meios para conseguir poderão não ser os melhores, como é o caso do Processo de Bolonha.

Para si, a educação é um direito ou um dever?
É um direito dos cidadãos e um dever, um desígnio, da República.

Com a implementação do processo de Bolonha, a educação será um dever? E será um fim que justifica os meios?
Sim, o processo de Bolonha poderá fazer com que os Governos pensem o Ensino Superior como um dever. Claro que os fins não justificam os meios.

Já se notam diferenças, na Universidade de Lisboa, por causa da implementação das medidas do processo de Bolonha?
Sim, na conversão dos ECTS, as unidades de créditos, de um modo cego, entre os cursos que existem na Universidade de Lisboa e outras Universidades Europeias.

Na sua opinião, que consequências reais (a curto e longo prazo) terá este processo de Bolonha?
O financiamento de Ensino Superior Público cairá no futuro por recair na totalidade das famílias. Esta é a consequência a longo prazo.
A curto prazo é a desresponsabilização total do Governo pelo Ensino Superior Público.

Concorda com a existência de um ciclo que dure 3 a 4 anos, e de outro ciclo com duração mínima de 1 ano?
O ciclo de 3 a 4 anos corresponde à actual licenciatura e o ciclo de 1 a 2 anos corresponderá ao actual mestrado. No imediato, poderia pensar-se que seria uma boa solução, mas repare que para o mercado de trabalho uma empresa prefere, como seria de esperar, um engenheiro, ou outro licenciado qualquer, cuja licenciatura tenha 5 anos curriculares e não 3; então esse aluno para poder concorrer em pé de igualdade terá que tirar uma pós-licenciatura, com mais 2 anos, mas esses 2 anos custarão muito mais, pois aí terá de pagar propina de mestrado, que é cerca de 5 vezes a propina anual da licenciatura, ou seja, é uma medida discriminatória do ponto de vista económico.

A redução dos anos de um curso é sinónimo da redução da qualidade de ensino?
Será uma redução dos planos curriculares, logo será uma redução da qualidade.

Está planeada alguma manifestação contra o processo de Bolonha?
Antes de qualquer preparação de qualquer acção de contestação, será necessário clarificar e esclarecer todos os pontos que fazem do Processo de Bolonha tão polémico. É isso no imediato que as Associações e Academias de Estudantes terão de fazer, como já vem acontecendo na Associação da qual sou dirigente, com várias sessões de esclarecimento.

Ana Sofia Coelho