Os estudantes da Faculdade de Arquitetura do Porto participam em oficinas para estudar o problema da habitação na cidade do Porto, sobretudo na Estrada N12. O JPN acompanhou uma das oficinas e falou com alunos e professores para perceber os objetivos e como funciona a unidade de formação contínua, desenvolvida no âmbito da iniciativa.

As oficinas ocorrem de 8 a 25 de abril. Foto: Margarida Rodrigues

Qual é o problema da habitação na Circunvalação? O que se podia mudar? Estas são algumas das perguntas, às quais um grupo de estudantes da Universidade do Porto vão tentar responder nas oficinas sobre a Estrada N12, desenvolvida no âmbito da iniciativa da Faculdade de Arquitetura (FAUP) “Mais do que Casas“.

Flávio Ribeiro, aluno do segundo ano, é um dos participantes. Inscreveu-se na iniciativa devido ao “problema da habitação” que existe, “especificamente na cidade do Porto”: “Como estudantes e habitantes da cidade, sentimos”. Tatiana Mota está a finalizar o curso de Arquitetura e inscreveu-se na unidade de formação contínua pelo interesse de trazer “o problema da habitação para a faculdade”. O grupo de trabalho da jovem revela que a sua prioridade é “dar voz a quem vive na Circunvalação“.

O objetivo da iniciativa “Mais do que Casas”, que está associada aos 50 anos do 25 de Abril, é colocar os docentes e estudantes das escolas de Arquitetura, Arquitetura Paisagista e de Belas Artes do país a pensar em soluções para os desafios da habitação. Para que os alunos pudessem contribuir, a FAUP suspendeu as aulas habituais durante três semanas e criou uma Unidade de Formação Contínua: “Mais do que Casas: Liberdade, Pluralidade, Prospetiva”, que se realiza entre 8 e 25 de abril.

Ao JPN, o coordenador do projeto, Luís Soares Carneiro, disse que o tema das oficinas é a estrada da Circunvalação, “erigida no final do século XIX como uma muralha da cidade para controlar impostos” que “cortou o território em dois”.

Ao todo, são mais de 400 os alunos inscritos, que se repartem em 24 grupos de trabalho. Os grupos, compostos por, aproximadamente, 12 alunos e dois professores voluntários, deverão discutir e refletir sobre os problemas das pessoas que vivem na Circunvalação.

Oficinas vão trazer “um novo dinamismo” à FAUP

Inês Moura, que frequenta o terceiro ano de Arquitetura, garante que o que lhe despertou interesse no projeto foi a possibilidade de “sair da caixa”, ao invés de estar “presa àquilo que os professores” impõe.

A oportunidade de trabalhar com alunos de diversos anos é apontado, pelos universitários, como um ponto positivo da participação na iniciativa. Ao JPN, Inês Moura referiu que este é o momento para se ouvir “a opinião dos mais novos, a opinião dos mais velhos e conciliar”. Até agora, “o espírito de equipa está a ser muito bom”, acrescentou.

Camila Batista não esperava estar, já no primeiro ano, a fazer um trabalho de grupo que lhe permitisse “não estar tão dependente dos professores”. Tatiana Mota refere que a colaboração é essencial e “muito bonita”, relembrando que “há coisas que no primeiro ano estão muito presentes, no quinto já nem tanto”.

Como professora auxiliar da faculdade, Maria José Casanova tem a função de fazer “uma espécie de tutoria das ideias” dos estudantes. “São alunos de vários anos, uns com mais experiência e outros com menos, e de qualquer forma é sempre preciso dizer que se calhar o caminho pode não ser” o que os estudantes escolheram, acrescentou. Ao JPN, disse que, apesar de no primeiro dia ter sentido que estavam “todos um bocadinho sem rumo e surpreendidos pelo local de trabalho e pela dimensão do local de trabalho”, o projeto está a correr bem e os alunos “funcionam como grupo”.

Para além do resultado técnico, o professor universitário Luís Soares Carneiro destacou as dinâmicas internas nos grupos de trabalho, que “de repente não ficam separados por anos”. O coordenador do projeto acredita que as oficinas vão trazer “um novo dinamismo” à FAUP.

Iniciativa é inspirada no programa Serviço de Apoio Ambulatório Local

Os estudantes de Arquitetura recordam o Serviço de Apoio Ambulatório Local (SAAL), o programa estatal de construção habitacional que surgiu com o objetivo de colmatar as necessidades habitacionais de populações desfavorecidas em Portugal, depois do 25 de Abril. O projeto, que serviu de inspiração à iniciativa “Mais do que Casas”, contou, na altura, com a participação de vários arquitetos, como Álvaro Siza Vieira. O professor recorda ainda o período do SAAL, no qual “houve muita coisa que foi feita e toda a Europa estava a olhar” para o projeto.

A iniciativa “Mais do que Casas” pretende desenvolver soluções para os próximos 50 anos.

Para Camila, o SAAL deu “oportunidades importantes à população” tendo “muito que ensinar nas condições da habitação”. Para a aluna do quinto ano, a iniciativa atual, apesar de não ter a mesma “abrangência que teve e não ter o [mesmo] impacto construtivo” que o SAAL, vai ser importante “a nível teórico e a nível de ideias”. “Há 50 anos foi o que aconteceu também. Uma faculdade que, na altura era em Belas Artes, se uniu para resolver o problema da habitação dentro das possibilidades que tinham, o SAAL. Se há 50 anos foi tão marcante, também será agora”, concluiu.

Os alunos disseram ainda que a comunidade da FAUP está interessada em fazer parte da solução das problemáticas da cidade. Para Inês Moura, “depois do que aconteceu nas últimas eleições, as pessoas estão a mobilizar-se mais e a dar mais valor aos valores de Abril”.

No final das reflexões dos grupos de trabalhos, vão existir apresentações de 22 a 24 de abril com ex-alunos da FAUP que estão hoje no estrangeiro para debater as conclusões apresentadas pelos 400 alunos. Luís Soares Carneiro afirma que se devia “aproveitar o potencial” dos milhares de estudantes espalhados pelo mundo e que se licenciaram em Arquitetura no Porto.

No final, as instituições, que estão a participar neste projeto, deverão apresentar alguns dos resultados mais significativos que cada uma produziu numa Exposição Geral, que se vai realizar em Lisboa.

Em paralelo com a Unidade de Formação Contínua, estão previstos um conjunto de eventos, como conferências, debates e apresentações, para ajudar os alunos a refletir sobre os problemas da habitação no Porto, sobretudo na Circunvalação.

A iniciativa “Mais do que Casas” teve início em abril de 2023 e prolonga-se até 2025.

Editado por Inês Pinto Pereira