Esperava-se mais do cantor irlandês, é preciso dizê-lo. Mas ninguém o obriga a levar mais do que um piano, um contrabaixo e uma guitarra acústica para os seus concertos. Perry Blake apresentou-se em Famalicão de vestuário clássico, quase sempre sentado numa cadeira, de pernas cruzadas. Tentou iniciar alguns diálogos com o público, através de piadas sobre a diferença de tamanhos dos copos de whiskey na Irlanda e em Portugal, mas o lado de “entertainer” não é certamente o seu forte. Perry Blake é um poeta, como provou com a publicação de um livro, “These pretty love songs”, que também veio promover a Portugal.

O autor de “The hunchback of San Francisco” goza de uma forte popularidade em Portugal, como provou o facto de ter conseguido encher o grande auditório da Casa das Artes de Famalicão, com capacidade para 500 lugares. E algumas dessas pessoas aplaudiram-no de pé, no fim. Diga-se que o espectáculo começou muito bem, com a excelente amostra do novo álbum, “The crying room”, que é “Forgiveness”. E a tão esperada apresentação de novas canções quase ficou por aí. De facto, o concerto acabou por percorrer quase de igual modo toda a carreira do músico, num registo clássico, simplista, por vezes monótono de um artista que não costuma variar muito dentro da música de qualidade, mas que ontem definitivamente não estava para complicar.

As canções de “California”, o álbum de Blake que mais pisca o olho a Burt Bacharach, acabaram por perder grande parte do seu brilho no simplismo exagerado da noite de ontem.

A meio do espectáculo, num interlúdio que serviu para Perry Blake descansar a voz, os músicos interpretaram “Forbidden colours”, de Sakamoto e David Sylvian. E o espectáculo continuou da mesma forma, no mesmo tom, com a voz chorosa de desabafo que o cantor irlandês ia molhando no whiskey. “Algumas pessoas gostam de rock, outras gostam de canções bonitas de amor”. Com esta frase, Blake justificou as suas opções e rematou para “Pretty love songs”, uma das suas melhores melodias. Já no obrigatório “encore” e para encerrar a noite, surgiu a música que iria quebrar o ritmo demasiado intransigente do concerto, uma aproximação ao country que Perry Blake considerou que nunca iria fazer parte de nenhum álbum.

O público foi para casa, levando nos ouvidos as confissões de um cantor tímido que gosta de canções lentas, sobre o amor. Perry Blake sabe o que faz, o seu concerto foi uma interessante e permitida viagem pela sua intimidade.

Carlos Luís Ramalhão
Foto: Joana Beleza