O Grande Auditório da Casa das Artes de Famalicão (com capacidade para cerca de 500 pessoas) apresentou-se, na noite de sexta-feira, quase cheio para receber o norte-americano Andrew Bird. A afluência justificou assim a mudança de sala, já que o concerto estava inicialmente previsto para o espaço mais reduzido do café-concerto.

Apesar de ser dono de uma carreira que já data de 1996 (com a banda Bowl of Fire), o músico de Chicago apenas saiu do anonimato com “Andrew Bird & The Mysterious Production of Eggs”, condenado a aparecer nas listas de melhores de 2005 um pouco por todo o mundo – Bird é uma revelação da pop elegante. E o público da Casa das Artes era nitidamente conhecedor e ávido da sua música (o que foi visível nos aplausos e no silêncio respeitoso).

Andrew Bird apresentou-se em palco sozinho, acompanhado apenas do inseparável violino, uma guitarra eléctrica e um “glockenspiel” (ou metalofone). Mas, para além da voz, apresentou mais um trunfo: o assobio, tantas vezes central nas suas composições, que saía dos seus lábios com impressionante precisão.

Face à limitação de ser o único músico em palco, respondeu com o “sampling” ao vivo das diferentes camadas das suas músicas, em diferentes pistas, que eram depois mantidas em “loop”. Foi através da sobreposição que Bird foi formando o corpo das canções, dividindo-se entre os diferentes instrumentos e manuseando os pedais com visível destreza. A técnica também é usada por outros cantautores, como Joseph Arthur, mas não é nada fácil e exige a máxima concentração.

Foi visível uma certa timidez cativante de Bird (contou algumas histórias entre as músicas, a maioria das quais ninguém terá percebido), que apesar de tudo se revelou descontraído na sua actuação (ao final da primeira música já tinha retirado o calçado, ficando de meias às riscas).

O último disco foi o prato forte do concerto, em músicas como “Sovay”, “Fake palindromes”, “MX Missiles”, “Measuring Cups”, “Banking on a myth”, “Skin is, my” e o potencial “single” “A nervous tic motion of the head to the left”.

Estudioso do violino desde criança, Andrew Bird é capaz de retirar do instrumento sons quase irreconhecíveis, manuseando-o com um arco ou em “pizzicato” (dedilhado), fazendo-o soar como um banjo ou como uma guitarra acústica (como em “I”, de “Weather Systems”, de 2003). De resto, apesar da ausência de secção rítmica, as canções não se ressentiram, sustentando a teoria de que as grandes composições são aquelas que resistem, mesmo quando despidas.

Do alinhamento fizeram ainda parte duas músicas “apocalípticas”: “Armchair Apocalypse”, um original, com muito de Jeff Buckley, e “Tables and Chairs”, em que Bird se referiu à inundada Nova Orleães como “one of the last truly funky places”.

O público português foi considerado acolhedor pelo violinista, que no princípio da semana tinha tocado em Lisboa. E obrigou-o a voltar ao palco para dois encores, o segundo dos quais com “Masterfade”. No final, Bird não se esqueceu do calçado. E o público não se esqueceu de sair a assobiar.

João Pedro Barros
Fotos: Ana Sofia Marques