O último episódio das relações entre Falcone e o Governo de Angola criou uma catadupa de reacções dentro e fora do país.

Em Setembro do ano passado, Eduardo dos Santos delegou no empresário francês o cargo de Ministro Plenipotenciário de Angola, junto da UNESCO. Esta nomeação surgiu exactamente na altura em que a justiça francesa emitiu o mandato de captura contra Falcone. O passaporte diplomático angolano e a imunidade política então adquiridos permitiram ao empresário sair de França.

Segundo o executivo de Eduardo dos Santos a nomeação de Falcone foi uma forma de “fazer readquirir as imunidades pessoais e funcionais de quem actuou pela conta e mandato do governo angolano.” O Ministério das Relações Exteriores afirmou ainda que a designação de Falcone assenta no “princípio secular da presunção de inocência de quem nem sequer foi ainda interrogado sobre o fundo da questão”.

A escolha de Falcone provocou em Angola uma onda de indignação que varreu todos os quadrantes da sociedade. Numa declaração conjunta, cerca de noventa partidos da oposição qualificaram a nomeação de Falcone de “gravíssima e criminosa traição à pátria”. Também o Fórum das Autoridades Internacionais manifestou a sua repulsa pela nomeação. Mário Katapai, secretário-geral desta organização que reúne os líderes tradicionais angolanos, numa entrevista à Rádio Ecclésia acusou a nomeação de ser um autêntico “insulto” ao país.

As explicações do governo angolano sobre a nomeação do empresário, também não convenceram a UNESCO. Fontes próximas desta instituição das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, afirmaram ao jornal digital angolano «Apostolado», que “é inaceitável que um traficante de minas que mataram milhares de inocentes se torne efectivo de uma organização da dignidade da UNESCO, gozando da imunidade deste estatuto”.

A turbulência provocada pela nomeação abalou a estrutura desta instituição. Num acto de protesto, a actriz Catherine Deneuve, então Embaixadora de Boa Vontade para a Protecção da Herança Cinematográfica, apresentou o seu pedido de demissão. Numa carta escrita à direcção da UNESCO, Deneuve afirmou que não podia aceitar “esta jogada diplomática, que afecta gravemente a imagem da instituição”.

Independentemente destes protestos, Falcone continua a ser Ministro Plenipotenciário de Angola, junto da organização. Em declarações ao jornal francês «Le Monde», os advogados de Falcone reafirmaram a “total imunidade diplomática” de que goza o empresário. No entanto, de acordo com a GW, “os juízes investigadores acreditam que a imunidade diplomática de Falcone se aplica apenas aos actos levados a cabo no contexto da sua posição na UNESCO”.

Pedro Cardoso (correspondente em Angola)