O Papa foi um dos principais responsáveis pela queda do Muro de Berlim.
Na sua primeira visita oficial à Polónia, em 1979 (oito meses depois de ser eleito pelo Vaticano), Karol Wojtyla contribuiu para fazer tremer o regime comunista polaco, que não conseguiu controlar a multidão que acorreu para ver o filho da terra. O papa apelou fortemente à necessidade de unir a Europa “do Atlântico aos Urales”, sob a matriz cristã.

João Paulo II, nos finais da década de 80, manifestou-se contra a miséria que atinge o mundo, culpando o carácter individualista do capitalismo. As sociedades ricas e poderosas do Ocidente são amplamente criticadas.

João Paulo II quer conciliar a experiência democrática com a justiça social, escrevendo três encíclicas dedicadas a esta problemática: “Laborem Exercens”, de Setembro de 1981, sobre o trabalho humano; “Sollicitudo Rei Socialis”, de Dezembro de 1987, sobre a diligência social da Igreja; e a “Centesimus Annus”, de Maio de 1991, onde aborda a nova realidade mundial após a queda do comunismo do Leste europeu.

Criticou as intervenções militares americanas em teatros de guerra como o Iraque, os Balcãs ou o Afeganistão. Insurgiu-se sempre contra a aplicação da pena de morte.

As suas viagens à Grã-Bretanha e à Argentina, em 1982, foram extremamente importantes na diplomacia internacional para a resolução do conflito entre os dois países por causa das ilhas Falkland/Malvinas.

Também repreendeu severamente vários países da América Latina, onde as ditaduras, a corrupção e a pobreza imperam. Entre eles, destaque especial para o México, ao qual efectuou cinco deslocações e que só na década de 90 estabeleceu relações com o Vaticano.

Foram também importantes as suas viagens a Sarajevo (Abril de 1997) e a Beirute (Maio de 1997), cidades flageladas por guerras civis sangrentas.

Defensor do liberalismo e um dos responsáveis principais da queda da “cortina de ferro”, o Papa visitou Cuba, um dos poucos regimes comunistas sobreviventes. Em 1998, João Paulo II pede a Fidel Castro mais liberdade e, simultaneamente, apela ao fim do bloqueio dos Estados Unidos à ilha, que ainda não se verificou.

A defesa das minorias

Além da África, o continente que o mundo vai esquecendo e que o Papa procura trazer para a agenda internacional através das suas viagens, também os indígenas lhe merecem uma atenção especial.

Na viagem que efectua à Guatemala e ao México, em Julho de 2002, João Paulo II confirma a preocupação que tem com o valor da cultura e da identidade dos povos indígenas, sejam eles os aborígenes da Austrália ou Nova Zelândia, ou os índios norte-americanos ou da América do Sul.

Na busca de pontes com outras religiões

Defendeu o diálogo e a tolerância entre religiões. Foi o primeiro Papa católico a visitar países islâmicos, como a Turquia (1979), o Paquistão (1981), Marrocos (1985) e a Tunísia (1996). E é também ele o primeiro a entrar numa mesquita (Síria, 2001).

Em 1995, no Sri Lanka, de predominância budista, enfrenta o protesto de vários monges por considerar o budismo como um sistema de pensamento sem Deus, mas as relações de amizade entre o Papa e Dalai Lama permitem ultrapassar o obstáculo.

Só em 2000, consegue visitar Jerusalém e a Terra Santa e estabelecer novas relações com o judaísmo, a que Woityla se refere como a “irmã mais velha” do cristianismo. Depositou no Muro das Lamentações um pedido de perdão pela responsabilidade dos católicos nas perseguições aos judeus.

Rússia e China, no entanto, permaneceram de portas fechadas a João Paulo II. No caso da Rússia, apesar da abertura política demosntrada por Gorbatchov e seguida por Ieltsin e Putin, o Vaticano não conseguiu desbloquear o visto de entrada no país devido aos problemas com a Igreja Ortodoxa, que entendeu muitas afirmações do Papa como formas abusivas de poder. Por seu lado, a China comunista ficou-se por pequenos gestos de aproximação, que não se mostraram suficientes para uma deslocação a Pequim. O reconhecimento de Taiwan por parte do Vaticano foi um dos principais entraves à abertura chinesa.

Foi no campo inter-religioso que João Paulo II conseguiu ter gestos de em alcance muito grande: por duas vezes, convoca para Assis todas as religiões para um encontro de oração pela paz no mundo, a última das quais na sequência dos atentados de 11 de
Setembro de 2001, em Nova Iorque e Washington.

Bastião de contradições

Temas como o aborto, a eutanásia, o planeamento familiar, o divórcio mereceram a oposição severa de João Paulo II. Provocou escândalo ao comparar, na Polónia, em 1991, o Holocausto e “os grandes cemitérios das crianças que não nasceram”, e permitiu que responsáveis do Vaticano afirmassem, em 1994, que as mulheres bósnias violadas durante a guerra civil não deviam abortar.

Manteve como dogmas intocáveis a ordenação das mulheres e de homens casados, encerrando o assunto num documento eclesiástico.

Milene Câmara
Foto: Público