Gregório Chicha foi um ex-agente da Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE), na Região Autónoma da Madeira. O seu testemunho ilustra uma visão muito particular sobre o salazarismo e mostra a outra face da moeda, de quem pertenceu ao regime e dependia dele para viver.

A PIDE foi criada em 1945 e depois de Marcelo Caetano suceder a Salazar, em 1969, passou a chamar-se Direcção Geral de Segurança, que foi extinta logo após a Revolução dos Cravos, em Abril de 1974.

Em que ano ingressou na PIDE?

Entrei em 1963. Eu saí da tropa e concorri para a PIDE, porque era o que havia na altura já que não havia muitas saídas para emprego.

Mas tinha consciência que estava a ingressar numa polícia política?

“Quem não quer ser lobo não lhe vista a pele”. Eu ingressei na polícia que havia. Se era um regime ditatorial… olhe, não tínhamos outro.

Quais eram as funções que desempenhava em serviço?

Trabalhava, principalmente com estrangeiros, que o regime na altura não os queria cá. E nós [agentes] na fronteira, tanto marítima como terrestre, tínhamos um ficheiro próprio que levávamos para bordo dos navios e antes do desembarque, o comandante apresentava as listas de passageiros e nós verificávamos se podiam entrar. Se houvesse denúncias de fora, dos “bufos”, normalmente actuávamos.

Quem eram esses “bufos”?

Estavam em toda a sociedade. Havia “bufos” em todo o lado, desde colégios a praticamente todos os organismos do Estado. Dentro do exército também havia. Estavam em todo o lado.

Qual era a função dessas pessoas?

A função deles?… Eram uns falhados, numa palavra! Eram indivíduos que queriam singrar na vida e faziam tudo para isso.

Mas eram recrutados pela PIDE?

Não, não..! Bem, havia alguns. Aqui na Madeira tínhamos três ou quatro, mas só nas campanhas eleitorais. Nós não podíamos vigiar as campanhas porque éramos conhecidos.

Se um desses “bufos” fizesse uma denúncia sobre uma pessoa qual era o procedimento que se seguia?

Averiguávamos. Não íamos prender a pessoa, como se costuma dizer por aí. Só se realmente essa denúncia se confirmasse.

Houve muitos casos de presos políticos na Madeira?

Eu posso lhe garantir que desde 1963, quando eu entrei em funções, a 1974 não houve uma única prisão por motivos políticos. Houve detenções por imigração clandestina, como hoje se fazem.

Milene Câmara