O Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) continua a representar um grave problema epidemiológico, um pouco por todo o mundo. Só na cidade do Porto, existem actualmente 5.626 seropositivos. No ano passado, a estimativa mundial foi de cinco milhões de novos casos, o que representa cerca de 15 mil casos por dia.

Estes são números que preocupam Ana Tato, coordenadora da Comissão Distrital de Luta contra a SIDA. Esta médica justifica valores tão elevados pelo facto de se tratar de uma questão em que “a sexualidade está em jogo, que envolve afectos, afectando o lado racional das pessoas. A partir daí as coisas misturam-se e complicam-se extremamente”. O resultado é que “os afectos ganham e o preservativo perde”, explica ao JPN.

Ano Tato descreve a adolescência como a fase mais complicada, porque “é nessa altura que começam as primeiras saídas, os primeiros encontros, os primeiros ‘shots´”. E deve começar também aí a sensibilização para os riscos que se correm. A médica do CAD do Porto considera que “o mais importante é termos consciência, desde cedo, de que todos somos parte do problema, mas também da solução”. E adianta que “essa decisão tem que ser interior, pessoal. Esta questão não se compadece apenas com campanhas massivas, mas sim com o trabalho personalizado de cada um”.

O vírus que elimina “os soldados do exército imunitário”

O VIH/SIDA é disseminado através de comportamentos que ocorrem, frequentemente, em privado, tais como as relações sexuais não protegidas, sem preservativo, e através da injecção de drogas com agulhas partilhadas, por exemplo. O vírus também pode ser transmitido às crianças durante a gravidez, o parto ou a amamentação por uma mãe que seja portadora do vírus VIH.

Ana Tato explicou ao JPN que “a SIDA não é uma doença, mas sim um síndrome. O sistema imunitário começa a ficar debilitado e, ao contrário do que acontece com outras doenças, em que o sistema imunitário produz anticorpos que conseguem destruir o agente patogénico, o vírus HIV destrói as células do próprio sistema imunitário”.

A partir do momento em que a pessoa está infectada, “o vírus vai pegar no nosso material genético, no nosso ADN e incorpora os novos vírus que vão ser replicados”. A partir daí, “o sistema imunitário começa a reconhecer o vírus que agora se identifica com o organismo por ter o mesmo material genético. Logo, nada faz contra ele”, explicou Ana Tato. “A pessoa que está infectada vai tendo cada vez menos células do sistema imunitário. É um exército que começa a perder soldados, começa a adoecer com as doenças oportunistas que podem atingir qualquer aparelho do corpo humano”, afirmou.

Quando uma pessoa é infectada pelo VIH, podem passar vários anos até que se manifestem sinais da doença. Esses sinais surgem quando o sistema imunológico da pessoa falha, pelo que pode ser atacado facilmente por doenças comuns na comunidade – as chamadas “doenças oportunistas”. Uma vez que os sintomas, tais como as infecções respiratórias ou de pele, podem ser confundidos com os de outras doenças ou aparecem muito depois da exposição ao vírus, o VIH permanece invisível durante algum tempo.

Daí a importância de fazer os testes de rastreio, passado o “período de janela”, isto é, os cerca de três meses necessários para que a doença se manifeste após o comportamento de risco, para medir a carga viral. “A carga viral é que vai, de alguma forma, dar a perceber como está a progredir a doença, ou melhor, a infecção, permitindo ao infecciologista determinar o momento em que aquela pessoa necessita de começar a fazer um tratamento profiláctico, no sentido de diminuir a carga viral ou de, pelo menos, fazer com que ela se mantenha numa situação em que não seja danosa para o sistema imunitário”.

A cura que não chega

Por enquanto, a SIDA ainda não tem cura. Ana Tato diz que “a terapêutica já existente, ajustada a cada caso, consegue fazer suster a infecção e criar uma determinada qualidade de vida que exige, obviamente, uma disciplina muito grande por parte da pessoa que está a ser tratada. Mas, para todos os efeitos, não há cura”.

A médica do CAD observa que “é muito importante que, quando se fala no tratamento, se diga que este é um tratamento profiláctico e não um tratamento curativo”. Apesar de louvar todos os esforços feitos nesta área de investigação, teme que “as notícias de novos medicamentos para uma infecção crónica possam ter como resultado uma falsa crença de que a doença já tem um tratamento, o que infelizmente não é verdade”.

Anabela Couto
Hugo Manuel Correia