Luís Campos e Cunha pediu a demissão do Governo ao final da tarde de ontem, quarta-feira, poucas horas depois da reafirmação do programa de grandes investimentos (como a Ota e o TGV) no Parlamento pelo ministro das Obras Públicas, Mário Lino, e defendido pelo primeiro-ministro e pelo ministro da Economia. É a primeira remodelação governamental no executivo de José Sócrates, apenas 130 dias após a posse do XVII Governo, a 12 de Março.

Prontamente, o primeiro-ministro convidou para o cargo Fernando Teixeira dos Santos, presidente da Comissão de Mercados e Valores Mobiliários (CMVM).

O ex-ministro das Finanças alega “cansaço” e motivos de saúde e pessoais para a sua demissão, mas a persistência de Sócrates na construção do novo aeroporto da Ota e do TGV ainda nesta legislatura, apesar da crise financeira, estará na base da saída.

Campos e Cunha escreveu no passado domingo no jornal “Público” um artigo polémico onde que defendia a “necessidade de uma análise prévia de rendibilidade” dos investimentos do Plano de Investimentos em Infra-estruturas Prioritárias (PIIP), sob pena de comprometer o futuro do país.

A controvérsia acompanhou sempre o mandato de Campos e Cunha nas Finanças. Mesmo antes de tomar posse, em Março, admitiu uma subida de impostos, contrariando o discurso de Sócrates.

Mais recentemente, as declarações do ex-ministro sobre o TGV e o aeroporto da OTA chocaram contra as intenções do ministro das Obras Públicas. Campos e Cunha afirmou terça-feira, no Parlamento, que se tratavam de projectos ainda em avaliação, o que não terá agradado a Mário Lino.

”Forte abalo na credibilidade do Governo”

A oposição não se mostrou surpreendida, face às recentes polémicas em que Campos e Cunha se envolveu, nomeadamente o artigo de opinião publicado no “Público” em que sustentou que o crescimento económico depende da qualidade e não da quantidade de investimento público, dando como exemplo o caso da Suécia.

Os líderes do PSD e do PP, Marques Mendes e Ribeiro e Castro, consideraram a demissão um forte abalo na “estabilidade governativa” e salientaram o facto pouco normal de um ministro de uma pasta tão importante sair ao fim de apenas 130 dias de governação.

Marques Mendes disse que a demissão constituia um “profundo abalo na credibilidade do Governo” e um “péssimo sinal para os agentes económicos nacionais e internacionais”, salientando que “não há memória em Portugal” de um ministro das Finanças “se demitir ao fim de quatro meses de governação”.

Ribeiro e Castro afirmou que “nenhum governo credível tem um ministro que dure apenas três meses e meio” e que a saída do ministro “pode manchar a credibilidade externa do país”.

O PCP considerou que a demissão do ministro é a “primeira e significativa derrota” do Governo e da sua política, que “é preciso ver substituída”.

Francisco Louçã, do Bloco de Esquerda, lembrou que existiam divergências entre o ministro e o Governo quanto à política orçamental.

Coube ao coordenador da Comissão Política Nacional do PS, defender o Governo, recusando relacionar a demissão com a divergência entre Campos e Cunha e o primeiro-ministro sobre o PIIP. Jorge Coelho preferiu destacar a “coragem” e a “determinação” do ministro demissionário.

Com a saída de Luís Campos e Cunha ficam também demissionários os seus quatro secretários de Estado: Manuel Baganha (Adjunto e do Orçamento), Maria dos Anjos Capote (Tesouro e Finanças), João Amaral Tomás (Assuntos Fiscais) e João Figueiredo (Administração Pública).

Pedro Rios
David Pinto
Foto: UNL