Depois da guerra da Bósnia, é com dificuldade que a desmembrada Jugoslávia se ergue por entre as cinzas. Milan Rados, professor universitário especialista em assuntos dos Balcãs, acredita que a guerra só veio piorar a situação dos países daquela região e não resolveu o problema principal: a questão do nacionalismo político.

“A guerra acabou, a Sérvia foi bombardeada, os EUA cumpriram o seu objectivo, mas o nacionalismo continua forte em todos os países. Continua a ser o sentimento predominante na população. Se amanhã porventura houver uma faísca, pode arder tudo outra vez”, alerta.

Preocupado com a situação no seu país, o professor da Universidade do Porto afasta, no entanto, qualquer cenário de guerra civil. “Não há força para isso. Não há exército, nem vontade. Os sérvios estão fartos de guerra. Se há um povo que não quer guerra são os sérvios. O povo está tão preocupado com a sobrevivência que pouco se importam com a situação de Milosevic. Até com o actual presidente… Querem é dar de comer aos filhos”, diz.

A força dos sérvios e dos croatas deve estar, segundo o especialista em política externa, na tentativa de melhorar a economia dos países. Para tal, seria necessária ajuda internacional com urgência.

“Para poder haver paz, é necessário uma ajuda económica extraordinaria imediata. Também era necessário que os governos da UE e dos EUA reconhecessem alguns erros que cometeram. Só assim, equilibrando as relações entre os diferentes povos que vivem lá, que se odeiam infelizmente, é que é possivel criar algum futuro. Neste momento, não há futuro. Há ódio e pobreza”, lamenta.

“Por causa da guerra, a Cróacia acumulou uma dívida externa enorme. Tem de trabalhar um século para devolver os gastos de guerra que teve, isto se tiver sucesso económico. Mas muita coisa ainda não funciona. O turismo começa a recuperar, mas ainda está longe do que era antes da guerra”.

Em relação à Sérvia, Rados realça o tempo que vai ser necessário para recuperar toda a indústria destruída durante o conflito do Balcãs e eliminar as tensões ainda existentes entre sérvios e bósnios. “Depois há a pressão sobre os sérvios que vivem na Bósnia. Vivem lá como se fosse em guetos. Na Bósnia morre-se devido a uma doença insignificante, com cura. Mas não há dinheiro para medicamentos, mesmo os mais baratos”.

O professor de ciência política insiste na necessidade de criar um sentimento de esperança na população, incentivada pela ajuda externa internacional. No entanto, Milan Rados lembra que o processo de mudança de mentalidades é longo e doloroso, que “necessita de condições e dinheiro para que se recupere a confiança daqueles povos que viveram juntos durante 45 anos.

“[São] Povos que criaram laços, depois rompidos por ódio. Foi derramado sangue. E quando cai sangue é preciso no mínimo uma ou duas gerações para que se esqueça e fique resolvido. Mas também é preciso condições favoráveis à reconciliação – ajuda económica. Assim os povos podem crescer e entender-se. É possível acontecer. É preciso esperança.”

David Pinto
Foto: Miguel Lourenço Pereira/Arquivo JPN