D. Deolinda tem 64 anos e vende cerâmica na Feira de Barcelos “há mais de 40”. Diz que nunca tocou num “compurtador” e que ainda pensa tudo “em escudos”. Contudo, tendo como pano de fundo os conhecidos galos de Barcelos e ao som das discussões e dos pregões que envolvem todo o espaço, arriscámos a pergunta: “Já ouviu falar em comércio electrónico?” A resposta não tarda: “Comércio quê? O que é isso, moço?” Mas a explicação surge à pressão e acaba por confundir ainda mais a D. Deolinda: “As pessoas compram sem sair de casa? E como é que pagam?” Insistimos com a explicação, mas o resultado não é muito diferente: “Paga-se por multibanco!? Que confusão! Eu já estou muito velha para isso”, remata D. Deolinda enquanto sorri para uma cliente, dando por terminada uma conversa que decorre quase de forma surreal.

Porém, como o JPN pôde constatar numa pequena viagem pela Feira de Barcelos, a D. Deolinda não é a única pessoa para quem o comércio electrónico se apresenta ainda como uma realidade totalmente desconhecida. Na verdade, prosseguindo por entre as dezenas de tendas que se estendem ao longo do Campo da Feira, encontramos o Joaquim, de 29 anos, a comprar alguns pares de meias. E a abordagem é semelhante: “Já ouviu falar em comércio electrónico?” A resposta surge de forma mais tímida, mas não destoa: “Nunca ouvi falar”. Porém, desta vez, a explicação já vai treinada, motivando uma resposta mais esclarecida. “Eu tenho computador e talvez até seja bom, mas já venho aqui há tanto tempo que não me imagino agora a fazer compras de casa”, refere Joaquim, cujas palavras são cortadas pela D. Lurdes, a vendedora de meias, sempre atenta à conversa: “Aqui as pessoas podem falar à vontade e se já não trocam isso pelos centros comerciais, não acho que vão querer ficar em casa a fazer compras!”

Apesar de tudo, nem toda a gente se mostra irredutível quanto à possibilidade de vir a utilizar o comércio electrónico (pelo menos na forma como o explicamos). É esse o caso de Olívia, de 32 anos, que fomos encontrar com o filho junto a uma banca de fruta e que, à pergunta de sempre, consegue arranhar uma resposta. “Comércio electrónico… Acho que é fazer compras pelo telefone ou pelo computador não é?”, diz Olívia, acabando depois por se confessar com um olhar reprovador: “Não sei bem o que é”. Um olhar que se extingue após uma explicação que já sai de forma mecânica, à qual Olívia responde: “Isso era óptimo porque podia ficar em casa com os meus filhos, e se costumam fazer promoções, ainda melhor. Já vou dizer ao meu marido!”

O entusiasmo de Olívia acaba por encorajar o JPN a prosseguir a viagem por entre a azáfama da Feira de Barcelos em busca de alguém que saiba dizer o que é o comércio electrónco. Contudo, e após mais algumas tentativas, as respostas raramente são diferentes e por entre as explicações que sucedem a mais uns “não sei”, “nunca ouvi falar” e a um ou outro “isto é para os apanhados?”, acabamos por desistir. No ar fica apenas a certeza de que ainda vai demorar muito tempo até que o comércio electrónico passe a fazer parte do vocabulário dos muitos portugueses que, por enquanto, ainda preferem fazer compras no comércio tradicional…

Tiago Reis