Depois de mais de quarenta anos de espera, todos na Turqia anseiam pela resposta que esta Cimeira Europeia tem para lhes dar. Ou seja, que digam finalmente que sim a Ancara, e que o processo oficial de negociações para a adesão europeia tenha um início oficial.

Tudo indica que seja essa a palavra dos Vinte Cinco. A Turquia registou significativas evoluções em áreas chave como a economia, os Direitos Humanos e a questão cipriota, e promete, caso o processo comece já no próximo ano, melhorar muito mais.

França lidera contestação

Mesmo assim, há muitos europeus que não se mostram convencidos com os argumentos turcos. A França é o principal centro de contestação a este processo de negociações. Jacques Chirac tem contra si um país inteiro, espicaçado pelo problema religioso que passa pela incorporação no espaço europeu de um estado-membro com mais de 70 milhões de muçulmanos. Mas também a Áustria, os países nórdicos e o próprio Chipre não se mostram muito favoráveis a que o processo chegue a bom porto. Só que, mais uma vez, será o peso político dos grandes estados a decidir tudo. E uma união entre a Alemanha, Reino Unido, Itália, Espanha, Polónia e Portugal pode chegar para forçar os restantes membros a dizerem que sim, mesmo que timidamente e a contragosto.

De qualquer forma, esta é já uma vitória para Ancara. E especialmente para Recep Erdogan. O primeiro-ministro turco, nos últimos dois anos, tem desencadeado diversas reformas constitucionais para agradar a Bruxelas e merece todo o mérito se as perspectivas turcas se confirmarem.

Mas a Turquia tem ainda falhas a corrigir e um longo caminho a percorrer. O processo, a ser aprovado, terminará apenas num período entre 2015-2020, podendo muita coisa acontecer até lá. Ciente da instabilidade actual do mundo muçulmano, a própria União Europeia já fez saber que este vai ser um processo bem diferente dos anteriores. Bruxelas reserva-se o direito de inspeccionar no terreno as aplicações práticas das leis aprovadas pelo governo turco e promete interromper o processo de imediato, caso seja detectado um retrocesso por parte da Turquia no processo de democratização daquele que poderá vir a tornar-se o maior estado-membro da União.

Europeus alheados

Para os europeus, esta questão tem passado um pouco ao lado. Nos países cujos governos são apoiantes da adesão turca – muito à custa também da forte pressão que Washington tem exercido nos últimos meses – a questão nem se coloca. Apenas em países onde as comunidades muçulmanas são presença forte, como em França ou na Alemanha, ou em estados onde a economia pode ser gravemente afectada com a entrada turca – o caso austríaco – é que o tema se debate na praça publica.

Mas, apesar de tudo, fica a ideia no ar de que a Turquia é recebida, não de braços abertos como aconteceu com os países do antigo bloco soviético, mas a contragosto, como se de uma obrigação se tratasse. Uma ideia que os líderes europeus vão querer apagar o mais depressa possível.

Numa análise mais profunda, podemos ver que, com a Turquia como estado-membro, a União Europeia ganha um outro peso. Tanto político, como diplomático. A nível económico a questão é mais negra, já que a Turquia se encontra com um défice na ordem dos 30%. Um problema que demorará várias décadas a resolver e que pode ter consequências negativas para o crescimento económico da União. Por fim, resta a questão cultural. Após um processo complexo que levou a Europa a estender-se para Leste, é preciso ver até que ponto a União Europeia está preparada para o choque cultural que significará a chegada deste novo país membro.

Sexta-feira, tem início a Cimeira dos Líderes dos Vinte e Cinco. Além dos sorrisos para a fotografia e dos acenos afirmativos ao governo turco, este encontro vai proporcionar-nos uma visão concreta do que os líderes europeus querem para o projecto europeu. Um projecto que precisa urgentemente de uma estruturação sólida, de modo a enfrentar os difíceis obstáculos de um futuro cada vez mais complexo.

Miguel Lourenço Pereira