O Hamas conquistou 76 lugares no parlamento palestiniano, contra 43 da Fatah, nas eleições legislativas de ontem, quarta-feira. Os dados foram divulgados hoje, à tarde, e confirmam a vitória do movimento radical. O presidente da comissão central de eleições, CCE, Hana Naser admitiu que pode ocorrer uma ligeira alteração, mas sublinhou que os resultados se referem a 95% dos votos.

Os restantes 13 assentos – num total de 132 – distribuem-se por vários pequenos partidos e candidatos independentes: Frente Popular de Libertação da Palestina (três deputados), Badil (pequenas facções da OLP – dois lugares), Palestina Independente (dois), Terceira Via (dois) e quatro candidatos independentes, três deles apoiados pelo Hamas.

A Fatah já garantiu que não integrará um governo de coligação com o Hamas. Contactado pelo JPN, John Calvert, professor na Universidade Creighton, nos EUA, explica que a “Fatah compreende que uma coligação com o Hamas, daria ao Hamas uma legitimidade adicional aos olhos do povo palestiniano”.

Já Neve Gordon, docente de política na universidade Ben-Gurion, em Israel, afirma que o convite do movimento vencedor à Fatah se deve à impreparação do Hamas para governar. “Na verdade, [o Hamas] não queria vencer”, diz ao JPN.

A derrota eleitoral “desanimou seriamente a Fatah e outros grupos e movimentos seculares da Palestina. Estão confusos e neste momento não sabem como reagir”, refere John Calvert. O especialista em questões do Médio Oriente considera que a vitória do Hamas, “que surge pouco depois da performance eleitoral recente da Irmandade Muçulmana no Egipto”, “dá energia aos movimentos islamistas de todo o Médio Oriente e Ásia”.

Hamas pode baixar as armas

“A longo prazo, a responsabilidade política pode ter um efeito apaziguador no Hamas, o que o pode levar a encetar negociações com Israel, apesar de que nunca reconhecerá a legitimidade de Israel como um estado soberano. O Hamas pode extender a sua trégua, justificada pela lei islâmica, baixar as armas – a não ser que seja deliberadamente provocado por Israel – e focar a sua atenção na construção de um estado em Gaza e na Cisjordânia”, analisa John Calvert.

Também Neve Gordon considera que o Hamas “vai querer cooperar com Israel, pelo menos nos primeiros tempos, porque é uma organização pragmática”.

Para Adrien Wing, da Universidade de Iowa, EUA, “levará alguns meses até que o governo palestiniano se componha”, o que vai “sem dúvida afectar as eleições israelitas [marcadas para 28 de Março] e o que os candidatos vão dizer”. Wing diz que o Roteiro para a Paz “descarrilou” e pode assim permanecer indefinidamente ou até “bem depois das eleições israelitas que vão dar algum tempo ao Hamas para se compor”.

A especialista norte-americana antecipa a possibilidade de o Hamas “compreender que para governar terá que se comprometer em muitas coisas, incluindo o processo de paz”. Mas avisa: “provavelmente, [o Hamas] não terá capacidade para se moderar o suficiente, se mantiver uma agenda que restringe os direitos das mulheres e defende a criação de um estado islâmico na Palestina”. “Não é apenas uma questão de luta armada. Acho que eles podem abandoná-la para governar em boas condições”, acrescenta.

Pedro Rios
Foto: Palestine Monitor