No momento em que a taxa de alcoolemia volta à discussão pública, o JPN foi tentar perceber a diferença entre a taxa de 0,5 gramas por litro (g/l), actualmente em vigor, e a taxa de 0,2 g/l, sugerida pelo secretário de Estado da Administração Interna, Ascenso Simões.

A responsável pelo serviço de toxicologia da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (FFUP), Maria de Lurdes Bastos, explica que baixar a taxa de alcoolemia para 0,2 g/l teria sobretudo um “efeito pedagógico”, mas serviria apenas “para dissuadir as pessoas de beberem antes de conduzir”. Isto porque, diz a especialista, em termos práticos não há uma diferença tão grande entre 0,5 g/l e 0,2g/l.

Para Maria de Lurdes Bastos, “o efeito do álcool depende muito das pessoas”. A mesma bebida tem efeitos diferentes em indivíduos com características distintas.

Com uma taxa de alcoolemia de 0,2 g/l, “as pessoas mais susceptíveis poderão ter alguma redução do tempo de reacção”, mas, explica, continua a ser difícil apontar a diferença entre os dois valores.

Rui Rangel, do Laboratório de Toxicologia do Instituto de Medicina Legal do Porto, também acredita que o que vai fazer variar o efeito do álcool nos comportamentos são as características de cada indivíduo. “Depende da pessoa e das circunstâncias”, afirma.

Rui Rangel não tem conhecimento de estudos “que digam que exista esta taxa ou aquela” por onde nos possamos reger, quando se trata de definir um limite de álcool no sangue.

Por isso, o Laboratório de Toxicologia usa uma tabela que não tem valores rígidos. “[Esta tabela] dá-nos estados de comportamento ou efeitos derivados do uso do álcool”, explica Rui Rangel.

Comissão Europeia recomenda taxa de alcoolemia

Em Janeiro de 2001, a Comissão Europeia adoptou um conjunto de medidas para uniformizar as taxas de alcoolemia nos Estados-membros em 0,5 g/l – as elevadas taxas de mortes na estrada derivavam em grande parte do consumo excessivo de álcool por parte dos condutores. De acordo com um estudo da Comissão Europeia, publicado em 2001, pelo menos 10 mil indivíduos por ano sofrem acidentes fatais por causa do consumo de álcool.

A maioria dos países da União Europeia tinham já adoptado a taxa de alcoolemia recomendada pela Comissão, mas o documento introduziu uma novidade: a criação de uma segunda taxa a ser aplicada só a determinados tipos de condutores e de veículos. Os condutores de veículos que transportam mercadorias perigosas, veículos de grandes dimensões, veículos de duas rodas e também os condutores inexperientes ficaram sujeitos a uma taxa de alcoolemia de 0,2 g/l.

A Europa é a maior produtora e consumidora de bebidas alcoólicas. Os números são da publicação “World Drink Trends” de 2005 que põe o Luxemburgo no topo da lista. Portugal ocupa o oitavo lugar na classificação com um consumo médio de álcool puro de 9,6 litros.

“Somos um país que produz e consome muito vinho”, diz Maria Lurdes Bastos. É “difícil implementar (uma possível alteração da taxa para 0,2) a não ser que as pessoas deixem de beber antes de conduzir”, afirma a responsável pelo serviço de toxicologia da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto.

Apesar de o ministro da Agricultura já ter desmentido as declarações do secretário de Estado da Administração Interna, a possível alteração da taxa de alcoolemia voltou à discussão pública.

Inês Castanheira
Ana Sofia Coelho
Foto: SXC