Há portugueses entre os doze finalistas do Future Ideas, concurso europeu que seleciona as melhores “ideias de futuro” e premeia as três melhores teses de mestrado em competição. Portugal, aliás, bateu o recorde de trabalhos académicos enviados: das 234 teses de mestrado a concurso, 81 são de estudantes portugueses, entre eles Ana Sofia Fonseca, Ricardo Moreira e Susana Santos, os três nascidos em Portugal, os três atualmente fora de Portugal.
Números
234 teses enviadas
81 candidatos de Portugal
36 candidatos da Holanda
12 Finalistas:
1 Itália
1 Grécia
1 Áustria
1 Finlândia
3 Portugal
5 Holanda
Dia 21 de junho, são anunciados os três vencedores, que recebem, respectivamente, 3500, 1500 e 500 euros, numa cerimónia oficial em Amesterdão. Os doze finalistas têm dois minutos para apresentar os seus projetos e convencer o júri. Ana Sofia e Ricardo lá estarão – Susana ainda não sabe se vai. A arquiteta de 27 anos, a viver na Suíça, está a mudar de trabalho, mas a ideia de ter dois minutos para apresentar a sua tese não é, de todo, “problemática”. Já o costuma fazer.
Nascida em Lamego, Susana já vivia na Suíça quando decidiu regressar a Portugal para estudar Arquitetura. Frequentou o mestrado integrado na Universidade Lusíada do Porto. A tese “A luz da sombra”, um título assumidamente “provocatório”, valeu-lhe 18 valores; decidiu dar-lhe uma segunda vida. A dissertação aborda a problemática da falta de luz solar direta em edifícios de algumas áreas. Analisou a encosta de Vila Nova de Gaia, perto da Ponte Luiz I, e procurou soluções. Conclusão: “Estes edifícios podem ter luz, desde que os projetos sejam pensados de outra forma.”
Construir clarabóias, incluir materiais perfurados que possibilitam a entrada de luz e aproveitar as características do terreno são algumas das opções. “Os arquitetos estão tão ocupados com a estética que nem sempre pensam neste pequenino passo – como vou introduzir luz natural?” Em cidades com duas margens, como Porto (com muita luz) e Gaia (com pouca), este problema é “frequente”. Pode ter, entre outras, implicações térmicas, por isso Susana reclama que este é um investimento “rentável” e um nicho que se pode explorar numa altura em que o sector da construção está em crise – “adaptar” os edifícios que já existem. Ser finalista na categoria de Inovação Social, a que teve mais candidaturas, com uma tese em Arquitetura é algo que a surpreende. Se ganhar, ainda não sabe o que fará ao dinheiro. “Fica de parte para eventualmente criar algo”, diz.
Uma tese, um novo produto
Já Ricardo Moreira, finalista na área Saúde, sabe perfeitamente onde aplicará o dinheiro. Com 24 anos, está na Alemanha a terminar o doutoramento. O mestrado em Engenharia Biomédica pela Universidade do Minho foi concluído já lá, em Aachen, durante o período Erasmus. A tese “A new cardiovascular bioimplant: development of a mitral valve based on a textile tubular structure” obteve nota máxima: 20 valores. E até pode trazer um novo produto para o mercado.
“O trabalho consistiu no desenvolvimento de uma válvula mitral para o coração baseado nos princípios da engenharia de tecidos”, explica o jovem investigador. “Basicamente, o que temos no mercado são válvulas mecânicas e biológicas, mas ainda com algumas desvantagens”, explica. Neste novo processo, são retiradas células do próprio paciente, é feito um molde e depois é desenvolvida uma válvula com essas células, em tudo igual à válvula nativa. Vantagens: “Adaptação ao ambiente biológico, capacidade de desenvolver tecido quando já está no ambiente, não há risco de infecção e não há risco de tromboembolismo.”
Este projeto “não ficou na gaveta”. Foi financiado e a investigação está a continuar no AME-Institute of Applied Medical Engineering no Helmholtz Institute. Ricardo está a fazer doutoramento noutro projeto na mesma área, mas também supervisiona o seu projeto de mestrado que vai passar agora para os testes pré-clínicos (em animais, mais precisamente em ovelhas). “Estou contente porque desenvolvi um trabalho que pode ser um produto daqui a dez anos.” Por isso, está confiante para a final do Future Ideas.
A vida dos Veículos em Fim de Vida
A frequentar o doutoramento em Barcelona na área de exposição ocupacional a aerossóis industriais desde Março, Ana Sofia Fonseca ainda quer mudar a gestão dos Veículos em Fim de Vida (VFV). Na tese “Impactos Ambientais da Integração vs Eliminação de Resíduos de VFV”, dissertação final do mestrado em Engenharia do Ambiente da Universidade de Aveiro, pela qual recebeu 18 valores, concluiu que quanto mais extensa for a desmontagem de um VFV, mais sustentável será esta gestão.
Em Valença do Minho, fez pesquisa de campo numa unidade empresarial de receção e desmantelamento e visitou uma outra empresa de fragmentação. Percebeu que optar por aumentar o desmantelamento (em vez da fragmentação, a prática atual), traz vantagens para o meio ambiente. Permite a “separação e a obtenção de fluxos de materiais com um nível de pureza” tal que “facilita o envio para reciclagem de uma maior quantidade de resíduos”. Por isso, poupa os recursos não renováveis e contribui para que sejam atingidas as metas europeias de reciclagem e valorização. Já para não falar na criação de postos de trabalho diretos e indiretos.
Com 25 anos, Ana Sofia concorreu ao Future Ideas porque espera que o seu trabalho possa influenciar o mercado. É finalista na área de Indústria (“Manufacturing”) para a qual houve apenas quatro candidatos. “Acho que pode ter um valor acrescido neste ramo empresarial e melhorias ambientais, evidentemente.” O dinheiro, claro, não é um “desincentivo”, mas, exclama, já ganhou. “Ter chegado até aqui e ver o meu trabalho como um dos 12 potenciais Future Ideas já foi meritório.”