562 dias depois de anunciada a proibição da entrada de adeptos em recintos desportivos, o Futebol Clube da Foz voltou a abrir as portas do seu recinto (emprestado) e os sócios e simpatizantes aderiram em força. O JPN marcou presença e acompanhou o regresso dos adeptos às bancadas de um dos históricos clubes da cidade do Porto.

O final de tarde de sábado, dia 25 de setembro, marcou o regresso dos adeptos do FC Foz aos jogos do clube da terra, 18 meses depois de a pandemia ter levado à proibição da entrada de adeptos nos recintos desportivos. Nas bancadas do Parque de Jogos do Inatel de Ramalde, casa emprestada à equipa da Foz, os adeptos marcaram presença em peso e deram força à ideia da importância do público nos jogos de futebol.

A 15 minutos do arranque da partida, rondava já a centena o número de adeptos presentes nas bancadas para ver o encontro que opunha o FC Foz ao Folgosa da Maia, em jogo a contar para a Divisão de Elite da Associação de Futebol do Porto (AF Porto). Entre o burburinho que antecedia o jogo ouvia-se, aqui e ali, algo que resumia o estado de espírito dos que lá estavam: já fazia falta “ir ver a bola”.

A conversa foi-se pondo em dia. Dificilmente entrava alguém cuja cara não fosse reconhecida por quem já se instalara na bancada. Somavam-se os cumprimentos saudosos, as perguntas sobre a família e os inevitáveis comentários, tão típicos como superficiais, aos resultados da equipa do coração.

Sobre a Covid-19, pouco ou nada se falava. À semelhança do que tem sido observado pelas bancadas de todo o país, o uso de máscara – obrigatório, segundo parecer da Direção-Geral da Saúde – foi secundarizado e eram menos os que a usavam do que os que a dispensavam.

Ambiente “perfeitamente seguro”

Entres os adeptos com máscara, encontrava-se Domingos Sá, reformado de 70 anos que, embora vacinado, revelou que mantinha ainda algum receio relativo a um possível agravamento da situação pandémica: “Sinto-me seguro aqui, mas ainda temos de nos precaver um bocado, porque isto, de um momento para o outro, muda tudo. As pessoas estão familiarizadas com a pandemia, então, já se resguardam, mas eu tenho ainda um bocado de receio disto. Tenho a vacina em ordem, já tenho 70 e convém ter cuidado”. O adepto relembrou que “parecendo que não, foram quase 18 meses em casa” e, por isso, apesar do receio, “claro que é melhor estar aqui”. “Este é um bom plano para fazer a gente sair da vida sedentária em que esteve”, acrescentou ao JPN.

A conversa foi sendo posta em dia. Foto: Tiago Sousa

À hora marcada, o árbitro deu o apito inicial e nas bancadas foram raríssimos os momentos nos quais o silêncio tomou lugar. Ainda que sem claque organizada e sem cânticos que criassem uma envolvência sonora mais evidente, os adeptos foram incessantes no apoio às equipas. Entre insultos à sempre mal-amada equipa de arbitragem e gritos para moralizar os jogadores, o FC Foz chegava ao intervalo a perder por 0-2.

Nas bancadas lamentava-se o resultado, mas a isso sobrepunha-se a necessidade de, naqueles 15 minutos de descanso, repor a conversa que o apito inicial interrompera. À conversa com o JPN, Armando Silva, médico dentista de 51 anos, adepto do FC Foz que trazia consigo os dois filhos (também jogadores do FC Foz, nas camadas jovens) não mostrou, naturalmente, agrado com o resultado, mas desvalorizou e relembrou a “falta que sentia deste ambiente”. “É uma maravilha este ambiente tão familiar”, acrescentou.

Questionado sobre se reconhecia algum risco para a saúde pública neste regresso dos adeptos, Armando Silva afirmou sentir-se “perfeitamente seguro”. Opinião que corrobora a visão de Eduardo Avides Moreira, presidente do FC Foz, sobre os riscos sanitários da reabertura dos estádios: “Não há problemas de contágio ao ar livre. [O futebol] é uma atividade que, nas bancadas, não considero de risco; dentro de campo pode ser, mas nas bancadas não considero de risco”.

O presidente do FC Foz, gestor de empresas de profissão, somou a estas considerações um balanço muito positivo desta reabertura e abordou o impacto da falta de adeptos nestes 562 dias sem a presença humana nas bancadas: “Há um grande impacto, porque o futebol só faz sentido com público. Quando se tem o estádio vazio, os jogos não são iguais, os adeptos fizeram muita falta não pela componente financeira, mas pelo seu papel no acompanhamento do clube”.

Adeptos que “contam”

O jogo recomeçou para se jogarem os segundos 45 minutos, o Folgosa da Maia tinha uma vantagem para defender e a equipa da casa partiu para o jogo com o objetivo de, pelo menos, sair com um empate do recinto. Os adeptos fizeram a sua parte, apoiando, novamente, do primeiro ao último minuto. A equipa mostrou confiança e diminuiu a desvantagem para 1-2 aos 57 minutos e essa confiança transferiu-se para a bancada, que acreditou até ao último minuto no golo do empate.

O Folgosa da Maia defendeu como pôde o resultado, “queimou tempo” ao retardar a execução de bolas paradas e foi especialmente nestes momentos que os adeptos “fozenses” se fizeram ouvir de forma, no mínimo, criativa. Organizados e em coro, a claque da equipa da casa, ao ver que o guarda-redes ultrapassava largamente o tempo legal para a realização do pontapé de baliza, começou a contar os segundos que o mesmo levava a repor a bola em jogo.

Além de caricata, a intervenção dos adeptos foi eficaz. O guarda-redes Rui Diogo, pressionado pela contagem do tempo a ecoar por todo o estádio, começou a apressar-se na reposição da bola gerando alguma boa disposição (a possível, perante a situação) nas bancadas.

Nesta noite de regresso ao futebol com adeptos houve ainda tempo para a expulsão de Nuno Leal, jogador do FC Foz, aos 90 minutos, decisão que naturalmente, gerou muita exaltação e protestos na bancada da equipa visitada.

Apesar do apoio incessante dos adeptos caseiros, o Folgosa da Maia FC acabaria mesmo por conseguir segurar o resultado e sair do Campo de Jogos do Inatel com a vitória por 1-2.

Apesar do apoio das bancadas, o Foz acabou derrotado pelo Folgosa da Maia. Foto: Tiago Sousa

No rescaldo deste regresso dos adeptos às bancadas, Manuel Cordeiro, analista químico e membro da direção do FC Foz, reiterou a visão do presidente do clube: “Com certeza que fazia falta o regresso dos adeptos ao futebol”. O dirigente, que também acompanhou os jogos à porta fechada, vai mais longe: “O adepto é que dá vida ao futebol. O jogador, dentro de campo, se não tiver apoio não se sente em condições. Como vê, a bancada está quase cheia, imagine um jogo destes, da primeira divisão, sem ninguém. O jogador quando marca o golo quer virar-se para algum lado para festejar e sem adeptos era como se fosse sempre um treino”, comenta ao JPN.

Manuel Cordeiro mostrou-se muito confiante perante a adesão dos adeptos a esta reabertura das portas dos estádios porque, acredita, “o adepto está com muita fome de futebol, e não só, também tem fome de outros eventos.” Sobre a limitação de lotação dos estádios (33%), o vogal da direção do clube da Foz mostrou-se esperançoso “que a Direção-Geral da Saúde aumente a percentagem de adeptos que podem ver os jogos”. Entretanto, no dia 1 de outubro, foi anunciado em comunicado pela AF Porto que “a lotação dos estádios e pavilhões pode agora voltar a ser total (100%)”.

Depois de um ano e meio de portas fechadas, começa agora um novo ciclo na vida dos clubes. O convívio, as amizades, as alegrias, as tristezas tão próprias de uma ida ao estádio voltarão a fazer parte da vida social de milhões de adeptos.

Apesar do sabor da derrota, houve espaço para, no final do jogo, os jogadores aplaudirem voltados para a bancada, agradecendo desta forma o regresso dos adeptos ao estádio. O público retribuiu em força e os rostos tristes dos jogadores viram nesse apoio algum consolo e um embalo que, nos últimos meses, não existiu, mas que agora volta para, em princípio, tão cedo não voltar a desaparecer. O FC Foz perdeu, mas o futebol saiu o vencedor.

Artigo editado por Filipa Silva