Pela segunda vez no espaço de uma semana, os iraquianos voltaram a ver, na segunda-feira à noite, a sua Constituição ser suspensa. O prazo para a entrega do documento tinha sido estabelecido para 22 de Agosto, mas quando faltavam dez minutos para a meia-noite, foi decidido adiar a votação para dia 25, de modo a que haja tempo para resolver os problemas ainda em aberto.

O porta-voz do Parlamento iraquiano, Hajim al-Hassani, citado pela BBC, disse, na segunda-feira à noite, que, apesar da Constituição já ter sido entregue, faltavam resolver três questões essenciais: a definição de federação a formar, a maneira como vai ser feita a erradicação da influência dos membros do partido Baath (do antigo Presidente, Saddam Hussein) e a divisão de poderes entre Presidente, Parlamento e Governo.

O motivo para o novo adiamento é o impasse que se gerou entre a coligação xiita-curda e os sunitas, que eram o povo dominante no Iraque de Saddam Hussein e que ocupam agora uma minoria dos lugares do Parlamento. Apesar da Constituição poder ser aprovada sem serem necessários os votos dos sunitas, estes já ameaçaram fazer com que o país mergulhe em guerra civil caso sejam ignorados.

Os sunitas opõem-se a um projecto de federação porque temem ficar, assim, afastados dos lucros das reservas petrolíferas do país. Os curdos já têm uma região autónoma no Norte do Iraque, algo que não é posto em causa por ser já uma realidade. Mas, se os xiitas ficarem com o Sul, isto significa que aos sunitas resta-lhes um terreno maioritariamente desprovido de petróleo.

A questão do estado islâmico

Outra questão polémica foi a decisão inesperada, por parte dos norte-americanos, de não se oporem a um projecto de Constituição que envolva a lei islâmica (a Sharia), uma reivindicação dos xiitas, em oposição aos curdos que defendem um estado laico.

Em declarações à agência Reuters, um negociador curdo afirmou: “Ficámos a saber que os americanos se puseram ao lado dos xiitas. É chocante. Não encaixa com os valores americanos. Gastaram tanto sangue e dinheiro aqui, para depois apoiarem a criação de um estado islâmico.”

O envolvimento do Islão na Constituição significa que os direitos das mulheres e as liberdades civis passam a ser limitadas. Segundo a Sharia, as mulheres não recebem heranças em igualdade com os homens, não podem iniciar processos de divórcio e as provas que apresentem em tribunal valem metade das dos homens.

Se a Constituição for aprovada, o próximo passo vai ser um referendo em Outubro em que o documento será sujeito a votação por parte da população. A Constituição pode ser rejeitada se houver votos contra em três das 18 províncias por, pelo menos, dois terços dos eleitores. Os sunitas são a maioria em, pelo menos, quatro delas.

Caso o documento seja rejeitado, terá de ser estabelecido um novo prazo para a entrega de um novo projecto de Constituição. Se não se conseguir chegar a acordo sobre um novo projecto ou um novo prazo, o Parlamento é dissolvido e eleições convocadas.

Tiago Dias