Situado na rua de S. João, em plena Ribeira, famosa pelo seu comércio de bares nocturnos, um pub que funciona há vários anos no mesmo local, sem nunca ter registado nenhum problema de maior, apesar de sucessivas mudanças de arrendatários, foi vandalizado no passado dia 8 de Maio.

Arrendado há três meses, a nova inquilina de origem africana, que prefere manter o anonimato, refere que “o pub ainda não funciona a 100%”, porque “muita gente nem sequer sabe que está aberto”. Face às dificuldades de negócio, a arrendatária apostou em festas temáticas para os estudantes e em cativar um público de origem africana, que, segundo ela, “ainda não conhecia aquela zona da Ribeira”.

Com o negócio a crescer e o bar a ser frequentado por uma clientela maioritariamente de raça negra, menos habitual naquela zona, surgiram os primeiros problemas. Segundo refere a inquilina, os problemas começaram em Abril, altura em que os clientes começaram a ser insultados à saída do estabelecimento, o que chegou a motivar situações de violência verbal e física e uma participação na PSP.

Segundo a arrendatária, o responsável por esta situação e por efectuar ameaças racistas tanto à própria como aos clientes, é um vizinho que mora em frente ao pub. “Era o que faltava vir para aqui ‘pretos’ abrir um bar”, referiu a inquilina do bar, reproduzindo algumas das ofensas proferidas pela pessoa. A visada afirma que nunca levou em conta as várias calúnias e ameaças, atribuindo tais palavras “à ignorância” da pessoa.

As ofensas e ameaças foram aumentando e subindo de tom com o tempo. Depois das ofensas raciais, o alegado autor das ameaças “disse que ia entrar no bar e pôr fogo àquilo tudo”, refere a inquilina. Contudo, no dia 8 de Maio, na hora de abrir o estabelecimento, a arrendatária encontrou a porta de entrada vandalizada. “Rebentaram com uma fechadura, meteram cola e palitos nas restantes fechaduras e destruíram a janela de postigo da porta”, afirma. “A intenção era entrar no bar e destruí-lo”, entende.

Uma segunda participação na PSP, desta vez contra desconhecidos, foi apresentada nesse mesmo dia. Apesar de não ter havido testemunhas do incidente, as suspeitas recaem sobre a mesma pessoa que efectuou as ameaças. “A polícia afirmou que, perante a situação, suspeita mesmo que seja um caso de racismo”, salienta a inquilina. Todavia, não havendo testemunhas, a PSP informou que a queixosa tem seis meses para formalizar a queixa, no caso de ter a certeza do autor dos estragos.

Procurador do senhorio e presidente da ABZHP também foram alvo de ameaças

Alcino Branco, procurador do senhorio do espaço, também se viu envolvido no caso e recebeu ameaças por via telefónica do alegado vizinho. Contactado pelo JPN, Alcino Branco conta que “determinado indivíduo”, identificando-se como “morador da frente” do estabelecimento, lhe telefonou a ameaçar que “ia rebentar e queimar a porta do bar”, num telefonema cheio de “baboseiras e impropérios”, queixando-se também do barulho.

Sobre a reabertura do espaço, o procurador do senhorio refere que se reuniu com os condóminos do prédio e que “todos concordaram e aprovaram a reabertura do bar”. No final, Alcino Branco confirmou que já houve “agressões físicas entre clientes e esse senhor, depois da Páscoa”, concordando que se trata mesmo de um “conflito racial”.

António Fonseca, presidente da Associação de Bares da Zona Histórica do Porto (ABZHP), foi envolvido nesta história na última Assembleia da Junta de Freguesia de S. Nicolau. Em plena Assembleia de Junta, António Fonseca foi ameaçado e injuriado pela pessoa em questão. “Nunca me haviam insultado assim”, garante António Fonseca, salientando que vai apresentar uma queixa à PSP “devido aos insultos”. Segundo o presidente da ABZHP, o indivíduo terá proferido as ameaças por entender que a associação “estava a encobrir o caso”.

Relativamente à vandalização do bar, António Fonseca assinala que o motivo que terá levado a tais acções não se prende com o ruído, porque “naquela rua sempre houve barulho e nunca houve tamanha polémica”. Por isso, o presidente da associação afirma peremptoriamente que, a seu ver, a situação resulta de “uma atitude racista”.

Por fim, António Fonseca, acentua a preocupação da ABZHP com este caso, pois teme que “este tipo de atitude venha a agravar-se e a levar a violência gratuita”. O presidente mostrou-se, ainda, preocupado com a situação, pois “pode passar uma imagem negativa da zona”.

O JPN tentou localizar e contactar o alegado autor das ameaças, mas todas as tentivas se revelaram infrutíferas.