Pela sala, dezenas de sacos com mil e uma coisas, começam a dar sinais de excesso de carga. Com o início dos ensaios, os sacos tendem a esvaziar-se. Não guardam apenas o necessário para a actuação. As bailarinas têm de contar com tudo e, nos bastidores, os imprevistos são típicos “e acontecem sempre”, afirmam.

Andressa Oliveira, de origem brasileira, é bailarina há vários anos. Actualmente dança em Berlim, mas, por ser antiga aluna, foi convidada pelo Centro de Dança do Porto para actuar na Gala de Bailado Jovem, que teve lugar na Casa da Música a 1 de Novembro. Andressa traz sempre “sacos gigantes” que trazem “tudo”, uma forma de precaver-se para “possíveis imprevistos”.

O ensaio geral revela-se fundamental para detectar algumas falhas. “Pode faltar uma peça de roupa. Ou a vamos buscar ou improvisamos algo”, explica Joana Ferreira, que organiza este género de eventos há oito anos pelo Centro de Dança do Porto.

Enquanto responsável pelas alunas dos 4 aos 6 anos, Marta Macedo deparou-se com um imprevisto bastante caricato. Uma das suas alunas queria subir ao palco com umas meias roxas da Kitty por cima dos sapatos de pontas. “Fez birra”, explica a bailarina e professora, mas a equipa de produção lá a conseguiu convencer. Ou, pelo menos, pensou que sim.

“Quando a menina entrou em palco ia outra vez com as meias roxas calçadas e ninguém percebeu como. Obviamente, que depois de ela estar no palco já não se pode fazer nada, por isso toda a gente põe as mãos na cabeça e pergunta ‘como é que isto aconteceu?’ “.

Bastidores da cumplicidade

A cumplicidade entre as bailarinas é notória. Conhecem os seus estilos, limitações, movimentos, personalidades e os rituais que cada uma segue antes de cada espectáculo.

Os rituais traduzem-se em amuletos da sorte e hábitos de concentração que, tal como Andressa, explica “são manias dos bailarinos que acreditam que [estes objectos] podem trazer alguma sorte”. “Confortam o nervosismo de entrar no palco.”

A bailarina brasileira, por exemplo, tem de estar concentrada enquanto se maquilha. “Não gosto que as pessoas me interrompam, nem de falar com ninguém. Gosto de ficar sozinha, no meu canto, e é esse mesmo o meu processo de concentração para depois subir ao palco.”

Com vários anos de ballet, a união entre as bailarinas impera em todo o ambiente dos bastidores. Ao sentir um perfume de morango, Joana Tojal pergunta a uma colega se o camarim ao lado do seu era dela. Reconheceu o aroma que a bailarina usa em todos os espectáculos.

No fundo, são uma família. Os termos em francês, característicos do ballet, saem naturalmente das suas bocas. Falam dos seus corpos, cabelos, dos seus pares, das “brancas” que têm em palco e reconfortam-se nos piores momentos. “Estás linda!”, garante uma. “Não conseguia tirar os olhos de ti!”, segreda outra.