O Espaço Bloom deu-lhe oportunidade de, recentemente, apresentar uma coleção na London Fashion Week. Como é que foi essa experiência?

É parecido com o que se faz por cá. A diferença é que, quando se faz lá fora, não se tem um desfile como cá. Aqui temos um espaço onde todos fazem os desfiles com as mesmas manequins. Lá fora, o processo para fazer um desfile é ligeiramente diferente. Primeiro temos um casting. E depois há, também, outra atitude! Desde as pessoas que vão ver até à imprensa, nas próprias perguntas que fazem. As pessoas vão ver o desfile e depois vão-se embora para ver outros desfiles, que é uma coisa engraçada, porque em Portugal estamos sempre no mesmo espaço. Mas esta primeira vez serviu para experimentar e perder os medos que possam existir da ideia de apresentar lá fora. Deu para perceber as diferenças que poderão haver por não existir um contexto de moda tão forte em Portugal. Agora, quando eu chegar lá fora, já não vou estar tão desfasado do método de trabalho. Foi muito bom, a experiência foi boa.

Considera que o Espaço Bloom é uma oportunidade importante para os novos criadores?

É. Até há uns anos, o calendário de moda era muito fechado àqueles que já têm carreira e apresentam há quase 20 anos [risos] e, agora, com o Bloom, existe uma nova aposta nos jovens criadores. Na ModaLisboa existia o Sangue Novo, que está de volta nesta edição. Este relançar de pessoas novas ajuda a dinamizar e a criar uma nova identidade da moda portuguesa, que eu acho que estava um bocadinho perdida. E ainda está!

“Uma grande dificuldade foi ter que fazer a coleção no mês de agosto, porque está tudo fechado”

A coleção que apresentou foi criada no espaço de um mês. Esse imediatismo é importante no mundo da moda?

Não tão rápido, não é saudável. A minha cabeça não ficou muito bem, passado um mês [risos]. Foi assim porque eu não estava à espera. O convite foi feito, mais ou menos, um mês antes [da London Fashion Week] e eu ainda não tinha nada criado, concretamente. Tinha apenas algumas ideias, até porque eu faço outras coisas para além disto [da moda]. Mas não estava à espera. Normalmente, preciso de dois meses para fazer uma coleção, mas costumam ser mais pequenas – com cerca de 12 peças – e esta depois ficou maior. Uma grande dificuldade foi ter que fazer a coleção no mês de agosto, porque está tudo fechado no ramo da indústria têxtil. Portugal, em geral, no mês de agosto tira férias… [risos] Não me parece mal, mas, para quem precisa de trabalhar, é um bocadinho complicado. Mas nós temos sempre a noção de que de seis em seis meses é preciso apresentar uma coleção nova. Ou até com maior periodicidade, se apresentarmos coleções resort e tudo o que sejam pré-coleções. Mas, para quem é criativo, é importante pôr as ideias “cá fora” e avançar para as próximas, porque só depois de as concretizarmos é que conseguimos evoluir e dar o passo em frente, penso eu.

Considera que a moda é bem aceite na sociedade portuguesa?

Depende. Tem muito a ver com a ideia do que é a moda por parte das pessoas. Se a moda for vista como a roupa que se veste e que se compra, como as tendências, ou seja, uma ideia mais “levezinha” da moda, não é mal aceite. As pessoas gostam de comprar roupa e de consumir e, portanto, não está aí o problema. Pode estar, muitas vezes, em situações em que a roupa passa um bocadinho fora do padrão. Mas cá, em Portugal, é tudo muito recente e as pessoas, mesmo em relação ao Portugal Fashion e à ModaLisboa, vão lá ver e não querem saber muito do que se está lá a passar. Acham o evento giro, mas não percebem que a moda pode ter uma importância diferente daquele contexto em que parece estar inserida – coisa que lá fora não acontece tanto porque as coleções são vistas com outros olhos. Mas acho que isto é um processo de habituação… As pessoas vão começando a ver e os designers que estão a surgir agora vão mudar um bocadinho a perspetiva das pessoas. Além disso, eu acho que as entidades que promovem a moda estão a incentivar os criadores a desafiarem-se e a apostar nisso.

Distinções

Atualmente com 23 anos, João Melo Costa já esteve nomeado para os “Fashion Awards” e conquistou o segundo lugar no “Concurso de Jovens Criadores Portugueses”.

E acha que existe espaço para novos criadores apresentarem ideias diferentes?

Existe espaço para apresentar as ideias e depende muito da vontade de cada um de apresentar uma coleção. E, depois, existem entidades como o Portugal Fashion e a ModaLisboa que nos apoiam em tudo na apresentação das coleções. Isto é, a criação da coleção é apenas responsabilidade do designer, mas em tudo o resto – modelo e o desfile em si – eles ajudam, o que já é muito bom! Agora, se falarmos na moda real, ou seja, ter as peças no mercado e vender a roupa, isso não, não há. As pessoas não compram. Não vão comprar, pelo menos para já. Até porque o mercado é muito pequenino.

Fala do mercado português?

Sim, em Portugal. Lá fora é tudo muito diferente, não tem nada a ver… Aquilo que fazemos cá, lá fora continua a ter muita qualidade e é visto com uma ideia de “posso comprar aquilo”. Em Portugal não. Mas eu percebo, não há dinheiro para comprar e aqui não há essa cultura de ir às lojas de rua, por exemplo, ou comprarem a criadores nacionais.

“Ficar no papel de quase ‘pedinte’ é super desagradável”

Temos de fazer a questão clichê: Como é que funciona o financiamento das suas coleções?

Assim que acabei o meu curso, na fase inicial, encarei tudo como um investimento. Eu não queria partir logo para um mestrado, porque me queria conhecer melhor enquanto criador e, então, decidi trabalhar e investir naquilo que gosto para ter um domínio criativo mais forte e mais seguro. A parte do lucro financeiro não era a minha prioridade, até porque eu tinha medo de sentir que tinha de fazer dinheiro com as minhas coleções e, posteriormente, isso condicionar o meu processo e o produto final. Mas ajuda muito o dinheiro que se poupa desde pequenino [risos]: o dinheiro de comunhões e dessas ocasiões, que agora percebo que deu muito jeito. E, depois, também se fazem outros trabalhos e tenta-se arranjar dinheiro de alguma forma, até vendendo algumas peças. Mas não é uma prioridade.

Mas existem patrocínios? Empresas que financiam?

Existem algumas empresas que fazem patrocínio. Eu, normalmente, não tenho muita sorte. [risos] Não sou desses sortudos, porque não tenho assim muita lata para pedir. Até porque me faz confusão… Aliás, não me faz confusão! Acho que era muito simples, para muitas empresas que têm um volume de negócios gigante, patrocinar. Iam-nos ajudar muito e são coisinhas pequenas para eles. Mas ficar no papel de quase “pedinte” é super desagradável. E mais vale uma pessoa fazer um bocadinho de esforço e pagar tudo aquilo que compra e de que precisa do que estar, muitas vezes, a fazer esse papel super desagradável. Pronto, tentar ao máximo. Até porque eles, nas empresas, têm muita dificuldade em vender-nos quantidades muito pequenas de tecido ou do que quer que seja. É tudo em quantidades muito grandes. Essa, por acaso, é uma das maiores dificuldades: arranjar materiais, porque não nos querem sequer vender. Eu percebo, eu percebo toda a gente [risos]. Mas, às vezes, podiam facilitar de alguma forma e não iriam ter muito prejuízo, penso eu.

De forma a divulgar o vosso trabalho, acha importante participar nos concursos, como foi o caso do “Concurso dos Jovens Criadores”, ou até a nomeação para os “Fashion Awards”? Acha que tudo isso é importante para divulgar os novos criadores?

É importante e são essas pequenas coisas que vão chamando à atenção de uma ou outra pessoa, que vai começando a acreditar no nosso trabalho. Principalmente quando esses concursos têm ligação, por exemplo, para entrada no Portugal Fashion ou na ModaLisboa. Os prémios também ficam bem na “fotografia”… E esses concursos são muito bons para criar uma imagem das pessoas e pela experiência que se guarda. Mas o que as pessoas também têm que pensar é que, num concurso, a avaliação de moda é uma coisa difícil de fazer e muito subjetiva. Por isso, receber prémios e ganhar o que quer que seja não pode ser, de todo, a prioridade. O que interessa mesmo é fazer o trabalho.