Maria Emília Costa fez parte da equipa que fundou o Serviço de Consulta Psicológica da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP), em 1981. Em quase 40 anos de história, as instalações mudaram de sítio, aumentaram na área, na população servida e na abrangência dos serviços prestados, até porque, explica a responsável ao JPN, “no início era só a consulta psicológica de apoio”.
Hoje, o Serviço funciona no Pólo Universitário da Asprela e conta com uma estrutura considerável para dar resposta à procura. De acordo com os dados fornecidos pela instituição, só em 2018 foram feitas mais de 12 mil consultas no local.
“O Serviço teve sempre dois objetivos: por um lado, um serviço destinado à comunidade – que inicialmente era gratuito – e, por outro, a formação dos estudantes, pré e pós-graduados”.
Ao nível da aprendizagem, o acesso dos estudantes ao Serviço dá-se no 4º ano do Mestrado Integrado de Psicologia. Se o utente consentir, o aluno observa a consulta feita por um docente e toma notas.
Quem procura o Serviço
O perfil de quem procura atendimento é variado. Vai de pessoas com um “nível socioeconómico e cultural elevadíssimo, até as pessoas de um nível socioeconómico e cultural mais baixo. Desde idosos até aos bebés. Qualquer pessoa pode recorrer aos serviços. Qualquer tipo de idade, com qualquer tipo de problema. Estamos abertos a isso”, explica Maria Emília Costa.
A diretora do Serviço destaca que a maioria dos casos que ali chegam são de depressão e níveis de ansiedade elevados. “Tudo isso é frequente”, diz, juntando a estes na lista dos problemas mais comuns “as perturbações alimentares, as dificuldades de aprendizagem, as dificuldades em termos de escolha profissional e escolar também”.
As unidades de consulta mais procuradas são a de Crianças e Adolescentes e a de Jovens, Adultos e Idosos, que foram também as primeiras a entrar em funcionamento.
Dentro desta segunda unidade, há consultas de Orientação vocacional, Psicoterapia, Terapia de casal, Terapia familiar e até uma direcionada aos casos de infertilidade.
Há também uma unidade de consulta dedicada aos comportamentos aditivos, que abrange todos os tipos de dependência (incluindo a dependência da internet), uma Unidade de Avaliação Psicológica de Condutores e um Gabinete de Estudo e Atendimento a Agressores e Vítimas (que abrange todo o tipo de violência) e consulta de intervenção precoce, que é um dos poucos a nível nacional.
Lista de espera “muito grande”
Mesmo com um espaço físico considerável, são necessários alguns desdobramentos da gestão para dar vazão aos atendimentos. Como Maria Emília Costa explica, são “imensas áreas de intervenção e poucos gabinetes. Além de termos uma lista de espera no momento muito grande“, conclui.
Só na unidade de consulta direcionada ao atendimento de Jovens, Adultos e Idosos, 40 pessoas aguardam por atendimento, entre famílias, casais e consultas indivuduais.
Os motivos para a existência de listas de espera giram em torno da disponibilidade dos psicológos e do espaço físico. Muitas vezes é difícil equilibrar as obrigações da docência com as consultas do Serviço.”Queremos dispor de mais tempo para dar mais consultas e para desenvolver ainda mais o serviço”, conclui Maria Emília Costa.
O aumento da procura reflete-se no aumento dos dias de funcionamento também. Se no arranque do serviço, o sábado era considerado um dia excecional para o atendimento de utentes, com o aumento da procura, este dia passou a fazer parte da agenda e hoje são feitas consultas até às 13h00 da tarde. O alargamento do período de atendimento teve também outro propósito: “muitas pessoas não querem levar para o trabalho uma declaração de que vieram ao psicólogo”, conta a diretora do Serviço.
“A grande carga de trabalho é das 16h00 em diante e aos sábados de manhã”, acrescenta a psicóloga. Durante a semana, “as manhãs estão praticamente vazias, porque ninguém quer vir de manhã”, afirma.
Graça Silva é psicóloga clínica no serviço da FPCEUP há 20 anos e dá consultas a jovens, adultos e idosos. No caso dos idosos, cada vez mais pessoas desta faixa etária procuram ajuda psicológica o que resulta, em primeira instância, do envelhecimento acentuado da população portuguesa.
Já alguns jovens, procuram os serviços da FPCEUP com problemas relacionados sobretudo com a autoestima, as relações interpessoais e de motivação. Casos muitas vezes relacionados também com as redes sociais. “Já há reflexos vários ao nível da autoestima, nas raparigas sobretudo, que veem muito mais esta parte mais física e do like: se eu tenho 200 likes à partida sou muito mais cool do que se tivesse só 100”, refere Graça Silva.
A falta de empatia é um dos problemas com que se defrontam alguns alunos quando chegam à Academia. “Os alunos chegam muitas vezes à universidade sem esse tipo de partilha. Porque, do ponto de vista intelectual, penso que os alunos já são muito puxados mas a parte emocional é que precisa de ser desenvolvida”, sublinha.
Pela experiência da psicóloga, o serviço da FPCEUP é conhecido sobretudo através do passa a palavra entre pessoas que já frequentaram os consultórios: “Neste momento, só atendo pessoas que são remetidas para mim, porque esteve aqui a prima, o amigo do amigo… Muitas das pessoas chegam pelos docentes e pelos próprios alunos. Isto funciona em rede, mas não de uma forma muito formal”, conclui ao JPN.
O Serviço de Consulta Psicológica da FPCEUP é aberto a toda a comunidade académica, mas vale a pena destacar que os estudantes da casa, em busca de apoio psicológico, não são atendidos neste serviço, mas antes num específico, por uma questão de privacidade.
Ao nível financeiro, o serviço tem uma gestão independente. As consultas têm um valor de 30 euros, mas uma pessoa que apresente justificação credível (de desemprego ou de dificuldades económicas comprovadas), paga um valor residual.
Grande parte dos psicólogos que atendem na clínica são docentes, mas não recebem salário pelos atendimentos. O valor das consultas é revertido para o pagamento das despesas com funcionários (duas secretárias, três técnicas e outros colaboradores); alunos bolseiros e outras despesas de funcionamento.
Dentro da Universidade do Porto existem outros serviços de apoio psicológico, em faculdades como as de Economia e de Medicina, ou ainda nos Serviços de Ação Social, sendo estes, contudo, exclusivamente vocacionados para a comunidade académica.
Artigo editado por Filipa Silva