Cerca de 25 estudantes da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) manifestaram-se na última terça-feira, 6 de outubro, em frente ao edifício da Reitoria, contra o aumento das propinas de mestrado aplicados no corrente ano letivo naquela faculdade.

Debaixo de chuva, os jovens organizaram-se para questionar a instituição: será que a informação sobre o aumento foi devidamente publicitada? E esses aumentos serão mesmo necessários dentro do cenário crítico em que o país se encontra? Os estudantes querem que o Conselho Geral da Universidade do Porto reverta a decisão da FCUP.

Em causa estão os aumentos decididos pelo Conselho Executivo da faculdade, ainda em 2019, para 29 dos 34 mestrados da instituição. Para a maioria desses mestrados (23) foi definido um aumento de 50 euros na propina anual, mas em seis mestrados, considerados “altamente técnicos” e muito concorridos, o aumento da anuidade foi de 375 euros. Isto para estudantes nacionais, porque para os internacionais os aumentos foram bem mais significativos, chegando aos 1312 euros para os estudantes oriundos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e aos 1687,50 euros para os demais.

Joana Castro é estudante do Mestrado em Biologia Celular e Molecular, um dos seis mestrados que este ano sofreram um aumento mais significativo. Ao JPN, contou que os alunos já tomaram várias iniciativas para que a situação seja revertida. A petição pública entretanto lançada na tentativa de sensibilizar a faculdade a retroceder na decisão de aumentar as propinas conta com mais de 1.200 assinaturas. Além disso, enviaram uma carta à diretora da FCUP com o apelo formal dos alunos no mesmo sentido da petição: “Somos pessoas reais, com famílias reais, que não conseguem suportar estes aumentos”, afirmou a estudante ao JPN.  

De acordo com Joana Castro, o próximo passo  é fazer um levantamento da quantidade de alunos e de quem são os alunos que estão com dificuldades em pagar as novas propinas e permanecer no curso.

A 2 de outubro foi aprovado no Parlamento um projeto de lei do PAN, na generalidade, que limita a alteração do valor das propinas dos cursos técnicos superiores profissionais, bem como dos mestrados e doutoramentos, a meio das formações. Em declarações ao JPN, Jéssica Lopes, 23 anos, também estudante do Mestrado de Biologia Celular e Molecular, lamenta que a iniciativa legislativa só tenha sido aprovada agora. Uma das críticas dos estudantes da FCUP é justamente a alteração do valor a meio do ciclo em que se encontravam.

Sobre isto, na nota que a Universidade do Porto fez chegar à Imprensa, a instituição diz estar “legalmente impedida de aplicar valores de propinas diferenciados entre alunos do mesmo curso”. “Não é possível aplicar valores diferentes para estudantes de primeiro e de segundo ano, pelo que qualquer atualização de valores tem obrigatoriamente que ser aplicada por igual a todos os estudantes”, refere a UP no comunicado.

Na mesma nota, a UP refere que a decisão do Conselho Executivo da FCUP de aumentar as propinas nos mestrados foi homologada pelo Reitor da Universidade do Porto ainda em dezembro de 2019, antes da existência de sinais de pandemia. Argumenta ainda que o aumento se fundamentou na “necessidade de acompanhar os crescentes custos de realização destes cursos”, que classificou como “altamente técnicos”, e cuja propina não era atualizada “há vários anos”.

Gabrielle Lacerda viu a sua anuidade aumentar em 87%. Foto: Pamella Davis

Entre esses, estão os mestrados em Bioinformática e Biologia Computacional, Biologia Celular e Molecular, Ciência de Dados (Data Science) ou Segurança Informática.

Para o próximo ano letivo – 2021/2022 – está suspensa “qualquer proposta de aumento de propinas” na UP, mas em relação ao ano presente, a instituição nada refere.

A situação é particularmente sensível para estudantes como Gabrielle Lacerda, estudante brasileira no segundo ano do Mestrado em Biologia Celular e Molecular, que foi “surpreendida” no ato da matrícula com o aumento de 87% na sua anuidade, o que, garante, coloca em causa não só a sua continuidade na universidade como também no país.

Na manifestação, além de alunos, encontrava-se também Renata Freitas, professora da Licenciatura em Ciências do Meio Aquático, da FCUP, e Investigadora no I3S, em solidariedade com os estudantes. Preocupada, a professora salientou a necessidade cada vez mais premente de uma formação superior completa ao nível do mestrado para a inserção no mercado de trabalho e ainda ressaltou as dificuldades que muitos estudantes enfretam diariamente para pagar despesas como propinas e alojamento, dando o exemplo de uma aluna sua: “está a viver de favor na casa de uma pessoa, porque os pais não moram cá, tem que trabalhar no shopping nos tempos livres e mesmo assim consegue atingir notas altíssimas. É uma pessoa que neste momento em vez de estar no laboratório a trabalhar na tese, está aqui, porque o futuro dela está em risco. Ela não pode mesmo pagar esse aumento”, testemunhou.

Artigo editado por Filipa Silva