Uma peça "lúdica", da autoria de Jacinto Lucas Pires e encenada por Jorge Pinto, "Aberto 24 Horas" chega ao Porto e fica em cena no bar Pérola Negra até 2 de julho. O JPN conversou com o encenador para entender a origem do espetáculo e o enredo de pura "fantasia".

Para o encenador Jorge Pinto, nesta peça reina a “fantasia”, a partir da qual se forma “um submundo que nunca existiu em lado nenhum”. Foto: João Fitas/Ensemble de Actores

É com o som de uma moeda a rodopiar que os espectadores entram no “bar do submundo” que dá nome à peça escrita por Jacinto Lucas Pires: “Aberto 24 Horas”. Em pouco mais de uma hora, é contada uma história sem uma época temporal definida, em que o drama, o amor, o insólito e o humor estão lado a lado. Uma coprodução de Ensemble – Sociedade de Actores e da Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão, o espetáculo vai passar esta quarta-feira (15) pelo espaço noturno portuense Pérola Negra, onde vai ficar até 2 de julho.

Jorge Pinto, o encenador e cenógrafo da peça, convidou Jacinto Lucas Pires, autor que “conhece muito bem” e cujas obras aprecia, para escrever “Aberto 24 Horas”, refere ao JPN. “Queremos uma coisa que saiba a Jacinto”: foi este o pedido do encenador. Inicialmente, o autor pretendia fazer uma espécie de “musical do submundo”, mas, segundo Jorge Pinto, esta peça vai para além desse submundo.

A peça estreou-se no fim de semana de 11 e 12 de junho, na Casa das Artes de Famalicão, que Jorge considera “o grande teatro fora do Porto e Lisboa”. A ideia de ir para o Pérola Negra, no entanto, surgiu no “meio do processo” de preparação para o espetáculo.

Apesar de “o essencial no tema” ser “rigorosamente o mesmo”, os espetáculos são “claramente diferentes” a nível visual nos dois espaços. Tratando-se a Casa das Artes de um centro cultural, Jorge Pinto admite ao JPN que se tinha de “projetar” um bar e elevador para a peça, algo que não é necessário no Pérola Negra: “o mundo que queremos criar no palco, ali já está criadíssimo”, tendo-se apenas de “respeitá-lo”. “Não interessa se se chama Pérola Negra, se se chama Aberto 24 Horas. É inevitável, já cá estamos”, reitera o encenador.

A peça estreou-se no fim de semana de 11 e 12 de junho, na Casa das Artes de Famalicão. Foto: João Fitas/Ensemble de Actores

Enquanto o espetáculo no Porto apresenta apenas os cinco protagonistas, a demonstração na Casa das Artes de Famalicão apresentava mais 21 figurantes, que Jorge Pinto descreve como uma “espécie de bactérias” e são, na verdade, estudantes do 10.º ano da ACE Escola de Artes Famalicão. Ao ver que esta turma era “absolutamente extraordinária”, com uma “média intelectual elevada” e com pessoas “muito interessadas” pelo teatro, decidiu “arriscar o que nunca se arriscou” e fazer uma FCT (Formação em Contexto de Trabalho), acabando a turma por fazer parte do espetáculo. “Não me teria passado pela ideia se não fosse aquela turma”, conta ao JPN.

Devido às diferenças entre os espetáculos de Famalicão e do Porto, Jorge Pinto refere que lhe dará “gozo” ver o que várias pessoas que assistiram ao espetáculo na cidade de Braga acharão da peça no Pérola Negra.

Uma peça de pura “fantasia”

Sem ter um “propósito formativo”, a peça é considerada por Jorge Pinto como “lúdica” e até “teatro infantil”, onde reina a “fantasia”. É a partir desta “fantasia” que se forma “um submundo que nunca existiu em lado nenhum e que não passa disso”, diz.

O encenador relaciona esta ideia com o Pérola Negra, que passou de um bar de striptease e de cabaret para uma discoteca que se quer “polo musical dinâmico”, em 2016. Fá-lo ao explicar que existe um “nível de fantasia” sobre o que se passou neste espaço, que Jorge Pinto admite ser “muito mais extraordinário do que o que [realmente] aqui se passou.”

Com uma linguagem (e humor) “atual, urbana, contemporânea”, vestido de roupas modernas e outras antiquadas, a peça parece juntar o passado e o presente. Contudo, o facto de alguns aspetos mais caraterísticos “dos últimos 20 anos”, como o telemóvel, não estarem presentes, não significa que “não seja hoje” a ação da história. “O tempo pode ser este e pode ser há pouco tempo”, diz o encenador.

Todas estas caractéristicas conferem à peça um enredo e cenário envolventes e singulares. Num “bar estranho” e escuro, mas simultaneamente vivo, encontram-se cinco “habitantes permanentes” do Aberto 24 Horas, considerados por Jorge Pinto como “personagens possíveis” que parecem reais. Emerge, em primeiro lugar, Horácio (interpretado por Daniel Silva), um homem cuja ocupação ninguém sabe e que “tenta sacar dinheiro às pessoas para uma jukebox”, como refere o encenador, serve como o narrador da história, começando por um monólogo.

Contudo, esta figura não ofusca as restantes personagens que o público poderá conhecer e desvendar ao longo do espetáculo. São estas Miami (Joana Africano), a dona do bar, que se interessa pelas “duas margens sexuais” e, à semelhança da cidade norte-americana, é simultaneamente “escaldante e fresca”, como é dito na própria peça; Fernandes B (Tiago Araújo), um revolucionário cuja noiva o abandonou; Muralhas (Pedro Mendonça), um homem que sonha ser “campeão de snooker” e, por fim, Redeboredo (Pedro Galiza), um engenheiro casado que “passa aqui [no bar Aberto 24 Horas] a vida toda”.

O ambiente do bar muda completamente assim que chega uma “mulher bomba” chamada Brigita, que causa uma “erupção dentro do Aberto 24 Horas”, explica Jorge Pinto. Apesar de não existir fisicamente e de ser apenas falada pelas outras personagens, esta figura feminina não deixa de ser uma personagem absolutamente marcante na peça. Cada vez que ouvem os suspiros de Brigita, em plano de fundo, os protagonistas, completamente enamorados pela sua aparência, entram num momento de êxtase.

Esta história intrigante passada no (fantasioso) bar Aberto 24 Horas pode ser vista, de segunda a sábado (exceto nos dias 16, 23 e 24 de junho), às 19h, no espaço noturno Pérola Negra, onde fica até dia 2 de julho. Os bilhetes têm o preço de 10€, podendo ser reservados através do e-mail [email protected] ou reservados no balcão do espaço.

Artigo editado por Tiago Serra Cunha