Esta segunda-feira (13), na reunião do Executivo Municipal do Porto, a problemática do consumo de droga na cidade e da insegurança que os moradores sentem voltou a ser discutida.
O assunto surgiu com a proposta do Bloco de Esquerda de criar um fórum de debate que abrangesse as várias entidades envolvidas e afetadas, desde associações a moradores. A ideia consistia em desenvolver um espaço para sugerir medidas, retomar propostas e discutir, de forma geral, o problema do uso de droga na via pública.
“O Estado tem que entrar em jogo”, afirma Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, em resposta à proposta. O autarca reafirma que, seja um problema de saúde pública ou de segurança social, a obrigação municipal foi cumprida: “Fizemos tudo o que está ao alcance da Câmara fazer”.
Insegurança nos bairros portuenses
Desde o final do ano passado, a problemática da toxicodependência e do consumo nas ruas da cidade têm recebido cada vez mais atenção. O ano 2022 foi marcado pela realização de 1850 ações policiais e a detenção de mais de 400 pessoas por posse ou tráfico nos bairros de Pinheiro Torres e Pasteleira Nova, segundo dados do Jornal de Notícias.
De acordo com declarações de Eduardo Silva, comissário da PSP, à Lusa, existe o entendimento de que esses bairros são um foco de tráfico e “é por isso que grande parte do policiamento é centrado” nas zonas. Nesse sentido, no início de janeiro deste ano, a Polícia Municipal do Porto levou a cabo uma operação de limpeza de um acampamento de consumo e tráfico na zona da Pasteleira, a fim de tranquilizar os moradores.
Apesar da presença das autoridades, a situação persiste. Assim, a 16 de janeiro, a Câmara Municipal do Porto aprovou uma recomendação para o governo com um apelo à criminalização do uso de drogas na via pública, como forma de conter o problema que afeta várias áreas da cidade.
Também a insegurança sentida perto do bairro da Pasteleira permanece, com as principais queixas a recaírem sobre assaltos a viaturas, consumo e venda de droga nas ruas. Como tal, no início de fevereiro deste ano, a Associação de Moradores do Bairro das Condominhas contratou dois guardas-noturnos – cuja presença é assegurada por uma quota mensal de 20 euros de cada membro da associação. Sobre o assunto, Cristina Bacelar, uma das fundadoras, sublinhou, em declarações ao Jornal de Notícias, que considera inadmissível que “tenham de ser os moradores a fazer turnos para que exista o mínimo de segurança”.
Também no início de fevereiro, durante uma entrevista à SIC Notícias, Rui Moreira reforçou o apelo à ação do governo, referindo que a polícia municipal “não pode intervir na proteção e segurança dos cidadãos”. Realça que o clima de insegurança se tem agravado e que, no seguimento do desmantelamento do acampamento em janeiro, são cada vez mais os edifícios devolutos que têm sido ocupados por toxicodependentes.
Mais ainda, o autarca afirmou que “não há meios nem vontade política em tratar disso”, aludindo ao facto de, no ano de 2022, serem reencaminhadas para o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) “metade das pessoas”, comparativamente a 2015.
O que dizem as associações de consumidores?
No início deste mês, uma carta aberta dirigida a Rui Moreira (publicada no jornal Público) foi assinada por associações, profissionais de saúde e investigadores, a propósito do apelo à criminalização do uso de drogas.
No documento é mencionada a falta de “albergues na cidade que acolham as necessidades específicas das PUD [Pessoas que Usam Drogas]”. É igualmente referido o facto da criminalização do uso de drogas ser apresentada como uma forma de dissuadir o recurso a estruturas de apoio social e de saúde.
Uma das associações que assinou a carta aberta foi a CASO – Consumidores Associados Sobrevivem Organizados. Rui Coimbra, presidente da entidade, admite ao JPN que são solidários com os moradores dos bairros do Porto e que “ninguém gostaria de ter um grupo de pessoas a usar drogas à porta de casa”.
Ainda assim, a CASO considera que a generalidade das declarações feitas por Rui Moreira “criam uma ilusão” que distorce a realidade dos consumidores de rua. Para Rui Coimbra, o utilizadores têm sido retratados sob uma imagem “exibicionista” para chocar e provocar pessoas.
O presidente do grupo critica Rui Moreira pela “toma de uma das partes”, que significa uma “perda de independência e neutralidade” na gestão do problema. “As pessoas não consomem na rua porque querem. Quem tem casa consome em casa”, completa.
Uma das propostas da autarquia portuense para combater o uso de drogas foi a abertura de uma sala de consumo assistido no bairro da Pasteleira. Sobre o assunto, Rui Coimbra não nega a eficácia do projeto, contudo considera que “não se pode esperar que uma gota de água de resposta possa responder a toda a problemática que aquela zona da cidade tem”. Desta forma, o presidente da CASO volta a insistir na necessidade de serem criados abrigos para albergar consumidores em circunstâncias difíceis.
As críticas estendem-se às ações do governo. Rui Coimbra considera que a extinção do Instituto das Drogas e Toxicodependência, em 2011, tornou a situação mais difícil de ser gerida. Distribuir responsabilidades entre o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) e as Administrações Regionais de Saúde (ARS), impossibilita um “diálogo direto” e dificulta a resolução de problemas, conclui o presidente da CASO.
Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira