No Dia Internacional da Pessoa Cigana (8), a companhia de teatro Visões Úteis apresenta no Cinema Batalha a Listening Party do àlbum "ZHA! É a nossa vez!”. O álbum é o resultado de encontros comunitários de cocriação e ciclos de oficinas feitas em 2023 nos bairros do Lagarteiro, Contumil e do Cerco. Reúne temas originais, dos artistas e músicos que participaram nestes encontros, muitos deles autodidatas. Inês Carvalho, diretora artística do projeto, falou sobre ele com o JPN.

Integrado no projeto “ZHA!”, o CD que reúne talentos da comunidade cigana e outros artistas vai ser apresentado esta segunda-feira (8) no Batalha, às 21h15. O álbum é uma celebração de meses de trabalho de campo com a comunidade cigana.

Intitulado de “ZHA! É a nossa vez!“, o trabalho inclui oito temas originais e três videoclipes que refletem o trabalho de jovens e adultos de etnia cigana e é o resultado de um projeto que mistura sensibilização, história, dança, voz, instrumento, interpretação, styling, som e imagem, comunicação, edição e criação.

A arte aqui assume-se como fator de mudança e preocupa-se em promover tradições e o património das comunidades ciganas. Inês Carvalho, diretora artística do projeto, afirma que a comunidade cigana tem “uma vivência artística muito forte. Está embrenhada no seu quotidiano, mas raramente se torna visível fora do seu território e da sua comunidade”. E daí a necessidade de fazer nascer o ZHA!, para que essa cultura se expanda e ganhe representação, conferindo-lhe outra “visibilidade e outra dignidade também”, conclui em declarações ao JPN.

Iniciado o projeto em 2022, o plano artístico e social do Visões Úteis inclui um CD, três videoclipes, e um futuro espetáculo e documentário. O encontro de hoje no Batalha, além de servir para apresentar o CD, vai ter também um ciclo de conversas e momentos de partilha entre todos os intervenientes do projeto, desde os artistas da comunidade, os artistas profissionais, ciganos, não ciganos, educadores sociais, formadores e entidades participativas no projeto.

Juntamente com a Fundação Calouste Gulbenkian e a Fundação La Caixa, o “ZHA!” está incluído no programa Art For Change. Iniciado em 2022 e com fim previsto este ano, o projeto é um casamento entre a “dimensão artística e uma dimensão social”, afirma Inês Carvalho. E, portanto, os resultados e impactos são desejados e trabalhados a estes dois níveis.

O projeto realça sobretudo as principais componentes que preenchem o universo cigano: a dança, a música, o canto. Numa fase inicial, começou por ter uma série de oficinas de criação nos bairros do Lagarteiro, Contumil e do Cerco, fosse criação de histórias, criação em dança, oficinas de voz e instrumento e oficinas de gravação e edição. Nesta segunda e última fase, surge o culminar dessas criações e experimentações, ou seja, o lançamento e escuta do álbum hoje, um futuro espetáculo no Rivoli em junho e o documentário a estrear no fim do ano.

Ao longo destes dois anos, a ligação entre os responsáveis e a comunidade tornou-se inevitável. Trabalhando com a comunidade cigana, tiveram a oportunidade de acompanhar gerações da mesma família e a mudança e o crescimento de muitos dos membros dessas mesmas famílias.“Isto é uma das questões que nos encanta mais, para além da qualidade artística, mas esta força das famílias, da comunidade, desta passagem de conhecimento e o respeito imenso pela ancestralidade”, afirma Inês Carvalho.

Este aspeto é tanto gratificante como desafiante porque a vida de muitos dos que passam pelo projeto, muda rapidamente. Há a necessidade de constituir família desde cedo e isto provoca uma grande flutuação de pessoas que passam pelas iniciativas do Visões Úteis. No entanto, existem os encontros de flamenco, que permitem estar “em constante contacto e relação com as pessoas que também vão trazendo outras pessoas novas e revelam-se talentos incríveis pelo facto de estarmos lá com regularidade”, contrabalança Inês Carvalho.

“Bebendo das informações e das sensibilidades”, Inês Carvalho afirma que o impacto é real e sente-se diariamente. Sentiu sempre que foram bem recebidos, o que facilitou a permanência do trabalho nos três bairros. E há esta “permanência do continuar a estar” que acaba por não só tornar possível o reconhecimento por parte das comunidades, como proporcionar relações de afeto que agora dificilmente se desvanecem, “são para ficar”, como diz Inês. “Não vamos a lado nenhum”, sublinha.

Isto é algo que também suscita uma certa preocupação: “uma vez criada uma realidade” como se impede que não desvaneça? Como se deixam estas pessoas, depois de as acostumar a estes veículos de expressão e emancipação cultural? Como diz a diretora artística, não se deixa. E por isso, a equipa já está a pensar em como é que poderão “dar continuidade a estes encontros, dar continuidade a esta presença, a estas propostas”.

Inês Carvalho assume-se assim como artista educadora pois, para ela, a arte tem este papel de “transformação” e “revelação” que a torna “impactante se for transformadora”. Algo que pode ser obtido através ou da “contemplação” ou da “intervenção direta”. E, neste caso, neste projeto das Visões Úteis, será transformador se toda a arte cigana “for reconhecida na sua incrível qualidade e valor pela sociedade”, remata Inês.

A entrada para o evento é gratuita e exige apenas levantamento do bilhete previamente.

Editado por Filipa Silva