O 5.º Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias Psicoativas, publicado na quarta-feira, indica que os portugueses estão a ter mais comportamentos aditivos. Há mais portugueses a jogar a dinheiro, a consumir álcool e a fumar tabaco com mais frequência.

Houum “aumento significativo” nos hábitos de consumo das mulheres, alerta responsável do ICAD. Foto: Life of Pix/Pixels

O álcool continua a ser a substância psicoativa mais consumida em Portugal. De acordo com o Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias Psicoativas na População Geral, divulgado na quarta-feira, três em cada quatro pessoas entre os 17 e os 74 anos (75,8%) já consumiram álcool pelo menos uma vez ao longo da vida. o indicador tem-se mantido “estável” e barca três quartos da população.

Mais preocupantes serão, contudo, os resultados que medem o curto prazo. No inquérito, relativo a 2022, quando questionados sobre o consumo de álcool no último mês, 63,5% dos inquiridos tinham consumido álcool nesse período, um aumento de quatro pontos percentuais face a 2017. O inquérito é realizado pelo Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD) a cada cinco anos.

Ao JPN, Manuel Cardoso, vogal do Conselho Diretivo do ICAD, explica que o aumento dos padrões de consumo recentes são “mais preocupantes”. “A diferença [entre as percentagens de consumo ao longo da vida nos diversos estudos] é mínima; a prevalência é tão alta, que uma diferença mínima não é importante. O aumento do consumo no ‘último mês’ e no ‘último ano’ é que é muito grave, dão-nos ideia de quem está a consumir em permanência. A nossa preocupação não é o comportamento, é a influência e as consequências na saúde daquela pessoa e da comunidade que derivam daqueles comportamentos”, declara Manuel Cardoso. 

Joana Teixeira, presidente da Sociedade Portuguesa de Alcoologia, também frisa o risco para a saúde pública que implica o aumento do consumo: “O álcool é um dos poucos fatores de risco para a saúde que pode ser evitado. O que nós sabemos hoje é que não há uma quantidade mínima de álcool que seja considerada segura. Qualquer nível de consumo pode acarretar consequências para a saúde física e mental do indivíduo e também a nível laboral, familiar, social, etc.”, explica. 

No Norte, é onde se bebe mais álcool ao longo da vida, no último ano e no último mês, segundo o estudo. Joana Teixeira diz ao JPN que uma possível razão pode ser que “ o norte do país tem uma tradição de cultura e produção vinícola provavelmente superior ao resto do país”. “Normalmente, as regiões que produzem vinho estão relacionadas ao aumento do consumo da substância”, afirma.

O inquérito também refere que as prevalências de consumo entre a população geral são superiores entre os inquiridos do sexo masculino, independentemente da substância psicoativa considerada, exceção para os medicamentos”. Ainda assim, a diferença nos hábitos de consumo de álcool entre homens e mulheres é cada vez menor. O inquérito relativo a 2022 mostra que 81 mulheres, para 100 homens, admitiram consumir álcool. A aproximação do comportamento das mulheres face ao dos homens atingiu o seu ponto máximo em 2017: 91 mulheres para 100 homens.  

“É preocupante porque há mais pessoas a consumir. Vamos ter, seguramente, mais problemas de saúde. Estávamos habituados, em termos culturais, a que as mulheres consumissem menos. Houve um aumento muito significativo de mulheres que bebem e que têm padrões de consumo de risco”, afirma o vogal do ICAD.

Sobre o consumo de álcool por faixa etária, o inquérito indica que os portugueses entre os 15-24 anos são os que consomem menos ao longo da vida, nos últimos 12 meses e nos últimos 30 dias. 

O inquérito também apresenta resultados sobre os hábitos de consumo de outras substâncias, assim como dados sobre a participação em comportamentos aditivos. Segundo as estatísticas recolhidas pelo ICAD, os portugueses estão a consumir mais tabaco e a participar mais em jogos a dinheiro

O consumo de tabaco ao longo da vida passou de 48,8% em 2017 para 51% em 2022, em comparação com o 40% registado no primeiro inquérito em 2001. O consumo desta substância também é cada vez mais comum: no momento da recolha de dados, 31,9% das pessoas afirmou ter fumado no último mês, um aumento ligeiro em comparação aos 30,6% registados no estudo anterior. Manuel Serrano explica ao JPN que a percentagem cresceu não só por pessoas dependentes de tabaco, mas também por utilizadores esporádicos. 

Já entre as substâncias psicoativas ilícitas, a mais consumida é a canábis: 10,5% dos inquiridos já usaram pelo menos uma vez, enquanto aproximadamente 2% admitiram usar no último mês e no último ano. No que concerne aos medicamentos, 14,2% consumiram alguma vez sedativos, tranquilizantes ou hipnóticos. 

Por outro lado, 55,6% dos portugueses praticam jogos de fortuna ou azar, mais do que os 48,1% registados em 2017. O jogo a dinheiro mais popular entre os inquiridos é o Euromilhões, seguido pelas raspadinhas

“A prática de jogo a dinheiro está mais frequente, também nos mais novos. Uma coisa que nos preocupa são os jogos online, como os de casino ou de apostas, porque têm resposta imediata e se fazem em qualquer sítio e desde qualquer dispositivo. Também nos preocupa o jogo eletrónico e a dependência às redes sociais”, diz o vogal do SICAD. 

O inquérito foi realizado pelo Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa (NOVA FCSH) para o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), na sequência dos estudos realizados em 2001, 2007, 2012 e 2017. Foram inquiridas cerca de 12 mil pessoas entre os 15 e os 74 anos.

Editado por Filipa Silva