Irreverente. Determinado. Preparado. Trabalhador. Quando se fala de Fernando Alexandre, estas são algumas das palavras que evocam aqueles que lhe são próximos no meio académico. Afinal, quem é o novo Ministro da Educação?
Nasceu em 1972, em Ílhavo, distrito de Aveiro, mas passou a infância e a juventude na Figueira da Foz. Ainda antes de sonhar ser economista, despontou nele uma paixão pela ciência e pela biologia. Mesmo assim e, apesar do encanto pelos programas de Jacques Cousteau, rumou à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC).
Licenciou-se e terminou o mestrado com notas de excelência, dando já uns “toques” para um possível caminho político. José Reis, professor de Fernando Alexandre durante a licenciatura, recorda-o, dizendo que “foi sempre um aluno reto. Sempre muito formal e deixava entender que era um homem com uma carreira política como aquela que está a ter”.
O percurso daquele jovem aluno parecia já estar traçado. “Deixava entender que estávamos perante um estudante cuja trajetória seria no campo da educação”, disse o antigo diretor da FEUC ao JPN. Foi entre os anos 1990 e 1998 que, o agora ministro, foi construindo a vida académica e não só, já que se casou e foi pai ainda durante o curso.
Logo após ter concluído a tese de mestrado, dedicada ao “Crescimento económico e as desigualdades de rendimento”, Fernando Alexandre soube da abertura de vagas para o Departamento de Economia da Universidade do Minho e decidiu concorrer. “O Fernando foi um dos entrevistados”, lembrou Paulo Guimarães, também ele economista e um dos responsáveis pela entrevista para o lugar.
“A econometria é aquilo que leciono já há muitos anos, que é a aplicação das técnicas matemáticas e estatísticas para tirar conclusões sobre a economia. E o Fernando destacou-se na entrevista precisamente, porque estava a dizer na cara de toda a gente que a econometria não servia para nada”, contou.
Paulo Guimarães, na altura, diretor do Departamento de Economia, relembrou que Fernando Alexandre não seguiu as tendências das entrevistas em que as pessoas tendem a “concordar com tudo o que se diz”. “Não tinha medo de dizer o que pensava para ir discutir, e achei piada a isso. Não do que ele dizia, mas da postura”, recordou entre risos.
E foi esta “irreverência” que contribuiu para que Fernando Alexandre fosse escolhido e contratado para professor assistente na Universidade do Minho. Todavia, a estadia pela cidade de Braga não se estendeu durante muito tempo. “O que fizemos na altura foi enviá-lo para uma boa escola no estrangeiro. Ele foi para Inglaterra”, lembrou.
Entre Londres e Portugal
Em setembro de 1999, Fernando Alexandre embarcou para Londres para fazer um doutoramento na Birkbeck College. Ao JPN, John Driffill, professor de Economia, especializado em Macroeconomia Internacional e Economia do Trabalho, e orientador de doutoramento de Fernando Alexandre, fala de um aluno “trabalhador e muito automotivado”. “Supervisionei a sua tese de doutoramento, que ele fez com muito sucesso e muito rapidamente, se bem me lembro”, recordou o professor.
Apesar de estar em Londres, a economia portuguesa já suscitava um interesse particular no jovem português. “Era um estudante de doutoramento muito interessado em desenvolver teoria e princípios económicos e em fazer trabalho empírico que fosse aplicável à economia portuguesa. Penso que ele sempre se interessou muito pela evolução económica e pelas políticas públicas em Portugal”, contou John Driffill.
Três anos depois e com um doutoramento concluído – uma dissertação sobre política monetária e mercados financeiros -, regressou à Universidade do Minho e ao Departamento de Economia. Mas desta vez com o propósito de se tornar professor agregado. João Sousa Andrade fez parte do júri durante este processo e conta que Fernando Alexandre sempre foi uma “pessoa aberta e a saber ouvir as outras pessoas”.
Apesar deste encontro na Universidade do Minho, João Sousa Andrade já conhecia o agora ministro da Educação de outras andanças. “Ele foi meu aluno. Era uma pessoa aplicada e, portanto, sabia o que estava a fazer, isto é, que tinha de estudar e trabalhar para prosseguir”, lembrou o professor da Faculdade de Economia de Coimbra.
Para João Sousa Andrade, a mudança da faculdade conimbricense para a minhota enriqueceu o percurso de Fernando Alexandre. “Acho muito bem que, quando uma pessoa faz curso numa dada universidade, se quer seguir a carreira académica, deva entrar numa outra. Faz bem a ele e à própria universidade”, afirmou.
Amor à camisola
É o “amor à camisola” que pinta o caminho traçado por Fernando Alexandre dentro da Universidade do Minho (UM). O antigo ministro da Economia de Passos Coelho, Manuel Caldeira Cabral, também ele da UM, acompanhou de perto este percurso, quase de forma literal, já que trabalhavam “duas portas” ao lado um do outro.
Trabalharam juntos enquanto professores e no Conselho Científico. Para Manuel Caldeira Cabral, o colega destacava-se pela sua “capacidade de formar uma boa equipa”. “Nos cargos em que o vi trabalhar – até na própria universidade – teve sempre a capacidade de trazer pessoas de qualidade e de as motivar e tê-las, de facto, focadas no que eram os objetivos que definia”, contou.
A participação ativa na política, surge, segundo Caldeira Cabral, quase como uma consequência do interesse pelas políticas públicas. “Não é tanto uma questão de vida política, é uma questão de participação cívica. Ou seja, é uma pessoa que se interessa pela sociedade, pelo país, interessa-se por estudar como académico, mas tem um interesse também de intervir”, explicou.
Para além de professor, Fernando Alexandre coordenou alguns trabalhos científicos, entre eles um livro intitulado “Economia Portuguesa na União Europeia: 1986-2010”. João Cerejeira, um dos autores, conta que este livro surgiu de uma colaboração entre investigadores de várias universidades do país e que a coordenação global ficou a cargo de Fernando Alexandre. Este trabalho demonstrou, segundo o professor do Minho, João Cerejeira, a “capacidade de grande liderança de equipas” do novo ministro da Educação.
Autor de vários livros, artigos científicos e reconhecido dentro da própria Universidade, Fernando Alexandre chegou a diretor do Departamento de Economia. A ambição de conseguir mais mostrou-se na “intenção de posicionar o próprio departamento como um dos melhores a nível nacional”, recordou João Cerejeira. No entanto, a par destes cargos, não deixou de parte o de professor.
“O professor é muito porreiro”
“O professor é muito porreiro”, responde de pronto Ricardo Rodrigues, um dos alunos de Fernando Alexandre. Que acrescenta: “É certinho, não gosta de barulho, mas é aquele professor que não precisa constantemente de dizer para estarem calados, porque as aulas são tão interessantes que toda gente já o está”, disse o aluno.
Para além disso, Ricardo Rodrigues confessa que, apesar de ser um professor que “impõe respeito”, é também muito próximo dos alunos. “Ele era muito próximo do associativismo, das coisas que os alunos faziam, dinâmicas e está muito por dentro de tudo ao nível das universidades”, contou.
Dentro das próprias aulas, Fernando Alexandre destacava-se, enquanto professor, por trazer exemplos concretos para a sala de aula. “Estávamos a falar de exportações e estávamos ainda numa altura ativa do Covid e ele tinha um diapositivo que mostrava num mapa os navios chineses que estavam parados. Enquanto víamos o mapa, ele ia explicando o impacto que aquilo tinha na economia”, lembra o aluno.
“É difícil escolher melhor”
As opiniões sobre o cargo que Fernando Alexandre vai agora ocupar são distintas entre os testemunhos recolhidos pelo JPN.
José Reis, professor da Faculdade de Economia de Coimbra, viu com surpresa e um pouco de “medo” esta nomeação. O que receia o antigo diretor da FEUC? “O medo não é pessoal, evidentemente. Quando vejo uma pessoa tão à direita tomar conta da pasta da Educação temo o pior – do ponto de vista político, entendamos.” Já Ricardo Rodrigues, aluno de Fernando Alexandre na Universidade do Minho, referiu que a “praia” de Fernando Alexandre é a Inovação e o Ensino Superior, considerando a escolha para este cargo como “expectável”.
Mesmo admitindo alguma surpresa em relação ao cargo e à pasta, Paulo Guimarães considera que “o Fernando é a pessoa certa. É difícil escolher melhor“. João Cerejeira partilha da mesma opinião, acrescentando que Fernando Alexandre “tem, quer a capacidade de perceber a gestão académica, porque já lá esteve, mas também a capacidade de perceber para que é que serve a academia nesta perspetiva e como funciona o sistema de inovação em Portugal, também numa ótica de leitura exterior”. Ao JPN, referiu ainda que “não é muito fácil encontrar pessoas que conjuguem estas valências”.
Dentro da Universidade do Minho, Fernando Alexandre foi professor, diretor do Departamento de Economia, presidente da Escola de Economia e Gestão e pró-reitor. Mais recentemente, em 2022, foi ainda condecorado com o Prémio de Mérito Científico da Universidade do Minho.
Para além destes cargos, o novo ministro da Educação era vice-presidente do Conselho Económico e Social, consultor na Fundação Francisco Manuel dos Santos, comentador da RTP e colunista dos jornais “Observador” e “Eco”. Este não é o primeiro cargo que Fernando Alexandre desempenha no Governo, já que foi secretário de Estado Adjunto da Administração Interna entre 2013 e 2015.
Editado por Inês Pinto Pereira