Aos 42 anos, Evan Roth é um artista plural. Graduado em Arquitetura, o norte-americano tem um mestrado em Belas Artes nas áreas da Comunicação, Design e Tecnologia. Já entrou pelo grafíti, pela fotografia e hoje anda a explorar as relações entre a arte física e a arte online.

Na sua mais recente exposição “Red Lines with Landscapes: Portugal”, Roth explora as paisagens costeiras portuguesas através de vídeos realizados com uma câmara de infravermelhos e põe-nas em contraste com pinturas naturalistas de paisagens de pintores portugueses como Silva Porto, Artur Loureiro ou Henrique Pousão – fornecidas pelo Museu Nacional Soares dos Reis. A curadoria é de Delfim Sardo.

“Algumas destas obras estão em exposição permanente no museu, mas outras disseram-me que provavelmente nunca iriam ser expostas. Então, há a oportunidade de algumas dessas pinturas terem vida fora do depósito. Talvez essa seja uma pequena vitória”, comentou o artista ao JPN à margem da visita de imprensa à exposição que abriu ao público no sábado.

Tecnologia e pintura em estreita relação na mostra. Foto: Renato Cruz Santos

A mostra está inteiramente disponível online, já que Roth é a favor das políticas open​ source e da livre circulação da arte, enquanto oportunidade de ter “uma experiência primária com uma obra artística em casa” sem a necessidade de investir um alto valor. Quem for ver a exposição, pode vê-la e levá-la para casa no telefone ou vê-la no ecrã de um computador.

Na opinião do artista, “poder conviver com os vídeos numa escala de tempo longa”, produz um efeito na forma como percecionamos a arte: “quando vês algo todos os dias e acordas todos os dias para isso, alguma parte de ti sabe se é algo que vale a pena perseguir ou se é um beco sem saída. Acho que ter a arte em rede como meio significa ter não só uma cópia em casa de uma obra existente, mas também uma peça primária para explorar”, disse, sem excluir a relevância da exposição em espaço físico como forma de apresentação do trabalho do artista: “Por exemplo, as pinturas aqui, os conjuntos com as pinturas, isso é algo que não sou capaz de reproduzir para todos em casa de graça, certo? Portanto, definitivamente há um benefício nisso”. Evan acredita que ir aos espaços expositivos é contemplar: “É quase como se a exposição fosse uma peça dessa experiência de visualização”.

Ecrãs e telas abrem janelas sobre a paisagem expositiva. Foto: Giulia Pedrosa

A escolha da costa portuguesa acontece por o país ser um dos pontos de partida dos cabos de fibra ótica subaquáticos que transmitem a internet entre continentes através dos oceanos, objeto de pesquisa do projeto que Evan Roth começou na organização artística Artangel​, em Londres, com o seu interesse pela infraestrutura da internet. Assim, o projeto explora o mundo online e a circulação de informação nas ondas transmitidas na superfície, através da internet sem fios, e nas ondas transmitidas abaixo do mar, através dos cabos subterrâneos.

Aos jornalistas, o norte-americano explicou que a escolha das câmaras de infravermelhos dá-se pelo tom sépia resultante nas imagens, que lhe lembra a arte clássica, o passado. Essa perspetiva de tempo é algo profundamente explorado na exposição, com constelações de vídeos atuais das paisagens costeiras em contraste com as pinturas que retratam a realidade no passado. A tecnologia diferencia a paisagem do quotidiano, através dos vídeos que vão do site de Evan Roth diretamente para o espaço expositivo, por meio de cabos expostos e próximos ao público, a dar uma ideia de circulação física da internet.

Foto: Giulia Pedrosa

Os vídeos acompanhados de pinturas foram capturados na costa portuguesa, contudo ao centro da exposição encontra-se um grande ecrã a passar vídeos capturados por Roth com infravermelhos ao longo dos anos em sítios ao redor do mundo, num total de 11 países: “alguns deles foram exibidos, outros não. Eles estão sempre online. Esse é o cerne do projeto: eu a construir a minha própria rede. Essa é uma parte essencial do projeto”, contou o artista.

As pinturas naturalistas expostas partem do movimento que tinha como principal lema retratar a realidade de forma fiel, através da observação e experiência, a mostrar que o homem é determinado pelo ambiente em que está inserido. Além de escolher as pinturas desse movimento para compor a sua exposição, Evan Roth experienciou essa observação fiel e entranhada na natureza por um longo tempo para a execução das filmagens. Foi a forma que encontrou para fazer parte e entrar em sintonia com a natureza de uma maneira diferente e inédita no seu percurso de trabalho.

Tela ao centro no átrio da Culturgest Porto. Foto: Giulia Pedrosa

Uma das grandes aprendizagens desse processo, explicou o artista, foi “pensar no tempo e em como estamos a passar por um tempo de aceleração”. Por oposição, na lentidão a que se obrigou no processo de produção, encontrou “alguma coisa” significativa. “Tenho relutância em dizer que é uma resposta para os problemas, mas é uma forma interessante de nos envolvermos, a lentidão”.

Ao refletir sobre a arte no contexto atual, Roth comentou que o momento é frustrante para os artistas, visto que estão a criar sem prazos. “Agora tenho trabalho que estou muito animado para mostrar, mas a arte está num momento difícil. Sinto-me muito sortudo por terem seguido em frente com esta exposição. E grato, porque é muito mais fácil não fazer exposições agora”, afirmou.

O novo projeto em que o norte-americano está a trabalhar tem ligação à exposição que trouxe a Portugal, no sentido em que foi ela a sugerir-lhe pensar sobre como as ideologias se transportam através de diferentes sistemas, seja na pintura de paisagem ou na rede; sistemas que ele crê estarem muitas vezes conectados a estruturas de poder históricas. Por conta desse interesse, Evan Roth iniciou um projeto com algoritmos de mapeamento. E o artista reflete que ao ser necessário “achatar” um conjunto de dados tridimensionais do globo para criar mapas planos, não há maneira perfeita de o fazer.

“Existem centenas de ideias diferentes sobre como fazer isso, que datam de há centenas de anos, mas não há uma maneira perfeita. Todas elas contêm ideologias do criador. Os mapas, para mim, são exemplos interessantes disso, porque são coisas que aprendemos, mesmo em crianças, a não questionar. Quando eles puxam um mapa numa sala de aula não pedem para nos questionarmos sobre ‘quem fez isso?’ ou que decisões foram tomadas pelo designer. Olhamos para ele como se fosse um facto e isso, para mim, torna o mapa esse sistema incrivelmente rígido que tem falhas como as redes, que tem falhas como as imagens de paisagens. Estou a tentar desconstruir isso”, explicou.

A exposição “Red Lines and Landscapes: Portugal” de Evan Roth é a quarta do ciclo realizado em parceria entre a Fidelidade​ Arte e a Culturgest, cabendo aos artistas a indicação dos seus sucessores em ambos espaços. O resultado é uma literal “Reação em Cadeia”, nome do ciclo que começou em 2019, com a moçambicana Ângela Ferreira. A artista que irá suceder Roth é Alicia Kopf, artista e escritora catalã que já está a exibir em Lisboa desde setembro e cujo trabalho chega à Culturgest Porto a 18 de dezembro.

A mostra de Evan Roth teve a sua primeira edição em Lisboa, com pinturas do Museu Nacional do Chiado, e renova-se no Porto, ao ser adaptada ao espaço e acompanhada por novas obras. A exposição está aberta até 6 de dezembro e tem entrada gratuita.

Artigo editado por Filipa Silva