Advogada, membro do Conselho Nacional do CDS, Filipa Correia Pinto é a cabeça de lista do partido pelo círculo do Porto. Em entrevista ao JPN - a primeira de uma série que publicaremos esta semana -, a centrista fala sobre a sua estreia como candidata, traça objetivos e reforça a mensagem que o CDS tenta passar, a de que o partido é o único "parceiro confiável e responsável" para o PSD.

Assume uma “amizade franca” com o líder do partido, mas rejeita que seja “o braço direito” de Francisco Rodrigues dos Santos. Ainda assim, foi nela que o CDS-PP apostou para encabeçar a lista pelo distrito do Porto. Filipa Correia Pinto, 45 anos, estreia-se como candidata a deputada e tem pela frente o desafio de superar uma das piores noites eleitorais da história dos centristas: a das Legislativas de 2019.

Sobre os cenários pós-eleitorais, a advogada entende que o partido tem características muito distintas dos parceiros de direita, seja da Iniciativa Liberal, que apelida de “pouco humanista na sua visão de sociedade”, ou do Chega, enquanto partido que “cultiva o ódio”. O PAN, como tem sido habitual no discurso centrista, também é alvo de remoques.

Numa conversa no Passeio dos Clérigos, pouco depois de ter sido recebida pelo reitor da Universidade do Porto, a candidata explicou porque é que o partido é favorável à descentralização de serviços, e não à regionalização, porque não é contra as propinas, porque defende uma “Via verde da Saúde”, o cheque-ensino e um choque fiscal e porque rejeita a morte assistida.

JPN – O CDS chega a estas eleições vindo de um dos piores resultados eleitorais em Legislativas – passou de 18 para 5 deputados – e num clima de enorme crispação interna. Porque é que aceitou o convite para ser candidata num contexto destes?

Filipa Correia Pinto (FCP) – Precisamente todo esse contexto. Tenho uma ligação muito antiga ao CDS, filiei-me no que então se chamava Juventude Centrista, há perto de 30 anos. Apesar de ter estado sempre bastante próxima e envolvida, nunca aceitei desempenhar um cargo público, fui crescendo e fazendo a minha vida profissional de forma autónoma da política. Senti, neste particular momento, que o património que o CDS representa no regime democrático e o seu programa ao nível dos princípios, a sua carta fundacional, são muito relevantes na democracia portuguesa e contêm um projeto de sociedade que ainda está por cumprir. Portanto, qualquer ameaça à importância e à sobrevivência do CDS me mobilizaram. Foi por isso que aceitei o convite que, amavelmente, o presidente do partido me fez, que muito me honrou.

JPN – Num artigo recente da revista “Sábado”, faziam referência à Filipa Correia Pinto como “o braço direito do Francisco” Rodrigues dos Santos. É assim?

FCP – Depois de ler o artigo, efetivamente, fiquei a sentir-me com as costas pesadas. Apesar de não ter uma ligação pessoal anterior a esta aventura com o presidente do partido, temos uma amizade franca e muito próxima. Mas não é verdade que o Francisco só me oiça a mim ou me oiça particularmente a mim. Há um órgão com um núcleo duro, que o Francisco ouve com regularidade. Tenho a honra de fazer parte desse grupo.

JPN – A idade do líder do CDS tem-no prejudicado neste processo, em que tem sido particularmente visado?

FCP – Acho que ser jovem em Portugal é sempre um handicap, não é propriamente currículo e bom cartão de visita. Na política, infelizmente, não é diferente. Nos últimos anos, temos sido governados por pessoas da geração acima da nossa. Vivo com esta sensação desde que me interesso pela política, que é sempre a geração a seguir a decidir o destino do país e isso não tem dado bom resultado. Continuamos a ser um país pobre, na cauda da europa, com problemas estruturais que não conseguimos resolver. É verdade que o Francisco ser um líder jovem, na opinião pública, nem sempre cai bem, mas discordo e combato muito essa leitura, que não é útil. Acho que a juventude é uma das boas características diferenciadoras que ele tem. 

JPN – Em 2019, o partido elegeu só uma deputada pelo Porto: Cecília Meireles. Parte para estas eleições, com que objetivo para o círculo do Porto? O que será para si uma vitória?

FCP – O CDS há dois anos teve, neste círculo, dos piores resultados da sua história e digo-o por duas razões. Teve um resultado com o qual só conseguiu eleger um deputado e, por outro lado, pela primeira vez, o resultado no Porto foi abaixo do nacional e essa é uma tendência que não me lembro de ter expressão nos últimos 30 anos. 

Tudo o que for acima disso, na minha perspetiva, é lucro e não lhe chamaria uma vitória, mas o passo sólido que queremos dar de inversão ao estado em que o país se encontra. De resto, não tenho nenhum objetivo pessoal nestas eleições. Os meus objetivos são políticos e de reafirmação do partido, acho que é isso que é importante. 

A nós compete-nos, nesta fase, garantir que a mensagem chegue aos eleitores. Isso dos políticos traçarem metas aos eleitores é um bocadinho a perversão de como as coisas devem funcionar. Os eleitores é que devem traçar metas a quem elegem. O que digo é que a mensagem que quero passar lhes chegue e que seja suficientemente cativante e convincente para lhes poder pedir a confiança no dia das eleições. São eles que vão decidir se o CDS se afirma, se se mantém. Nós cá estaremos no dia 30 para assumir os resultados.

Filipa Correia Pinto é membro do Conselho Nacional do CDS-PP. Foto: Ana Torres/JPN

JPN – A ser eleita, irá substituir Cecília Meireles, um dos quadros do partido que mais notoriedade teve na atividade parlamentar recente. É uma tarefa difícil?

FCP – Devo dizer, para declaração de interesses, que sou muito amiga da Cecília Meireles e não tenho a menor dúvida que, do ponto de vista político, se a substituir, vai ser difícil. Chegaria à assembleia para ser deputada para a primeira vez e dessa perspetiva até é ingrata a comparação com alguém que tem dez ou 12 anos de experiência parlamentar. A Cecília fez um caminho absolutamente notável ao longo destes anos. O que prometo é trabalhar muito, preparar-me o mais possível para todos os combates políticos e desafios que a Assembleia da República me pode trazer e espero estar à altura. 

JPN – A ser eleita, será deputada da nação. Mas não deixará de ser eleita pelo círculo do Porto. Se tivesse de escolher três medidas do CDS que vão ter impacto particular sobre as pessoas do distrito, que medidas seriam essas? 

FCP – Em primeiro lugar, o combate à visão centralista que os governos têm tido, de que o país é só Lisboa, prejudica o desenvolvimento nacional. Não prejudica só o Norte, mas tudo o resto. É preciso olhar às realidades diferenciadas de cada uma das zonas do país e às suas concretas especificidades e o Porto tem, do ponto de vista macroeconómico, especificidades grandes face a Lisboa e Vale do Tejo. Toda a gente sabe e sente que um norte mais rico, com mais emprego e mais desenvolvido beneficia todos, não só alguns. Esse é um combate muito determinante enquanto visão geral.

Em medidas concretas, é urgente descentralizar e desconcentrar, aproximar os centros de decisão das pessoas que sofrem na pele as decisões negativas e beneficiam das positivas. Essa aproximação pode fazer-se com medidas muito concretas de descentralização, que não podemos continuar a adiar.

Depois, farei o que for possível no Parlamento para que o investimento público do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e as prioridades que o Governo decidiu não deixem o Norte e o Grande Porto discriminados, que me parece ser o caso. Apostar numa distribuição de fundos mais equitativa do ponto de vista regional parece-me necessário. Há fundos já comprometidos, mas há muita margem para melhorar.

(…) não somos um partido aventureiro, nem um partido experimentalista, nem um partido que cultiva o ódio de uns contra os outros. 

JPN – O Compromisso Eleitoral do CDS apela ao voto “pelas mesmas razões de sempre”. Quando a concorrência à direita aumentou, as “razões de sempre” serão suficientes?

Acho que são mais que suficientes. Da nossa perspetiva, o CDS apresenta um programa eleitoral que é completo, que não só acompanha os vários setores da nossa vida comunitária como acompanha a vida da pessoa desde o nascimento até aos últimos dias. 

Assenta num conjunto de valores e princípios que, para nós, são inegociáveis e que põem a dignidade da pessoa acima de qualquer outra coisa. Para nós, as pessoas não são números, nem o coletivo de indicadores do bem-estar económico se podem sobrepor ao bem-estar individual.

JPN – Isso é uma referência à Iniciativa Liberal (IL)?

FCP – Evidentemente que é por contraponto àquilo que entendo que é a visão pouco humanista que a IL tem da sociedade e da integração de cada um na vida comunitária. E depois, para nós, a dignidade da pessoa é igual, qualquer que seja a sua circunstância, o seu código postal, a sua etnia, o seu sexo, o seu projeto de vida. 

JPN – E aí refere-se ao Chega?

FCP – Nós não distinguimos as pessoas pelas suas origem, pelos seus percursos, porventura, nem pelas suas asneiras.  Não me parece que o programa que o CDS apresenta, quando convoca as mesmas razões de sempre, sejam insuficientes. O que se pretende é transmitir que, ao contrário dos novos partidos que ocuparam espaço à direita do PS, não somos um partido aventureiro, nem um partido experimentalista, nem um partido que cultiva o ódio de uns contra os outros. 

Pelo contrário, somos este partido confiável, que defende o personalismo e o humanismo, que assenta na doutrina social da Igreja, que defende a democracia social e que, por isso, tem um programa completo, que apresenta uma solução global para todas as dimensões da nossa vida. 

Não soluções parciais, que dão eco a reivindicações sem darem respostas. Nos valores, nesta ética judaico-cristã que fundou a nossa civilização, os partidos também têm de se distinguir e a Iniciativa Liberal, por exemplo, optou por não fazer essa distinção. Há aqui uma diferença de perspetiva, olhamos para a pessoa como um todo e não podemos destacar partes da vida das pessoas e oferecer uma solução como se fosse completa, desenquadrando-a de tudo o resto, que é o que faz o Bloco de Esquerda.

JPN – Já o seu apelo é no voto da “direita que pode mesmo governar”. Quando até o PAN não fecha a porta a negociações com o PSD, que admite também poder coligar-se com a IL, com que segurança pode o CDS afirmar que não ficará de fora da solução governativa que vier a ser desenhada?

FCP – O CDS pode afirmar aquilo que tem afirmado desde que o regime democrático se consolidou. Que é um parceiro confiável e responsável, que estará ao lado de políticas reformistas que queiram efetivamente travar o crescimento e importância do Socialismo e de todos os seus vícios na nossa sociedade. 

O que queremos com esse lema de campanha nacional é passar exatamente a confiabilidade que o CDS aporta numa solução negociada de acordo com um partido vencedor, como pode vir a ser o PSD, e de que temos as nossas linhas azuis, não vermelhas, relativamente ao que esse entendimento não vai significar. 

Ao contrário dos outros partidos que possam fazer parte desses entendimentos, sejam mais à esquerda ou mais à direita, oferecemos aos eleitores a garantia segura de que um voto no CDS não é um voto que vá parar ao bolso do PS. Não alinharemos em nenhuma solução que comporte a manutenção no poder do PS ou numa solução irresponsável trazida pelo PAN, que humanize os animais e animalize as pessoas e imponha hábitos de consumo e modos de vida que são muito avessos e que estão longe de significar, na nossa perspetiva, progresso civilizacional. 

E também não embarcaremos em nenhum entendimento – de resto, nisso, o PSD e os partidos à direita têm sido unânimes – que envolva partidos extremistas com posturas antidemocráticas e indignas. Por exclusão de partes, o CDS é o único partido com capacidade de oferecer, se os eleitores assim o desejarem, a maioria necessária para que a alternativa se forme.

Advogada de profissão, é candidata pela primeira vez a um cargo público. Foto: Ana Torres/JPN

JPN – Já que mencionou o PAN, António Costa abriu uma porta ao partido e Rui Tavares propôs uma eco-geringonça. O que pensa o CDS dessa solução governativa?

FCP – Essa coisa do “eco” suscita-me logo muitas dúvidas. Porque não vejo que a principal preocupação do PAN seja a ecologia. Por outro lado, tenho muitas dúvidas que a defesa do ambiente, as questões da transição energética e da nossa obrigação de deixarmos um planeta tão bem conservado aos nossos filhos como herdámos dos nossos pais, se resolva com as políticas do PAN ou da extrema esquerda. 

Isso da “eco-geringonça” é mais um chavão que cai muito bem num certo eleitorado, mas que se esquece que são os caçadores, agricultores, pescadores, as profissões mais antigas de contacto com a natureza, aqueles que mais conservam a natureza e os que mais promovem a sua salubridade. Isto de tratarmos a transição energética da forma como o PAN ou o BE querem tratar traduz-se num brutal aumento das despesas das famílias e empresas sem estarmos certos dos benefícios imediatos que a pressão vai trazer. 

É evidente que o ambiente e a ecologia têm de ser preocupações e são de qualquer conservador; nunca o CDS arredou as preocupações ambientais dos seus programas. O que entendemos é que essa preocupação se faz na linha do conservacionismo e educação para o respeito pelo ambiente e não por pôr as pessoas a comer tofu só porque o gado pastoril consome água em excesso. Não só não é defensável do ponto de vista científico, como é uma violência sobre os nossos modos de vida tradicionais. É preciso um preconceito ideológico e um oportunismo político para dizer que estes modos de vida são desumanos ou que revelam desprezo pelos animais.

JPN – Entrando mais no programa com que se apresentam a estas eleições: descentralizar, sim. Regionalizar, não. Porquê? Qual a diferença entre ambos?

FCP – As diferenças são conceptuais e existem. O que temos em cima da mesa é um modelo de regiões, que apontam para cinco, com poderes legislativos próprios, com orçamentos próprios e com governos próprios. É contra esse modelo de desconcentração dos poderes do Estado que o CDS se tem vindo a bater. 

Não há dúvida que a Norte, mais que noutras regiões, a concentração e o excesso de políticas centralistas têm sido um problema para o desenvolvimento da região, que é urgente resolver. O que não nos parece é que com o modelo em cima da mesa, pela criação de governos e parlamentos próprios, que o problema se vá resolver. 

Isso vai criar uma camada intermédia de burocracia e organismos no Estado que não beneficia ninguém, porque temos Estado a mais, burocracia a mais, porventura até pessoal político a mais. É uma solução despesista e não há nenhuma garantia de que vá resolver problemas concretos e reais. 

Não vi o PS com vontade de responder ao problema da distância, geográfica e de conceito, que há entre as pessoas e os serviços e de aproximar os órgãos de decisão das populações que esses órgãos servem. Vi o PS a querer que o Governo se desonere de funções tradicionais, que não tenho dúvida que podem ser melhor executadas pelas autarquias, mas é preciso dotá-las dos meios necessários para que essas competências possam ser bem exercidas. 

JPN – O CDS propõe-se alterar o atual sistema eleitoral. Pode explicar-nos, de forma sucinta, qual é a proposta do CDS?

FCP – Há um problema muito grande que os partidos têm de encarar, com humildade e coragem. Temos um enorme distanciamento entre parte do eleitorado e o processo democrático que é, a muito esforço, um processo universal, com garantias de igualdade. Apesar desse esforço, mais de metade dos eleitores decide abster-se. Se os poderes políticos não tiverem a coragem de reverter este problema – e têm de o fazer com humildade, porque seguramente o problema é deles, não dos eleitores – é a democracia que fica em causa. E ficamos nós todos. 

JPN – Como mudar? 

FCP – Há muitas coisas, mais ou menos simbólicas, que se podem fazer. Existe uma cultura de exercício de poder político que tem de ser alterada. Quando falamos na questão de combater as portas giratórias entre o poder político, os reguladores, os grandes centros de decisão económica, era toda uma atitude cultural que os próprios políticos deviam ter e ser pedagogicamente exemplo para as gerações seguintes. Se calhar é preciso intervir por iniciativa legislativa e obrigar os políticos que saem das suas funções a um período de nojo e recato. 

A perceção generalizada é que estar na política é uma atividade rentável, onde as pessoas estão para se servirem em vez de estarem ao serviço dos outros e usarem benefício nos cargos seguintes e nisso tem de se intervir. 

Por outro lado, é necessário aproximar os representantes da nação na Assembleia da República. Boa parte das matérias são da competência da Assembleia, é lá que se tomam grandes decisões e a maior parte dos portugueses não sabe quem são os seus deputados, que também não prestam contas aos seus eleitores. Essa relação pode ser mais próxima através da criação de círculos uninominais, em que os eleitores votassem não em partidos, mas em pessoas cujo trabalho reconhecem. Mesmo nos círculos plurinominais, há muito a fazer para permitir que o cidadão comum tenha mais participação na escolha dos candidatos a deputados que integram as listas.

(…) parece-me que as propinas são o menor dos problemas das famílias dos estudantes.

JPN – Esteve reunida com o reitor da Universidade do Porto. Que mensagem quis transmitir a António de Sousa Pereira, que além de reitor da UP, é também o atual presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas?

Não viemos fazer campanha eleitoral. Apresentamos cumprimentos, démo-nos a conhecer e ouvimos. Ouvimos que o Ensino Superior no Porto tem os mesmos problemas de Lisboa. Problemas de manutenção de massa crítica na criação de conhecimento, subfinanciamento mais ou menos crónico. Surgiu muito a necessidade de entrosar mais o conhecimento que é criado nas universidades e da sua transmissão à economia real. 

JPN – Fala de financiamento. As propinas do 1.º ciclo do ensino superior público desceram nos últimos anos dos 1068 euros para os atuais 697 euros. Com o CDS-PP no Governo, este valor é para manter?

FCP – A nossa perspetiva é que as pessoas que usufruem do serviço de Ensino Superior Público e têm capacidade de suportar uma propina sem perda de acesso a outros bens essenciais, devem suportá-la. O CDS não é contra a existência de uma propina que, comparada com a propina do ensino superior privado, tem um caráter essencialmente simbólico, hoje mais simbólico do que já foi. 

Não somos contra a propina ou contra a ideia de que quem pode suportá-las possa contribuir para o esforço de investimento na educação e Ensino Superior. Sem prejuízo de que quem não tem essas condições deva ser apoiado através da ação social escolar, de forma a que ninguém que tenha as condições exigidas por cada uma das universidades deixe de o frequentar por falta de recursos. 

Com franqueza, parece-me que as propinas são o menor dos problemas das famílias dos estudantes. Os custos de alojamento nas grandes cidades são mais pesados e asfixiantes que os da propina. Quando falamos de problemas de recursos das famílias para porem os seus filhos a estudar no Ensino Superior custa-me referir-me apenas ao ensino público. Parece-me que há mais famílias com dificuldades a suportar as propinas dos filhos no ensino privado, muito mais altas do que as do ensino público, do que o contrário. Pela natureza dos cursos que o privado oferece, parece-me preocupante, e não está a ser o fator de mobilidade social, que o acesso ao ensino superior devia ser para todos. 

JPN – Em 2019, o partido propunha que os alunos que ficassem de fora do ensino superior público pudessem suportar os custos totais deste acesso e entrar através de vagas sobrantes destinadas a alunos estrangeiros, que têm propinas mais altas. Era, na sua opinião, uma boa proposta? Não poderia colocar em desvantagem os alunos que não têm possibilidade de suportar estes custos, que continuariam a ficar de fora, pelo menos durante mais tempo?

FCP – Todas as ideias que tragam discussão sobre este assunto são positivas. Os numerus clausus das universidades têm muito a ver com a capacidade que estas têm de ensinar. Têm capacidade de ensinar um número de alunos e fixam esse número. Não conseguimos aumentar essa capacidade de continuar a formar pessoas com grande qualidade porque as pomos a pagar mais. As condições estruturais das universidades não são elásticas ao ponto de, com mais 2 ou 3 mil euros por ano, se resolverem. Foi uma tentativa positiva de abordar um problema muito sério, mas não estou convencida que a solução seja a melhor.

JPN – O alojamento é, contudo, a rubrica que representa a maior despesa mensal dos estudantes, em particular, e dos jovens em geral. Só há duas menções aos jovens no compromisso eleitoral do CDS e ambas estão relacionadas com a habitação. O que é que o CDS propõe nesta matéria?

FCP – A habitação dos jovens em geral é uma preocupação do CDS. É muito difícil, numa economia globalizada como a nossa, ter soluções milagrosas. Temos obviamente que apostar no turismo, mas isso encarece a habitação nos centros das cidades. 

Os jovens universitários, quando vêm estudar para o Porto vindos de longe, procuram alojamento o mais próximo dos seus polos universitários possível, sob pena de não lhes compensar virem viver para o Porto e manterem-se nas suas terras. Temos de ter políticas integradas que permitam, sem prejudicar o funcionamento livre do mercado de arrendamento, com algum combate à especulação imobiliária desnecessária e perniciosa, oferecer-lhes condições para que possam viver perto dos sítios onde estudam. 

Isso passa por aumentar a oferta. O Estado pode fazer muito ainda nesse aumento. Quer o Estado central quer as autarquias têm muitos imóveis que podem alocar a residências estudantis. Passa pela criação de benefícios fiscais aos inquilinos ou aos senhorios no pagamento das rendas; passa por reduções específicas sérias no IRS das famílias que suportam esses custos. 

Se queremos promover políticas de bem-estar e realização integral, se queremos dar aos jovens a possibilidade de constituir família e ter filhos, então, temos de os discriminar positivamente. Nos primeiros anos da profissão, devemos diminuir-lhes os impostos e não tratá-los como se tivessem 20 anos de carreira e para eles o esforço fiscal fosse o mesmo, porque manifestamente não é. 

Para finalizar, e numa frase, o que tem a dizer sobre:

Morte assistida
Não atacando a liberdade individual, é um caminho sem volta a abrir a porta a que o Estado possa provocar a morte em alguém. Nenhuma civilização que respeite a dignidade da pessoa humana deve transferir esse poder para o Estado, em nenhuma circunstância.

Mundo rural
A preservar, acarinhar, incentivar e a ajudar a desenvolver e afirmar-se.

Via verde da saúde
Uma medida pela qual o CDS se vem batendo há muito e permite que, quando o SNS não consiga dar resposta em tempo útil aos cuidados que um cidadão precisa, possa recorrer ao serviço privado para garantir esses cuidados de saúde em tempo útil.

Choque fiscal
Temos hoje uma das cargas fiscais mais elevadas de sempre. É urgente repensar o nosso sistema fiscal, diminuir impostos das famílias e empresas e fazer escolhas, que precisam de coragem, porque implicam que saibamos o que cortar na enorme despesa pública que temos hoje. O Estado em que vivemos não é sustentável.

Cheque-ensino
Um instrumento de liberdade de escolha das famílias para que o ensino, como fator primordial de mobilidade social, não fique à partida prejudicada por quem já tem menos recursos, vive mais longe dos centros urbanos, quem vem de um estrato cultural mais baixo. É um instrumento de combate à perpetuação dessa desigualdade.

Educação para a Cidadania
A educação para a cidadania é fundamental. O CDS não tem nenhuma rejeição a que os jovens em idade escolar aprendam a importância do voto, o exercício dos seus direitos cívicos, os seus deveres enquanto cidadãos, até a tal educação ambiental de que falávamos. O que não aceitamos é que a ideologia do partido que está no poder em dado momento seja trazida à força para as escolas contra a vontade das famílias e funcione como um endoutrinamento que prejudica a liberdade constitucional inalienável que cada pai tem de transmitir os seus próprios valores aos seus filhos.